O PAN não faz bem à saúde
O PAN prepara-se para ter uma votação expressiva. Todas as sondagens lhe garantem a conquista de vários deputados, no mínimo cinco ou seis. Se tal se confirmar, o Partido das Pessoas, dos Animais e da Natureza pode ser decisivo para António Costa se este não tiver maioria absoluta.
Nos últimos anos, o PAN conseguiu posicionar-se e aproveitar um espaço que estava vazio no sistema partidário português. Os Verdes existem, mas é como se não existissem, o PCP não ganha um voto com esta parceria (discutir a sério este assunto será inevitável entre os comunistas). Além disso, nenhum dos principais partidos tem um discurso suficientemente mobilizador sobre alterações climáticas, justiça ecológica ou defesa dos animais. André Silva, no parlamento, e um conjunto de militantes souberam ir fazendo o seu trabalho na sociedade civil o que permitiu o crescimento da sua base social de apoio. Fizeram-no bem.
O tempo é de angústias, de novos idealismos e de procura de uma pureza moral que, como sempre aconteceu ao longo da história, pode abrir a porta a fundamentalismos e novas ortodoxias. O PAN enquadra-se nesta lógica religiosa. Quando ouvimos André Silva, de dedo acusador e olhos inquisidores, pressentimos um Torquemada em potência, alguém que está disponível para purificar o mundo de todos os infiéis que não sejam capazes de perceber que todos devemos ser vegetarianos (porque nenhum ser vivo pode servir para nosso alimento).
Dá ideia, a ouvi-lo, que todos passaremos a ser escrutinados pelo que comemos. Pelo que dizemos. Pelo que fazemos. Pelos espetáculos a que assistimos. Pelas igrejas a que vamos. Pela asneira que dizemos ao pisar merda de cão. Por pertencermos à Maçonaria (o PAN exige que se saiba quem realmente pertence). Por não colaborarmos com um sistema de justiça assente na bufaria, como acontecia no Estado Novo com centenas de pessoas que recebiam uma avença da PIDE para denunciar os cidadãos que se comportavam de um modo impuro.
Um partido como o PAN pode ser útil. Não tenho a mais pequena dúvida. Útil até como forma de acordar o país para temas decisivos para o nosso futuro. Mas ao ver André Silva nos debates fiquei um bocadinho assustado. Confesso que não o conhecia, esperava outra coisa. Esperava que um partido que defende a criação de um mundo novo e mais sustentável pudesse ser muitíssimo mais tolerante, luminoso e apaziguado. O que vimos foi o contrário. André Silva é intolerante, sombrio e crispado.
Ao ouvi-lo tão arrogante (quando as sondagens lhe dão 5 por cento na melhor das hipóteses), imagino o que seria se um dia chegar ao poder. Sinceramente fiquei com medo de voltar a pedir um bife e de poder ser visto por alguém que, com o dedo espetado, me acusará de ser um monstro. Depois disso alguém inventará que trato mal animais ou que, em 2013, insultei uma comunidade de vegetarianos e vegans no Mercado do Bolhão ou de Campo de Ourique. Serei justamente perseguido e apertado apenas para meu bem, apenas para perceber que, de uma vez por todas, devo ser amigo do progresso e não um cidadão das trevas, vicioso e nefasto para a sociedade.
Artigo editado a 12 de Setembro, pelas 18h58, com correcção de gralha do nome do partido.