‘Romaplasm’: a pop optimista de Baths
Antes do lançamento de Obsidian, em 2013, Will Wiesenfeld quase morreu. Não é, pois, de estranhar que a pop electrónica de Baths esteja carregada de um negrume associado à exploração da mortalidade nesse trabalho. Essa atmosfera transitou para o EP Ocean Death, lançado no ano seguinte, com uma produção mais expansiva e ainda mais limpa. Desde 2014, Will tem saído dessa sombra, dedicando-se àquelas que considera as coisas boas da vida: anime, videojogos e daddies, como se comprova pelo Twitter do artista.
Em Romaplasm, como a capa indica, Baths deixa entrar a luz. A música mantém a mesma base, mas veste roupagens mais vivaças e alegres. Não que seja um álbum de dança, mas sem dúvida que as canções estão mais construídas à volta das batidas, em vez das melodias. A maior simplicidade do álbum resulta num trabalho que prima pela descontracção, mantendo uma identidade muito própria. Isso não significa que Will tenha descurado a produção ou a qualidade da música; aliás, pelo contrário.
A primeira amostra que tivemos de Romaplasm foi “Yeoman”, em que batidas airosas se unem a arpeggios de teclas numa canção que parece saída directamente de um videojogo – qualidade que, aliás, se mantém ao longo de quase todo o álbum. Essa característica atribui à canção contornos divertidos e coloridos, tornando-a numa história de amor cromática e pixelizada, completa com enternecedores versos como “I want big arms to put around you/To get lost in all your birthmarks”. Adivinhava-se então uma nova sensibilidade pop futurista, de temática mais virada para a paixão, completa com as já conhecidas camadas de samples inusitados e produção glitchy.
“Adam Copies” é o exemplo mais pungente do futurismo em que Baths se move neste álbum, que talvez acabe por ser demais. O ritmo dubstep alucinante da canção, que começa e recomeça a bel-prazer do autor, é um exemplo impressionante das suas capacidades de compositor maníaco, numa sobreposição de camadas sónicas que parece não ter fim. Não é uma canção para todas as ocasiões, ao contrário de “Superstructure”, que vicia com o seu refrão de teclas metálicas e batida acelerada.
“Human Bog” revisita a faceta mais sombria que Will explorou nos trabalhos anteriores, ao abordar na sua letra temas pessoais como a homofobia e heteronormatividade, aliando-os a uma parte musical mais ponderada e verdadeiramente bela. “I’m queer in a way that works for you” relembra-nos de que a batalha por igualdade não está ganha e de que ainda há quem não se sinta totalmente confortável na sua pele, na nossa sociedade. Esse desconforto é aqui exposto em termos interpessoais, em que o narrador sente a necessidade de fingir ser algo que não é para poder sentir reciprocidade numa relação (“The lengths I go to get held on to”). Esta canção traz uma outra recordação de fases musicais anteriores do seu projecto: a inclusão do piano, no qual o artista teve treino clássico.
O piano traz uma componente mais erudita e orgânica a esta mistura electrónica, equilibrando a paleta sonora. Em “I Form”, eleva a jubilosa canção ao adocicar a batida dos drum pads, e, em “Coitus”, dita o ambiente mais melancólico da canção de ritmo lento e arrastado, que apesar de nos querer levar de volta a Obsidian, parece mais um rascunho desse álbum do que uma canção totalmente formada, parecendo não ter muito foco.
No fundo, apesar da óptima qualidade de composição e produção, parece que algumas canções não conjuram a intensidade de sentimentos que a sua música transmitiu no passado. Isso resulta num álbum que parece incompleto, apesar de ser mais longo que qualquer outro trabalho de Baths (exceptuando o lindíssimo e conciso Ocean Death EP). A sua posição mais optimista é de louvar, mas talvez ainda tenha de encontrar a música que a expresse melhor, bem representada em, por exemplo, “Abscond” e o single “Out”, canções lindíssimas que juntamos ao espólio fantástico de uma ainda curta carreira.