Os fantoches liberais
Os fantoches liberais querem entregar o sistema de saúde aos privados. Os liberais de carne e osso defendem um sistema de saúde onde público e privado se complementam.
Os fantoches liberais querem que pessoas que não possam pagar um seguro de saúde fiquem à porta do hospital a morrer. Os liberais de carne e osso querem um sistema universal de saúde com liberdade de escolha, semelhante aos que existem em muitos países desenvolvidos da Europa Central.
No mundo dos fantoches liberais, a pandemia causaria muitas mais mortes se não existisse um serviço nacional de saúde exatamente igual ao nosso. No mundo real, países com sistemas de saúde mais liberais como a França ou a Alemanha têm suportado a crise tão bem ou melhor do que países com modelos semelhantes ao português como a Itália ou a Espanha.
Os fantoches liberais querem salvar empresas com dinheiro público tal como defenderam o salvamento dos bancos. Os liberais de carne e osso defenderam o fim da injeção de dinheiro nos bancos.
Os fantoches liberais querem o estado a salvar empresas privadas que foram à falência por responsabilidade própria. Os liberais de carne e osso aceitam que houve uma decisão coletiva de parar a economia, que essa decisão tem custos e que não devem ser só as empresas a suportar esses custos (até porque assim a crise subsequente seria mais dura se assim fosse).
No mundo da fantoches liberais, as empresas privadas não participam no combate à pandemia. No mundo dos liberais de carne e osso, dezenas de empresas transformaram as suas linhas de produção para produzir máscaras, batas e gel desinfectante. No mundo dos liberais de carne e osso, empresas que nos permitem ter ferramentas de videoconferência, encomendas online e entretenimento na nuvem conseguem manter milhões de pessoas fora das ruas e tornar o isolamento mais suportável. No mundo dos liberais de carne e osso vários movimentos da sociedade civil juntaram-se para oferecer ventiladores e outros equipamentos aos hospitais públicos.
Os fantoches liberais querem impedir as pessoas de aceder a serviços públicos essenciais. Os liberais de carne e osso percebem que o dinheiro para os serviços públicos vem da economia e que só com uma economia pujante é possível sustentar serviços públicos de qualidade.
Os fantoches liberais querem que as pessoas impossibilitadas de trabalhar por causa da pandemia passem fome. Os liberais de carne e osso na Irlanda aproveitaram o seu desenvolvimento económico para pagarem uma grande parte do salário a todos os que desejam ficar em casa.
Os fantoches liberais são um misto de fascistas e anarquistas que desprezam as necessidades das pessoas. Os liberais de carne e osso têm uma tradição de defesa da liberdade individual, da democracia e da economia de mercado, colocando a salvaguarda da dignidade e liberdade humana no centro da sua ideologia.
Os fantoches liberais passaram a estatistas durante a pandemia. Os liberais de carne e osso estão onde sempre estiveram: na defesa de uma economia desenvolvida assente em mecanismos de mercado que possa suportar um estado capaz de garantir o acesso a bens essenciais, incluindo a defesa e segurança das pessoas (mesmo quando o inimigo é algo tão pequeno como um vírus).
Quem gosta de fantochada política continuará a combater os fantoches liberais, um adversário feito à imagem dos preconceitos de cada um. O combate não exige grande esforço mental porque é feito contra um adversário imaginário e, por isso, indefeso. Mais difícil, mas mais corajoso, seria debater com liberais de carne e osso. Mas essa luta já não querem fazer porque, suspeito, têm demasiado medo de a perder.
Crónica de Carlos Guimarães Pinto (ex-presidente da Iniciativa Liberal)
Carlos Guimarães Pinto é economista, autor, professor universitário e político português.