Tilda Swinton procura respostas em “Memória”, de Apichatpong Weerasethakul

por Pedro Barriga,    10 Fevereiro, 2022
Tilda Swinton procura respostas em “Memória”, de Apichatpong Weerasethakul
“Memória”, de Apichatpong Weerasethakul
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“Que som foi este?” é por certo uma pergunta que fazemos a nós próprios com frequência. Terá sido a televisão? O telemóvel? Alguém na rua? São estas e outras questões que atormentam Tilda Swinton na nova obra do cineasta Apichatpong Weerasethakul, “Memória” – primeira vez na sua carreira que filma fora da Tailândia.

O filme teve estreia mundial durante a última edição do Festival de Cinema de Cannes. Apichatpong já fora muito celebrado aqui: em 2010, o júri presidido por Tim Burton atribuiu ao seu filme, “O Tio Boonmee que se Lembra das Suas Vidas Anteriores”, a Palma d’Ouro. “Memória”, por sua vez, recebeu o Prémio do Júri, honra que é considerada uma medalha de bronze.

“Memória”, de Apichatpong Weerasethakul

A ação decorre em Bogotá, na Colômbia, onde Jessica (Swinton) se encontra de visita à sua irmã Karen, hospitalizada em circunstâncias misteriosas. Karen especula se não terá sido um cão a amaldiçoá-la. O seu marido, por outro lado, teme que se trate de um feitiço lançado por indígenas da floresta amazónica. Quem sabe.

A visita de Jessica muda de rumo quando começa a ouvir sons, ou melhor, um som muito particular, como um estrondo repentino. Recorrente mas de frequência imprevisível: ouve-o a meio da noite, na rua, no restaurante, junto ao rio. Será este som ouvido por outras pessoas? Será o som repercutido nos objetos? O certo é que, por várias vezes, os alarmes dos carros na rua disparam em simultâneo.

“Memória”, de Apichatpong Weerasethakul

Jessica decide então procurar ajuda junto de um engenheiro de som, num estúdio de gravação. Segue-se uma cena fascinante. Ora, Jessica deseja que o engenheiro replique o ruído que a persegue, mas depara-se com a impossibilidade de traduzir um som por palavras. Vemo-la a tentar descrever o som como “redondo”, “de betão” e “terreno” – uma palavra curiosa para descrever um som algo espiritual. Vemos o engenheiro confuso perante a tarefa de reproduzir um som que nunca ouviu. É delicioso. Uma das melhores cenas do ano.

“Memória” é, assim, um filme de perguntas. Perguntas estas que, infelizmente, Apichatpong decide responder nos últimos trinta minutos. Uma decisão que trai a ambiguidade que até então tornara o seu filme tão interessante. Pior ainda, a explicação que inventa assenta em ficção científica. Neste aspeto, faz lembrar o recente “Old”, no qual M. Night Shyamalan insiste em justificar um filme que não necessitava de justificação.

Um elogio final à bela fotografia a cargo de Sayombhu Mukdeeprom, diretor de fotografia de filmes como “As Mil e uma Noites” (Miguel Gomes, 2015) e “Call Me By Your Name” (Luca Guadagnino, 2017).

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