O machismo é uma coisa anti-homem
A tradição mantém-nos agrilhoados, mesmo que, sem correntes, à nossa volta as janelas e as portas estejam escancaradas. Para nos vermos libertos, precisamos de enfrentar o hábito; de lutar contra certas ideias consagradas dos mais velhos; de discutir e convencer os mais novos; de vencermo-nos a nós próprios. Convenhamos, o homem é mais uma vítima do machismo.
O machismo delega “tarefas” pelos diferentes personagens, campos e setores que ao longo da vida se conhecem. Desde muito cedo, alguém diz que “a pila serve para ir às gajas” e “os homens não choram”, nem podem brincar com bonecas e que o cor de rosa é para meninas.
A miséria intelectual continua, mais tarde. Nas relações, quando uma mulher não corresponde às expectativas (imaginárias) masculinas, então ela falhou. As suas opções, passadas ou presentes, na perspetiva do intoxicado, não merecem menos que o vexame, o gozo, o menosprezo odioso e até mesmo a violência física, ou o femicídio. No sexo, o homem não pode falhar, tem que ser uma máquina demolidora de camas, sem critério algum até à hora de casar. Mas ai do homem que em detrimento da carreira escolha ficar em casa a tomar conta dos filhos. Aliás, a “tradição” machista esmaga o homem que receba um salário inferior ao da mulher.
Neste modelo moldado pelo ódio, o homem tem que ser um ás no volante, estacionar à primeira e fazer piões. Em casa, há que ignorar as tradicionais dezenas de horas que a mulher perde em lides domésticas (trabalho não pago), semana após semana, e perder a cabeça nas invariáveis discussões entre casal, onde falta um parceiro.
Alguém duvida que tanta toxicidade máscula resulte em depressões, ostracização, repressão emocional, sentimentos constantes de insatisfação? Será alheio a isto o facto de, em Portugal, os homens se suicidarem três vezes mais do que as mulheres?
O machismo mata e fere homens que beijam na boca outros homens e as mulheres que se atrevem a sê-lo. Os restantes indivíduos que não correspondem ao padrão asqueroso da masculinidade tóxica são sufocados lentamente.
Cada um de nós tem janelas e portas abertas para renunciar ao machismo que condena o homem a não ter liberdade. Morra a tradição.
Texto de Luís Grilo
Luís Grilo nasceu em Águeda há 28 anos e estudou jornalismo em Coimbra. Escreve, toca e mete-se nas políticas.