Sombra digital
Para lá do artigo 6.º da carta portuguesa de direitos humanos na era digital e em plena era das fake news, pouco ou nada de jeito explica que alguém se possa opor a legislação concreta para combatê-las. A carta nacional portuguesa, em linha com a de outros países ocidentais, prevê a proteção do direito de liberdade de expressão, excetuando o da proteção contra a desinformação. Deveria ser claro como água que a avaliação do interesse público em cada caso concreto, prevalece sempre através da máxima “a nossa liberdade termina onde começa a dos outros.”
De alguma argumentação justificada e outra que veio a ser precipitada sobre quem regularia esta medida e verificaria a informação, alguns passaram a uma ofensiva contra qualquer norma per si, que procure combater este problema. Sem qualquer tipo de explicação, digna desse nome, porque não existe nenhuma. Sabe-se que hoje é mais fácil espalhar notícias falsas do que verdadeiras no espaço digital. Truncar informação válida, misturando-a com outra manipulada, é facilmente detetável para quem trabalha em comunicação e noutras áreas.
Fora desse espetro e de todas as suas esferas, sem um conhecimento maior de alguns processos e ferramentas, alguns ainda demoram a percecioná-lo. É no abuso do desconhecimento desses, que avança (sem sucesso?) uma certa agenda. Quase sempre, acompanhada da narrativa que os meios de comunicação social vivem da cultura marxista ou que as redações estão repletas, quase por exclusivo, de pessoas do Bloco de Esquerda, como disse recentemente um comentador na SIC. Analisando qualquer uma das três, cinco ou dez principais publicações e para quem lida profissionalmente com pessoas de todas elas, não existe maior delírio do que o decretar desta avalanche trotskista no jornalismo português. Apenas equiparável aos que veem na legislação desta prática de desinformação uma causa estritamente política, da esquerda, enquanto a direita só a pode relativizar e ser contra.
Noutro patamar estratosférico, alguém como o professor catedrático da FDUL (mais um), Carlos Blanco de Morais que acompanhando do mesmo discurso, mas com uma agenda extremista concreta, não esconde em nenhum artigo que o jornalismo só seria equilibrado, sem uma certa influência marxista que tanto pode ir da esquerda à direita moderada e liberal, claro está, se as narrativas falsas estivessem em pé de igualdade com os factos. Qualquer combate a elas é por isso censurável.
De cambalhota em cambalhota, assim se lança uma suposta defesa da nova liberdade de expressão.
A boa notícia é que Portugal não é uma ilha orgulhosamente só do resto do mundo e são cada vez mais os que estão atentos. A comprová-lo, o estudo recente da Reuters Digital que conclui que 61% dos portugueses confiam na comunicação social e preocupam-se cada vez mais com a desinformação fora dela.
Porque será?