Programadores de Capitais Europeias da Cultura preocupados com gestão de Évora2027
Sete programadores e comissários de Capitais Europeias da Cultura (CEC) manifestaram-se preocupados pela mudança na gestão de Évora2027 e consideram difícil executar o programa em dois anos, como contaram dois dos responsáveis à agência Lusa.
As preocupações foram expressas numa carta enviada em novembro ao diretor de Cultura, Criatividade e Desporto na Comissão Europeia, George Hausler, noticiada no domingo passado no jornal Público, na sequência da demissão de Paula Mota Garcia da coordenação da Equipa de Missão Évora_27, em outubro.
Paula Mota Garcia demitiu-se por considerar que “não estavam reunidas as condições” para continuar, e apontou atrasos na constituição da associação gestora da CEC, formalizada apenas em fevereiro de 2024.
Dias depois da demissão de Paula Mota Garcia, tomou posse a direção da associação gestora de Évora_27, tendo sido escolhida a jurista Maria do Céu Ramos para a presidir.
A dois anos de Évora ser Capital Europeia da Cultura, está ainda por anunciar o concurso público para escolher as direções artística e executiva.
Esta mudança levantou questões entre os responsáveis de outras sete CEC – atuais e futuras -, que escreveram à Comissão Europeia, também numa altura em que está em curso uma revisão do atual modelo Capital Europeia da Cultura (CEC) que termina em 2033.
“Para nós [a mudança de equipa em Évora] é bastante problemática e uma das razões pelas quais decidimos escrever à Comissão Europeia. […] Eu não sei como é que em dois anos vão recomeçar o projeto quando na verdade já estão atrasados. É impossível fazê-lo em dois anos. E por outro lado estamos a falar de dinheiros públicos. Para mim isto é uma questão, saber como se usa o dinheiro público. É preciso ser eficiente”, afirmou à agência Lusa Pascal Keiser, o comissário-geral de Bourges, cidade francesa que será CEC em 2028.
Este responsável contou que a mudança em Évora tem impacto noutras capitais, porque já foram desenhados vários projetos colaborativos e parcerias artísticas. No caso de Bourges2028, Keiser disse que ainda não foram contactados pela associação gestora de Évora2027.
“Alguns projetos estão agora em causa e não tenho a certeza de que vão acontecer, especialmente se a nova equipa, que entre em funções, não perceba que tem pouco tempo de os assumir. Os projetos surgem de uma longa e detalhada discussão com a equipa anterior. Vai ser impossível para a futura equipa dar continuidade a estes projetos, por isso é que é problemático para nós”, lamentou Pascal Keiser.
Elisabeth Schweeger, diretora artística da cidade austríaca de Bad Ischl, que é este ano Capital Europeia da Cultura, também descreveu à Lusa como “muito problemático” o facto de ter saído a responsável pela estrutura de missão, que desenhou o programa de Évora.
“Se mudarmos toda a gente da equipa é preciso começar de novo. A cidade recebeu o título por causa do programa. Portanto, além da equipa há o conhecimento, os contactos, as colaborações já estabelecidas. Não é uma coisa muito responsável terem saído”, disse Elisabeth Schweeger.
Na carta enviada à Comissão Europeia, à qual a agência Lusa teve acesso, os programadores e diretores artísticos lembram que as Capitais Europeias da Cultura não podem “ficar reféns” de resultados eleitorais e precisam de uma “consolidada equipa diretiva”.
A pensar na nova moldura de realização da Capital Europeia da Cultura a partir de 2034, também defendem que os diretores e gestores devem estar protegidos pela legislação relativa à propriedade intelectual e direitos de autor sobre a programação que definem, tal como acontece com os artistas.
“Este modelo teve bastante sucesso porque é copiado em 37 países e regiões do mundo. Existem capitais nacionais, capitais regionais, mas acho que agora o modelo precisa de ser atualizado, porque o mundo também mudou”, afirmou Pascal Keiser à Lusa.
Elisabeth Schweeger considera que o atual modelo é “bastante bom” e “deu origem a um enorme desenvolvimento da região” de cada cidade que o acolhe.
“Sabemos que o processo para estabelecer uma capital da Cultura demora sete anos, às vezes uma década. Claro que durante esse período há mudanças políticas, e por isso discute-se a necessidade de se desenvolver um conceito forte para garantir que a iniciativa ocorra, mesmo que haja mudanças políticas”, disse.
A associação gestora de Évora2027 é presidida, desde outubro, por Maria do Céu Ramos, até aqui secretária-geral da Fundação Eugénio de Almeida, uma das entidades pertencentes à Comissão Executiva Évora2027, liderada pela câmara municipal.
A associação conta também com os recém-nomeados António Costa da Silva como diretor financeiro e Bruno Fraga Braz como diretor de comunicação e alcance, estando ainda por anunciar a direção executiva e a direção artística.
A carta enviada à Comissão Europeia foi assinada por Elisabeth Schweeger (Bad Ischl 2024, Áustria), Pascal Keiser (Bourges 2028, França), Henrik Dagfinrud (Bodo 2024, Noruega), Mija Lorbek (Nova Gorica e Gorizia 2025, Eslovénia), Piia Rantala-Korhonen (Oulu 2026, Finlândia), Lukas Cerny (Ceske Budejovice 2028, República Checa) e Rafal Kozinski (Lublin 2029, Polónia).
Atenas foi a primeira Capital Europeia da Cultura em 1985 e até hoje a iniciativa aconteceu três vezes em Portugal, nas cidades de Lisboa (1994), Porto (2001) e Guimarães (2012), às quais se juntará Évora em 2027.