‘TOTEP’: a doçura com um twist dos Kero Kero Bonito sabe a pouco
Há um conjunto de fases pelas quais passa um fã de Kero Kero Bonito (KKB), à medida que descobre e experiencia a música açucarada deste grupo britânico. A primeira é a da curiosidade, despertada pelo metódico e convidativo ambiente electrónico de músicas como “Waking Up”, “Lipslap”, “Graduation” ou “Trampoline”. Num segundo estágio, questiona-se a credibilidade das músicas: “Isto é mesmo uma música sobre saltar em trampolins?” O terceiro e último momento da descoberta é a total rendição a esta sonoridade – simples em conteúdo e deleitosa para os ouvidos. Sarah Perry alterna entre o inglês e o japonês, acompanhada por instrumentais da autoria de Jamie Bulled e Gus Lobban, que se conjugam perfeitamente com a cantiga quase declamada de Perry.
Em 2017 passaram por Portugal; perante um Musicbox muito bem composto, mostraram Bonito Generation, um álbum muito ao seu estilo, repleto de músicas para consumir em doses pouco recomendáveis (porque felizmente ouvir música ainda não engorda). Bulled e Lobban soam mais ambiciosos que na sua mixtape de estreia – Intro Bonito – e Sarah responde adequadamente com uma expansão do seu cantar, um tom menos juvenil e mais assertivo. No entanto, o resultado final é o mesmo: desencadeia sorrisos, ao som desta fusão de electropop e J-pop, que traz cor e vida a qualquer festa.
Este ano apresentam TOTEP, um EP pecaminosamente pequeno. A principal novidade é a maneira como o electropop da banda se funde com outros géneros. Em “You Know How It Is” a praia está à distância de um fechar de olhos, com direito a um solo de guitarra possante. Mas a maior surpresa é “Only Acting”. A faixa emana uma energia de pop punk jovial, e o refrão não destoaria na discografia de Blink 182 ou Sum 41. As partes mais abrasivas – em que se ouvem glitches e repetições exacerbadas – transportam-nos de volta para o seio de KKB, e a música parece desmontar-se e soar como se tivessem riscado a cópia física do tema nos últimos segundos.
Essa junção de mundos destaca-se no curto EP, mas o que o define é a crescente ambição musical dos KKB, relativamente aos trabalhos que o antecederam. A capa de TOTEP contrasta com a de Bonito Generation: a escuridão é um elemento preponderante, e as poucas cores que se notam são mais frias, tímidas e não tão berrantes como anteriormente. “The One True Path” introduz-nos nesta nova etapa, através da sua aura assombrada, e uma temática de busca do caminho ideal, mas a voz de Sarah relembra-nos que estamos a ouvir KKB. Já a aparente leviandade de “Cinema” é contrastada por uma letra mais séria e contemplativa. Mas infelizmente não passa de uma brisa suave, é apenas um suspiro musical quando podia ser muito mais.
E esse sentimento é geral ao EP. Há sem dúvida potencial, mas nunca chega a ser explorado na íntegra. A música açucarada de KKB é temperada com limão, um toque mais ácido, que mostra uma banda com várias camadas – mas acaba por saber a pouco. O máximo que os seus onze minutos conseguem fazer é aguçar o apetite para mais. É uma boa novidade, mas talvez tenha sido apressada em nome da relevância (Bonito Generation já saiu há mais de um ano, no final de 2016). Ainda assim, não deixa de ser agradável ouvir uma das bandas mais frescas, caricatas e coloridas do mundo da música electrónica voltar à carga com as suas premissas musicais simples executadas de forma imperial.
Músicas mais apelativas: “You Know How It Is”; “Cinema”