Quarenta anos de poesia de Adolfo Luxúria Canibal reunidos em livro
No dia 19 de setembro chega às livrarias o oitavo volume de elogio da sombra, a coleção de poesia coordenada por Valter Hugo Mãe. No rasto dos duendes eléctrios (Poesia 1978 – 2018) é o título desta antologia poética de Adolfo Luxúria Canibal, fundador e carismático vocalista da banda rock Mão Morta.
Não é possível a cultura portuguesa recente passar ao lado da poesia que aqui se reúne, escreve o coordenador da coleção no texto que acompanha esta obra. Entre amores abissais e políticas grotescas, alucinações de teor mais ou menos farmacêutico ou cidades cheias de passado, a poética de Adolfo Luxúria Canibal é a contemporaneidade completa, uma avidez, com seu modo próprio de se assumir e denunciar ao mesmo tempo. Sem culpa. Apenas força. (Valter Hugo Mãe)
Os 40 anos de poesia e rastilho de contracultura reunidos em No rasto dos duendes eléctricos são ainda enquadrados num capítulo intitulado A inocência é ilegítima, que transcreve uma conversa entre Valter Hugo Mãe e Adolfo Luxúria Canibal.
As primeiras apresentações deste livro estão marcadas para o dia 21 de setembro, a partir das 21:00, na Livraria 100.ª Página, em Braga; e para Coimbra, no dia 5 de outubro, no foyer do Teatro Académico Gil Vicente (TAGV), às 17:00, e enquadrada no programa da Festa da Praça da República.
Sobre o livro por Valter Hugo Mãe:
O rock é sobretudo contracultura, oposição à padronização ou higienização social. Na sua mais elementar definição, o rock está como um convite à liberdade, defendendo a oportunidade para a informalidade e para a mais desabrida emoção. Há um arrebatamento esperado no seu som, uma entrega que pressupõe a reeducação para a dimensão sensorial, profundamente animal, sem pudor ou crime.
O trabalho de Adolfo Luxúria Canibal é um dos mais cultos no panorama do rock português. Exímio à frente dos Mão Morta, o seu carisma justifica parte da contínua vigência da sua grande banda, carisma que adensa com letras frontais, sempre colocadas como golpe perante um mundo de seduções, vícios e falhas virtudes.
Não há um moralismo bacoco. O que diz é do foro da denúncia e é também afeição ao perigo, porque não se tem como exemplar, tem-se como livre.
Não é possível a cultura portuguesa recente passar ao lado da poesia que aqui se reúne. Em algum momento, todos fomos expostos à sua acidez perspicaz, pertinente, perante o pouquinho que tende a ser o mundo das pessoas. Entre amores abissais e políticas grotescas, alucinações de teor mais ou menos farmacêutico ou cidades cheias de passado, a poética de Adolfo Luxúria Canibal é a contemporaneidade completa, uma avidez, com seu modo próprio de se assumir e denunciar ao mesmo tempo. Sem culpa. Apenas força. Poderia dizer, inteligência.
Arrastando o seu Cadáver
É demencial Não há palavras que consigam dizer o horror
Vi um pobre homem agarrado ao que restava da sua mulher
Errando pela baixa
Os olhos fixos num horizonte perdido
Sem uma palavra Sem um som
Arrastando a carcaça desfigurada
Por entre o trânsito do fim da tarde
Passei sem conseguir dizer nada
Ninguém dizia nada O silêncio
Acompanhava o olhar vazio A dor
A vaguear por entre as ruínas e o trânsito do fim da tarde
As pessoas apressavam-se por causa do cair da noite
E o pobre homem seguia um destino sem rumo
Arrastando o seu cadáver