O poder das mulheres no governo de Costa
O governo português tem 8 mulheres. Nunca tantas foram ministras ao mesmo tempo, nunca nenhum governo português foi tão equilibrado. Mas em Portugal os sinais de uma mudança não se resumem ao exemplo do governo. A diretora geral de saúde é uma mulher. A principal empresa privada portuguesa, Sonae, é liderada por uma mulher. O Império Amorim (que inclui a GALP) é controlado por uma mulher. O Bloco de Esquerda teve os seus melhores resultados de sempre, e os melhores da história da extrema-esquerda, com uma mulher na sua liderança. As duas maiores fundações portuguesas são lideradas por duas mulheres. A nossa comissária europeia é Elisa Ferreira numa Comissão Europeia liderada por uma mulher alemã como Angela Merkel que é a mais poderosa líder de um executivo neste nosso paradoxal continente europeu. E poderia continuar a dar exemplos.
Mas vamos ao governo…
Julgo ser justo concluir que as mulheres neste governo, de um modo geral, têm tido uma alta performance. O que tem isso de notícia, perguntarão. E é justo que o façam, não tem notícia ou surpresa alguma para mim. Porém, tendemos a esquecer de que ainda não é confortável para muitas pessoas (e para muitas “elas”, por estranho que pareça) a chegada das mulheres aos mais altos cargos. Tendemos a esquecer também a enormíssima polémica quando se instauraram quotas femininas para a ocupação de lugares nas listas de deputados.
No poder (qualquer que ele seja) ninguém dá nada a ninguém. Sem a imposição de quotas, sem a lei da paridade (honra seja feita a José Sócrates) os homens jamais abririam a porta às mulheres para que estas tivessem uma hipótese sequer de provar que podiam estar à altura. E seriam (seríamos) capazes de encontrar os mais extraordinários argumentos para o justificar. Que o poder da mulher é muito maior em casa, que não se pode colocar em causa o milagre da maternidade, que nós coitados não temos o extraordinária talento de tratar da casa e dos filhos, incomparavelmente mais importante do que trabalhar nas empresas ou ocupar lugar políticos.
Tretas.
Sem uma agressividade impositiva e sem perda de privilégios de alguns não há conquistas possíveis. Não há nem nunca houve. As mulheres, ao longo da sua história de emancipação, sabem-no muito bem. A história das sufragistas e de todas as feministas ao longo dos últimos 200 anos prova-o sem ser necessário mais argumentos.
Mas queria falar do governo.
António Costa tem oito ministras.
Dessas oito mulheres, três estão na linha da frente no combate direto contra a pandemia: Marta Temido, Ana Mendes Godinho e Mariana Vieira da Silva. E outras três (Francisca Van Dunem, Graça Fonseca e Maria do Céu Albuquerque), a braços com as consequências do vírus, na justiça, cultura e agricultura.
Na generalidade o balanço é muito positivo.
Marta Temido, perante uma situação de enorme pressão, provou força e resiliência. Ana Mendes Godinho, herdeira da sombra tutelar de Vieira da Silva, provou a sua enorme qualidade técnica e política. Mariana Vieira da Silva, num lugar chave que alguns duvidavam que pudesse ser ocupado por si, provou ser a pessoa certa no complicado desafio de ser a mais próxima de um primeiro-ministro com o perfil de António Costa.
Todas, a que acrescentaria Ana Catarina Mendes, líder parlamentar do PS, estão na primeira linha do combate. E todas contribuíram para o atual peso de credibilidade do governo. Pela forma como comunicam. Pelo modo como explicam. Pela consistência com que fazem diferente do que estávamos habituados.
As mulheres não são os homens. A sua forma de ver o mundo não é, generalizando, a mesma maneira de ver dos homens. O seu contributo no exercício do poder é fundamental para que governos, empresas, universidades e tudo o resto possam ser mais abertas, mais tolerantes, mais profissionais e mais próximas e respeitadoras das pessoas.
No último governo de Passos Coelho, o que durou menos de um mês, lembro-me de ter tido pena por duas das pessoas que integravam o executivo. Por um lado, Margarida Mano. E por outro, Teresa Morais. Também elas fariam um excelente lugar, também elas provariam que as mulheres não devem nada aos homens em nenhuma área que envolva o exercício do poder (com exceção talvez do físico).
É por isso, por tudo isto, que não há caminho para trás. E é por isso que devemos estar contentes por esta verdadeira revolução de mentalidades. Sobretudo as mulheres devem estar contentes, todas as mulheres. De todos os partidos.
Não há caminho para trás. E estou convencido de que, nos próximos anos, ainda estarei na linha da frente a apoiar uma mulher a ser Presidente ou primeira-ministra.