Salvador Sobral: “Estou sempre a mudar e sempre à procura”

por Linda Formiga,    3 Setembro, 2018
Salvador Sobral: “Estou sempre a mudar e sempre à procura”
Salvador Sobral – Fotografia de Carlos Manuel Martins / Bons Sons
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Na tarde do primeiro dia da 9.ª edição do festival BONS SONS, quando os preparativos estavam a ser ultimados para a maior enchente de sempre deste festival, sentámo-nos à conversa com Salvador Sobral, de visual renovado, para uma conversa informal sobre a música que lhe vai na alma, das muitas colaborações que tem e que quer manter e do seu gosto, cada vez maior, para cantar em línguas que não o inglês. Quase a entrar para estúdio para gravar o seu segundo álbum de originais, Salvador Sobral sabe que a fama que a TV lhe trouxe em breve irá desvanecer, sem que isso reja a direcção que quer tomar.

Este festival [Bons Sons] é integralmente dedicado a músicos lusófonos, qual é a tua opinião sobre a música portuguesa actualmente?
Acho que está a viver um óptimo momento, está a prosperar, como todo o país em todas as suas vertentes. Acho que a música é mais uma reflexão do bem que este país está de saúde e a música portuguesa e tudo o que são estes artistas, desde cantautores a intérpretes, estão a viver um bom momento na música portuguesa.

E achas que contribuíste de alguma forma para isso?
Não sei, seria um pouco prepotente da minha parte. Bem, um bocadinho sim, terei contribuído com a canção e com a vitória de Portugal, um bocadinho também de tudo isto de o país estar a prosperar, por isso fiz parte sim.

E são também vários os exemplos e várias as bandas que tens, vi-te há pouco tempo com os Alexander Search, que é um pouco mais pop rock, em Ferreira do Zêzere, e foi muito interessante ver que o público variava muito de idade, desde jovens a pessoas de mais idade. Esta multiplicidade de projectos, muito jazz, Alexander Search mais pop rock, deve-se a não quereres estar só num registo ou uma certa irrequietude da tua parte?
Sim, é uma inquietude total artística minha e sou super disperso artisticamente, o que não é negativo, já pensei em certa altura que era um bocadinho negativo e que devia concentrar-me só no meu projecto e tal, mas a verdade é que eu gosto de tanta coisa e de cantar tanta coisa que não vale a pena estar agora a cingir-me a uma coisa e a castrar-me. Adoro música da América Latina, tenho o projecto Alma Nuestra que eu tenho imenso orgulho e adoro cantar boleros e rancheras, depois deste projecto, o meu, os Alexander Search que é mais rock também, tudo dá para explorar. Depois o projecto da Madeira, Impro Jazz, que é com os Improváveis de teatro.

Os 2 singles de avanço do teu novo álbum…
Ah, o Cerca del Mar e o Mano a Mano.

E o Cerca del Mar, que é em espanhol, tem muitas influências latinas…
Sim, completamente, eu adoro isso… Mas sabes que os músicos de jazz sempre fizeram isso, o Bruno que toca comigo bateria toca em dez, quinze projectos, o Júlio [Resende] também toca em muitos projetos, o André em imensos projectos e os músicos de jazz têm muito essa cultura e eu gosto de me ver como músico de jazz que toca com várias pessoas.

Há uma certa diferença entre o teu primeiro álbum e os singles de avanço. Há uma certa maturidade, um bocadinho mais denso talvez…
Sim, o primeiro disco é sempre… um bocadinho mais denso, um bocadinho mais profundo se calhar.

Isto foi reflexo do que viveste, a tua vida mudou não radicalmente, mas um pouco…
Não, mudou, mudou bastante. É possível que sim, acho que há uma grande maturidade, sendo que nenhum dos temas é meu. Também o Cerca del Mar é do Leo [Aldrey], que já tínhamos feito bastantes canções para o primeiro disco, mas eu acho que sim, tens razão, é uma coisa mais profunda, e também a minha voz mudou e eu estou sempre a mudar todos os dias e estou sempre à procura, continuamos nesta procura…

E mudas também com as colaborações que fazes? É algo que vais querer sempre alimentar?
Também, as pessoas que estão à minha volta influenciam-me e sim, eu adoro interpretar coisas de outras pessoas, não me sinto um grande compositor, eu gosto muito de interpretar as coisas do Leo, as coisas da minha irmã, as coisas do Júlio…

Salvador Sobral – Fotografia de Carlos Manuel Martins / Bons Sons

Já tinhas dito numa entrevista que te consideras melhor intérprete do que compositor…
Sim, completamente! Hoje, se calhar amanhã vou ser “alta” compositor, mas hoje ainda não é o dia, a minha capacidade enquanto intérprete é superior à minha capacidade enquanto compositor, portanto se eu vou cantar as minhas coisas só porque são minhas, depois não exploro demasiado a minha veia de intérprete, em amplitude vocal, sempre que… sei lá… sempre que o Leo escreve para mim ele já sabe que pode jogar com a minha voz e depois eu vejo as melodias e são complicadíssimas. A minha irmã escreveu uma canção que tem duas oitavas de amplitude, o que é uma loucura, não é? E ela diz “não, não, tu vais poder fazer duas oitavas”, pimba, si bemol ou si bemol não sei quê…

Agora neste segundo álbum vais ter mais músicas em língua portuguesa…
Sabes que quando comecei com a Valentim já tinha gravado o disco, foi logo a seguir ao disco porque eu até gravei o disco na Valentim antes de estar com eles, e eles disseram “ah Salvador, só tens uma canção que é o “Nem Eu” em português, e não é tua sequer, não queres ter mais umas…” e eu disse “não, não, isto saiu-me em inglês e nós compusemos em inglês”, sem nunca querer ceder. Depois olha, afinal a seguir começámos a fazer muito mais coisas em português, a seguir ao “Amar pelos Dois” e eu adoro cantar em português, e eu adoro cantar em qualquer língua, só que o inglês hoje em dia… já não me identifico tanto, gosto de francês, gosto de espanhol…

Foi um passo natural?
Sim, foi natural. Não foi nada forçado. Até porque se fosse forçado seria o contrário, porque agora é que eu sou conhecido na Europa e agora é que deveria fazer coisas em inglês, não é? Do ponto de vista do marketing, eu devia era estar a fazer coisas em inglês para estar a vender coisas lá para fora, mas não sou muito dessas coisas.

Tens de certa forma uma antipatia pela fama?
Sim, mas não ao ponto de me indignar. Estar farto sim, mas também já vivi tanta coisa que isso… agora estou a viver a paz completa porque rapei o cabelo e ninguém me conhece. Estou a viver uma paz que já não vivia há imenso tempo, isso vai acabar, ainda hoje dei uma entrevista à RTP, pronto, isto vai acabar…

O público cresceu contigo, de certa forma, conheceu um género musical com o qual não tinha muita convivência, como o jazz, achas que esta fama acabou por elevar a fasquia do público ao nível da música e do conhecimento musical?
Não sei, a rádio continua igual, a televisão continua igual, acho que não… E agora o que vai acontecer comigo é, naturalmente, uma filtragem do público e as pessoas vão… pronto, o “Amar pelos Dois” fica para trás e vão ficar as pessoas que realmente gostam de mesmo género e gostam da minha música e não daquela canção e vai acontecer uma filtragem natural. E ainda bem, porque não podemos agradar a toda a gente.

Salvador Sobral – Fotografia de Carlos Manuel Martins / Bons Sons

Para terminar, no próximo álbum teremos mais colaborações, mais músicas em português…
Ainda não sei das colaborações, tive por acaso esta semana uma reunião com o produtor, sei que vamos ter uma canção em francês também, que eu adoro o francês, espanhol e português e inglês. Agora, é possível uma colaboração, mas ainda não tenho a certeza é melhor não revelar.

 

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