O melhor amigo do algoritmo
Há algures um algoritmo que nos faz festejar sempre no dia e na hora certa. Não juntamos a família toda à volta de uma mesa iluminados pelo piscar das luzes de uma árvore sem ser no dia 24 de Dezembro. Não batemos tachos e panelas na rua sem ser exactamente à meia-noite do dia 1 de Janeiro. Não vestimos a camisola do nosso clube se não houver jogo nesse dia e não oferecemos flores num dia qualquer. Há de facto um algoritmo que nos força a esse comportamento de obediência cega.
Um algoritmo é como a álgebra, palavras corrompidas, sem criador assumido ou criação definida. No espaço e no tempo e significa apenas uma sequência finita de acções executáveis. No fundo é uma programação que visa que um objectivo se realize e que depois disso desaparece. Uma ordem, uma solução eficiente para um problema. Um fogo de artifício que não mata mas mói. Uma sensação familiar sobre um acontecimento. Se parece que faz sentido, então faz sentido e é isso que deves fazer, porque ele, o algoritmo, é teu amigo.
Ao longo da nossa curta história de vida são muitos os artifícios em que nos envolvemos sem dar conta disso. Celebramos aniversários, oferecemos prendas, usamos figurinos, pintamos a cara e até estendemos a mão a estranhos, sempre sem questionar porquê. Se todos o fazem porque não hei-de eu fazê-lo. Somos assim figuras de um qualquer algoritmo social que nos faz pular de alegria por fazermos o que todos os outros fazem. A nossa família encarrega-se de manter o algoritmo a funcionar, ensina-nos como nos comportarmos, a dizer Bom Dia e Boa Noite, a bater na porta antes de entrar e a cumprimentar os vizinhos e os habitantes das aldeias que visitamos nas férias. Queremos ser bem vistos, queremos que o algoritmo se orgulhe de nós. E se nos portarmos bem, o algoritmo gosta e recompensa-nos com bastante notoriedade e muita popularidade.
As pessoas populares são assim as que o algoritmo social reconhece como bem comportadas de acordo com as regras de programação do tempo a que pertencem, são-nos apresentadas como modelos a seguir. Queremos ser como elas e através de muito esforço seremos um dia como elas e teremos o que eles têm, popularidade. Esse é o aspiracional. Se em tempos era ter muitos descendentes, noutro tempo era ter propriedades ou poder, hoje é ser popular, aceite como alguém que mostra o caminho, que se apresenta como embaixador do algoritmo.
O que o algoritmo não prevê é que se pergunte porquê? Porquê escolher esta roupa ou esta forma de ser se eu sinto que devo fazer outra coisa completamente diferente. Filosoficamente, dizem-nos, para reflectir na mudança de calendário e assim, nesta altura, compete-me também reflectir. Porquê escrever um texto sobre aquilo que se passa à minha volta se seria tão melhor escrever sobre o que se passa dentro de mim. E o que se passa dentro de mim? O mesmo que se passará dentro de todos os outros, a procura incessante por um sentido para a vida que apenas nos leve a vivê-la. E aqui, os existencialistas perguntariam; Mas estaremos realmente a viver ou é apenas o algoritmo a fazer perguntas? O algoritmo responderá sempre que faças o que fizeres, o algoritmo será sempre o teu melhor amigo.