Teatro Cão Solteiro e André Godinho organizam conversa de amigos musicada por PZ e Vaiapraia
Praticamente no início do espetáculo, há uma parte em que nos lembram de “Gi”, uma personagem interpretada por Cecília Henriques, há talvez três anos, ou mais, numa novela de horário nobre de um canal nacional. É, por isso, logo no início do espetáculo que percebemos que aquelas pessoas ali sentadas, vão entrando e saindo, numa roda de cadeiras parecida à de um grupo de apoio, farão delas próprias, gozarão provavelmente com elas próprias e estarão a dizer a verdade. Ou não.
“Could Be Worse: The Musical” é o mais recente capítulo de uma parceria do Cão Solteiro com o cineasta André Godinho. Apesar do nome, não, não é bem um musical. Mas tem música, cinema, teatro, pessoas jovens e os problemas das pessoas jovens que eventualmente serão os mesmos das pessoas mais velhas quando fazem o que estas pessoas jovens (não) fazem. Falamos neles agora porque estão em Ílhavo desde ontem, quase todos já, e o espetáculo sobe ao palco da Casa da Cultura de Ílhavo, no próximo sábado, às 21:30.
Esta parceria a dois, de André Godinho e do Teatro Cão Solteiro, a que depois se juntam mais de uma dezena de conhecidos jovens atores e músicos em palco, é a continuação de um encontro prolongado no tempo, em que têm vindo a descobrir pontos de interseção do cinema com o teatro e pontos de interseção entre si.
Já em palco, mais de um conjunto de artistas simulam uma reunião em que falam sobre o que escolheram para as suas profissões: são artistas. Reuniões em que procuram, talvez em vão, deixar de ser quem são. Numa roda de cadeiras, iluminada por luzes neon, falam dos seus vícios e inseguranças e da possibilidade da cura. No fundo, além de atores ou músicos, são jovens comuns, com problemas “normais”, ansiedade, (des)apego, amor, vícios e, bom, o principal aqui: são artistas.
O texto é de José Maria Vieira Mendes e embora o nome indique que podia ser pior, e podia, não é um espetáculo especialmente feliz. Aliás, se calhar até é um bocadinho deprimente. Mas é sobre a vida e sobre vida, que são coisas diferentes. André Godinho, que faz dele próprio, como todos os outros, diz ali a certa altura que “a vida é o bem mais precioso que temos, a vida acima de tudo, acima da arte, acima da morte, acima da doença, acima de tudo”.
Depois há uns que pintam pessoas a dormir, uma outra chega depois de um acidente de carro, embora o seu maior embate não tenha sido esse, outros não gostam da palavra filme (ou do conceito?), todos concordam, ou parece, que a maquilhagem pesa demasiado na televisão e outros escrevem. A certa altura, uma das atrizes queixa-se que já fez de tudo e alguém responde que conhece esse faz tudo, esse faz tudo que acaba por ser não fazer nada. Bom, podia ser pior. Quem nunca disse, corriqueiramente, que podia ser pior? O resto fica para sábado. Pior seria retirar-vos a ternura da surpresa.
“Could Be Worse”, com este apêndice do “The Musical”, é um espetáculo que é sobretudo para refletir. Não se sabe é bem sobre o quê. Nesta roda, importa dizê-lo, porque vai ouvir-se bem e muito, há sempre música. A banda sonora da peça resulta da cumplicidade musical de PZ e de Rodrigo Vaiapraia, sendo que este último também entra na roda e só come tomate com azeite, sal, vinagre e outras coisas que não recordamos bem. Eram muitas. A banda sonora do espetáculo ficará disponível no final de fevereiro, no Spotify.
Resumindo: isto podia ser uma conversa entre amigos. Entre amigos que tocam, dançam, gritam e cantam. E têm problemas, como todos os outros grupos de amigos. A estrutura para Could be Worse: The Musical está já montada na Casa da Cultura de Ílhavo. É este sábado, a partir das 21:30. Os bilhetes estão à venda nas bilheteiras do 23 Milhas e na bilheteira da BOL.