Vagas em casa de abrigo para mulheres com deficiência vítimas de violência são insuficientes em Águeda
As sete vagas da casa de abrigo para mulheres com deficiência vítimas de violência doméstica “são manifestamente insuficientes” para as sinalizações, alertou a diretora da instituição que gere a resposta, segundo a qual o financiamento é um problema.
O projeto-piloto arrancou em 2018, depois de um convite feito pela então secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Catarina Marcelino, para que a instituição de Águeda, com décadas de trabalho junto de milhares de pessoas com deficiência, abraçasse este novo desafio.
Em entrevista à agência Lusa, a diretora técnica da CERCIAG admitiu que, na altura, o projeto foi um desafio que criou medos, já que, apesar da experiência junto das pessoas com deficiência, a instituição não tinha qualquer experiência na área da violência doméstica.
“Nós achámos que seríamos capazes porque [estava sinalizada] alguma dificuldade em responder às necessidades desta população muito específica na área da violência”, apontou Luísa Carvalho.
A responsável explicou que o projeto arrancou como piloto para que depois “se extraíssem conclusões que fossem capazes de servir de base a resultados e indicadores e que pudesse ser um projeto replicável” a nível nacional.
Segundo Luísa Carvalho, o projeto-piloto deveria durar cerca de dois anos, mas a pandemia alterou os prazos e arrastou até 2023 o que deveria ter terminado em 2020.
Por outro lado, salientou, a pandemia teve também como consequência que as sinalizações por violência doméstica baixassem em comparação com anos anteriores, uma vez que vítima e agressor passaram a viver juntos 24 horas por dia.
“Os casos que foram reportados são claramente inferiores e, no caso das mulheres com deficiência, a questão é ainda mais grave [porque] habitualmente a mulher com deficiência vive com o cuidador, que na maioria das vezes é o agressor e em muitas situações é também o representante legal”, apontou a responsável.
De acordo com a diretora técnica, a resposta existente, e que se traduz na única casa de abrigo deste género em todo o país, é deficitária para a procura que tem existido, fruto de número de casos sinalizados.
“Claramente, em termos das sinalizações que temos, os sete lugares são manifestamente insuficientes”, alertou, destacando todo o trabalho de longo prazo que tem de ser feito com estas pessoas, nomeadamente a construção de um projeto de vida que passe pelo regresso à localidade de origem.
Luísa Carvalho defendeu que é preciso capacitar estas mulheres, mas tendo em conta que a informação tem de ser acessível do ponto de vista cognitivo, já que o acesso à informação “é também um direito fundamental”, e porque só desta forma será possível “prevenir atempadamente (…) situações de violência futura”.
A responsável apontou que “grande parte” destas mulheres são vítimas das pessoas que tinham a obrigação de as proteger, enunciando que há casos de agressões sexuais, situações de abuso medicamentoso, dependência financeira ou retirada de próteses para que as pessoas percam autonomia.
Para a diretora técnica, o trabalho que é feito com estas pessoas serve também para lhes devolver visibilidade e dignidade, salientando que estes cinco anos têm sido “uma experiência única”, num caminho “trilhado com elas”.
Admite, no entanto, que a instituição não estava preparada para que o projeto se arrastasse tanto no tempo, salientando que, ao problema da falta de vagas se soma a falta de respostas nas áreas de residência.
“Está a ser absolutamente impossível e isso cria-nos imensos problemas”, denunciou.
Revelou, por outro lado, que o financiamento da casa de abrigo tem sido um problema ao longo dos anos e que a verba que a instituição recebe não cobre sequer 50% das despesas. Razão pela qual foi pedida ajuda à autarquia local, que garante mais 30% dos custos.
“Conseguimos 80%, mas ainda ficam a faltar 20%”, apontou, alertando que a situação é “absolutamente insustentável” e que em causa estão pessoas com “graves dependências”, algumas das quais “nunca vão ser autónomas”.
Por esta razão, Luísa Carvalho admite que toda e qualquer verba angariada pela iniciativa “Uma Imagem Solidária”, que reúne fotografias de fotojornalistas profissionais e amadores e que este ano reverte para esta instituição, “são extraordinariamente bem-vindas”.
A responsável alertou que o financiamento da casa de abrigo termina em junho e ainda não abriu novo concurso, o que a leva a defender que este tipo de resposta deixe de estar dependente de fundos comunitários para passar a estar incluído no Orçamento do Estado.
Disse ainda ter tido uma conversa com a secretária de Estado da Igualdade e Migrações, Isabel de Almeida Rodrigues, que a tranquilizou, deixando a garantia de continuidade do projeto.