Rui Rio ganhou o debate e António Costa ganhou a maioria absoluta
Ideias sobre um paradoxo.
O debate de António Costa com Rui Rio correu muito melhor do que a generalidade das pessoas esperava. O culpado da boa surpresa foi o líder do PSD que surgiu do imenso nevoeiro por onde se perdera. Tomou a iniciativa, provocou os pontos fracos do primeiro-ministro e mostrou estar bem preparado e ter sentido de Estado. A pergunta que alguns têm feito é óbvia e não tem uma resposta linear: se o homem sabe comunicar porque raio não o fez nestes últimos dois anos?
Mas não escrevo estes postais para dizer o que é óbvio e repetido. Por isso, arrisco o paradoxo. Por estranho que possa parecer, depois deste debate em que Rio surpreendeu pela positiva, fiquei com uma convicção mais clara de que o Partido Socialista ganhará com maioria absoluta.
Explico. Todas as sondagens e estudos de opinião apontam para as mesmas conclusões. Uma larga percentagem de portugueses, que inclui muitos que não pretendem votar no PS ou que não gostam de Costa, reconhecem que o país está melhor. Que essa melhoria se reflete no seu bolso, que Mário Centeno inspira confiança e que António Costa é o melhor primeiro-ministro que o país poderia ter face às alternativas. Não estou a afirmar que é a verdade ou que concordo, apenas que é a visão de uma percentagem clara dos portugueses, a sua verdade. É um bocadinho como a aparição de Fátima – não interessa se a nossa Senhora apareceu ou não, isso é irrelevante, o que importa é que milhões de pessoas acredita piamente que sim.
Rui Rio esteve bem, mas jogou o jogo de António Costa. Jogou na ideia de que o PS não diz a verdade quando fala de um oásis económico, tentou provar que é uma falácia o que se diz, que o país desaproveitou uma oportunidade, que a carga fiscal é a mais alta de sempre, que o investimento público é menor do que no tempo da troika, etc. Mais uma vez o problema não é ser verdade ou mentira – e quanto aos números sabemos que os podemos torturar em nosso proveito –, o problema é que os portugueses acham que a sua vida está melhor do que antes e insistir nesse ponto é jogar um jogo onde se perde à partida.
António Costa colocou a postura de primeiro-ministro. E tratou Rui Rio como um grande senhor, um primus inter pares: “não me diga que está a dizer o mesmo que a Dra. Assunção Cristas, do senhor não espero isso”). Deixou-o brilhar por saber que naquele território não poderia ser verdadeiramente atingido. Deixou que Rui Rio fosse ao encontro da sua essência que é social-democrata (ao contrário do que vários dizem não me parece ter um pensamento liberal), uma essência que é economicamente mais à esquerda do é o PSD, uma essência demasiadamente próxima do PS. Noutras circunstâncias, talvez pudesse resultar. Mas nestas, sendo Rui Rio tão próximo de António Costa no modo como vê o país e o mundo, não há razões para que os portugueses mudem o sentido do seu voto.
Não sou favorável a uma maioria absoluta. As maiorias absolutas só fazem sentido em condições excecionais. De outro modo o risco de derrapagem democrática é sempre grande, já o escrevi. Mas parece-me que a batalha está prestes a ser perdida. Não pelo lado da esquerda do PS onde o Bloco de Esquerda irá ter uma votação expressiva e o PCP conseguirá segurar eleitorado, mas por parte da direita onde existirá uma erosão. Muita gente que vota PSD preferirá votar no PS para evitar que Costa se coligue com a esquerda, para o centro político mais vale o poder absoluto de António Costa do que compromissos com comunistas, bloquistas ou mesmo com o PAN.
E foi isso que Rio não fez nestes dois anos. Não teve um projeto inovador e alternativo. Não mobilizou ninguém. Escolheu gente fraca para as listas. Foi teimoso, intolerante e muito pouco democrático no modo como não soube reagir a diferenças de opinião. E não dramatizou o suficiente a importância desta votação. O que está em causa para a direita. É um homem sério, mas no próximo dia 6 a sua noite será longa e difícil.