Pensar design é muito mais do que discutir comic sans ou condenar uma modinha e um trendy
Saiu em 2017 e chegou-me no começo de 2019. Adiei-o este tempo todo por causa do título e do resumo dado no bookdepository. Desagradava-me a ideia do crítico como alguém que tenta descobrir coisas interessantes no meio do lixo. Parecia elitista. Mandei-o vir porque dizia ser uma história da crítica de design, mesmo que centrada apenas no design de produto. Felizmente que o fiz. O resumo não mente mas dá uma imagem severamente amputada do livro.
Não é uma história completa da crítica de design, porque trata apenas da segunda metade do século XX. O seu âmbito é limitado ao Reino Unido e aos Estados Unidos. Não é uma história contínua mas em cinco momentos. O primeiro, «A Throw-Away Esthetic» (1955-1961), descreve o trabalho de críticos como Deborah Allen, Richard Hamilton, Reyner Banham. O segundo cobre os protestos na conferência de Design de Aspen 1970 (1970-1971), onde reencontramos Banham, que no primeiro capítulo defendia uma estética Pop, de use e deite fora, a enfrentar um modo completamente distinto, político e ecológico, de pensar o design. É destas tensões que vem o trash do título. O terceiro trata da crítica e comissariado de Design no Reino Unido entre 1983 e 1989, um período de expansão subsidiado pelas políticas de estímulo ao empreendorismo neoliberal de Thatcher, cobrindo o trabalho de Deyan Sudjic, Peter York, Stephan Bailey, mais apolítico e celebratório e a crítica contrária e politizada de Dick Hebdige e Judith Williamson. Aqui cobre-se realmente o crítico como elitista que resgata preciosidades no meio do lixo. No quarto (1998-2001), cobre-se o critical design e no último os blogues na sua época de ouro (2003-2007).
A cronologia é esburacada porque Alice Twemlow prefere (e bem) centrar-se em case studies que podem ser desbastados em profundidade, cobrindo contextos, sociais, geográficos, biográficos, políticos e, sobretudo, sobretudo, pontos de vista distintos e antagónicos. Este é o livro que quase me pôs em paz com o que se vai escrevendo sobre design que, francamente, não tem sido muito interessante.
Sobretudo aqui em Portugal, onde no discurso crítico ainda impera um unanimismo de opinião, de estilo e formato de escrita. Emperrou-se em meia dúzia de lugares comuns: a promoção e defesa do design, a transmissão da «história», entendida como fazer finalmente mais outro livro sobre outro «designer» esquecido, ou como a obsessão hipertrofiada pelo artesanato vintage que são as velhas tipografias ou editoras. O que fica de fora? Quase tudo: a discussão, concepções distintas, paralelas ou antagónicas do que é o design, o que se diz sobre isso e onde, etc. etc. etc.
O livro de Twemlow dá uma ideia do design como uma arena de pensamento vibrante onde uma nova ideia de pensar o design é tão mais interessante e polémica do que as discussões sobre comic sans ou da condenação da modinha e do trendy. Foi a última coisa que li sobre design que não pousei até acabar.