Porto/Post/Doc faz 10 anos e apresenta-se novamente como espaço de reflexão artística, política e humanista
O festival de cinema Porto/Post/Doc, marcado para novembro, apresenta-se novamente como espaço de reflexão e de fomento de públicos, numa cidade que tem uma outra geografia cinematográfica, disse à agência Lusa o diretor, Dario Oliveira.
O festival, dedicado ao documentário e a todas as suas fronteiras com a ficção, vai cumprir a décima edição de 17 a 25 de novembro e um dos destaques é a inclusão do Batalha – Centro de Cinema, onde se dará a abertura oficial.
Em entrevista à agência Lusa, a propósito desta décima edição hoje apresentada, Dario Oliveira lembra que em quase dez anos o Porto mudou na relação com o cinema.
“Quando nós começámos, não havia nenhuma sala aberta comercialmente na baixa. Dez anos depois, conseguimos que na cidade — não graças a nós, mas participámos nesse movimento — [houvesse] a abertura de duas salas do cinema Trindade com público fiel, e reabriu o cinema Batalha, com a participação enorme de públicos mais jovens (…). Os cursos de cinema abundam na cidade e não era essa a realidade há dez anos”, disse o programador.
Dario Oliveira defende a ideia de que “a sala de cinema é um lugar privilegiado” para a reflexão e que o festival segue esse propósito.
“O cinema não nos diz como pensar, o cinema ajuda-nos a pensar e esse ato de reflexão, artístico, político, social, humanista acima de tudo, faz com que o lugar do cinema e de um festival seja um local privilegiado”, disse.
Nesta décima edição, o Porto/Post/Doc quer pôr os espectadores a pensarem sobre a atualidade, em particular sobre contextos de guerra, e quer regressar “à forma de expressão artística mais antiga da humanidade, que é contar histórias oralmente”, através do cinema.
“Não consigo imaginar o cinema sem bons contadores de histórias e aquilo que nós aqui propomos é esta reflexão, esta discussão dentro e fora da sala de cinema, à volta dos contadores de histórias”, disse.
A competição internacional tem dez filmes, todos em estreia nacional, nomeadamente “Bye Bye Tibériade”, de Lina Soualem, “El eco”, de Tatiana Huezo, e “While the Green Grass Grows”, de Peter Mettler.
Entre os filmes portugueses escolhidos para o festival estão “2720”, de Basil da Cunha, “Astrakan 79”, de Catarina Mourão, “Naquele dia em Lisboa”, de Daniel Blaufuks, e “Verdade ou consequência?”, de Sofia Marques.
O Porto/Post/Doc associa-se ainda aos cinquenta anos do Hip Hop, com seis propostas cinematográficas, entre elas “Freestyle: The art of Rhyme”, com a presença do realizador Kevin Fitzgerald, e “Não consegues criar o mundo duas vezes”, de Catarina David e Francisco Noronha, e com debates moderados por Ricardo Farinha e Rui Miguel Abreu.
O festival já tinha anunciado que a abertura seria com o documentário “Vai no Batalha”, de Pedro Lino, sobre a emblemática sala de cinema, reabilitada e reaberta em 2022, e encerrará com “Time takes a cigarette”, de Aya Koretzky.
Este ano, pela primeira vez, haverá um laboratório de trabalho e mentorias, “cujo objetivo é apoiar o desenvolvimento de uma nova geração de críticos”, e estão previstos também encontros de coprodução, de desenvolvimento de projetos com outros países e mercados.
Ainda na programação complementar à exibição, o Porto/Post/Doc contará ainda com o projeto “Working Class Heroes”, para apoiar a produção audiovisual no Porto e sobre o Porto, tendo sido escolhidos este ano os realizadores Carla Andrade, Luísa Homem e Tomás Baltazar, cujos projetos serão desenvolvidos nos dois anos seguintes.
Para Dario Oliveira, o setor do cinema, a exibição, os festivais ainda estão a recuperar espectadores, depois da pandemia da covid-19 e de uma fragmentação dos hábitos de consumo, e há “uma manutenção de públicos” que está a ser feita de forma deficitária.
“Da parte do Governo português nunca houve vontade de o fazer de forma consistente, embora haja um Plano Nacional de Cinema e o Plano Nacional das Artes. (…) Então, o papel dos festivais ganha relevância, mas ganha relevância por ausência de outros projetos consistentes que deviam ser a prioridade do Governo”, lamentou o diretor do festival.
Dario Oliveira estende a crítica à postura do Governo em relação a todo o setor do cinema e audiovisual, “que emprega muita gente”.
“É óbvio que o Ministério da Cultura português devia ter outro olhar e outro respeito que muitas vezes fica aquém daquilo que merece e isso é uma pena. É uma pena, porque não estamos a falar de meia dúzia de cineastas galardoados internacionalmente, estamos a falar de muitos empregos. Estamos a falar de uma forma de estar igualmente honesta e importante para a nossa cultura que governos atrás de governos têm ignorado”, disse.
Toda a programação do Porto/Post/Doc está em www.portopostdoc.com.