O regresso à escuridão com Zola Jesus, em ‘Okovi’
A meio de 2009, quando Zola Jesus lança o seu primeiro álbum, The Spoils, começa a ser conhecida por causar sensações de estranheza e distância, por evocar a procura de um esconderijo ruidoso, onde pudesses existir sem nunca ninguém dar pela tua existência; tudo isto com alguns instrumentos e a robustez da sua voz sombria.
Nika Roza Danilova continua a abismar o seu público e a evoluir musicalmente. Em 2009 apareceu como uma mistura industrial, introspectiva, experimental; semelhante a Siouxsie & the Banshees, mas numa versão mais excêntrica e mais obscura. Ao longo dos anos, tem procurado redefinir o seu som, tentado encontrar uma definição para o seu eu musical, que se tem vindo a transformar até aos dias de hoje.
Este ano, chega-nos o seu novo álbum Okovi, cujo nome significa ‘algemas’, em eslavo. Representa o regresso de Zola Jesus à produtora musical Sacred Bones, com a qual já tinha trabalhado em álbuns anteriores, com a excepção de Taiga, de 2014. Para esse trabalho, associou-se à produtora musical Mute, resultando no seu álbum mais conhecido, com uma vertente mais dance pop, mas também bem melancólico e enigmático, como lhe é característico.
É um álbum completamente híbrido, que mistura um engenho electrónico com um industrial, sem nunca se esquecer da sua tão célebre assinatura sombria. Inspira-se na sua própria experiência pessoal, dando ao álbum contornos emocionais bastante profundos. Nika acumulou bastantes experiências com temas como suicídio, morte, doença, depressão, solidão; e foi daqui que os sons mais tenebrosos se agruparam e formaram um álbum arrepiante. Os sons parecem desesperantes, urgentes, prontos para marcar um ponto de vista emotivo, venerável e exicial.
“Soak”, a terceira música do álbum, que nos conta uma história ficcional distópica de uma personagem que se prefere matar a ser assassinada. Esta música explica a temática do álbum, dado que se torna meio viscosa, agarrando o público numa teia de introspecção depressiva, ao som de um goth pop emocional e impreciso. É como se nos afogasse e depois nos trouxesse à tona; uma grande viagem num mundo do desespero eterno.
Este álbum exterioriza muito bem o medo como substância da vida, que causa efeitos devastadores na forma de ver o mundo. Danilova entra inteiramente na observação da morte. Como Virginia Woolf, sente aquela escuridão de forma intensa e excessiva e transforma-a em música, neste caso, partilhando a dor com o seu público.
Okovi traz de volta aquelas sensações do medo do desconhecido e da imortalidade perdida, já ouvidas no álbum Stridulum. Este álbum também é uma grande mais-valia para Zola Jesus, já que é o melhor que já editou, instrumentalmente. Tem uma composição bastante precisa, em que o ritmo se acumula, o drama cresce, a presença aumenta significativamente e tudo se torna instrumentalmente temperamental. A sua voz marca também um panorama mais cru, mais intrínseco, íntimo e muito vulnerável.
Nika encontra uma boa forma de lutar pela vontade de viver através de Zola Jesus, e Okovi caminha em direcção à luz, iluminando as trevas existenciais. Todas estas camadas da dor e escuridão vão desaparecendo conforme se vão ouvindo as músicas, e conforme ela as foi criando e libertando de si.