20 melhores filmes de 2018 para a Comunidade Cultura e Arte
O Cinema é uma das Artes que mais discussão promove e as (discutíveis) listas de melhores filmes do ano por parte de pessoas em nome próprio ou medias são já um dado adquirido. Não fugimos à regra e fizemos a nossa lista dos filmes que mais gostámos de ver ao longo deste ano de 2018. Sabendo de antemão que é sempre impossível que tais escolhas sejam unânimes, fizemos uma recolha dos filmes que neste ano que agora finda mais nos marcaram, e que podem ser presença recorrente nesta próxima temporada de prémios que se aproxima (outros, pela sua estreia já tardia em Portugal, já marcaram presença nos Óscares e Globos deste ano que termina).
Para esta lista só foram contabilizados filmes que tenham tido estreia comercial neste ano de 2018 em Portugal, pelo que filmes como Diamantino, de Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt, que só estreou em Portugal no âmbito do Queer Lisboa, não puderam ser ponderados, sendo que ficamos a aguardar pela sua estreia comercial. Importa ainda fazer referência a filmes que em Portugal não têm prevista qualquer data de estreia comercial mas que foram disponibilizados nos serviços de streaming no nosso país, como por exemplo Ouroboros, filme de Basma Alsharif que só pode ser visto no nosso país através da plataforma Mubi e cuja metáfora do ouroboros, a serpente que devora a própria cauda, e a tragédia na faixa de Gaza servem de motor para uma reflexão sobre o papel do esquecimento na caminhada civilizacional, da guerra no quotidiano e sobre a resiliência humana.
20. Death Wish
Eli Roth, o enfant terrible do cinema comercial norte-americano, presenteou-nos este ano com, não um, mas dois novos filmes. Dos dois, Death Wish foi certamente o destaque. Nele, Roth concretiza o filme de ação como fantasia masculina, ilustrando a paranoia da era Trump e o quanto os machismo e racismo estruturais tornam a sociedade americana permissiva relativamente a este comportamento. Entre este filme e The 15:17 to Paris (2018), o ano que termina mostrou uma emergente consciência sobre a problemática consciência coletiva de um país para o qual, infelizmente, muita gente ainda olha com admiração.
19. Šerkšnas
À velha questão sobre ser possível fazer um filme sobre guerra anti-guerra, dadas as propriedades inerentemente estetizantes da forma cinematográfica respondeu este ano Šarūnas Bartas com um claro “sim”. Utilizando um estilo atipicamente austero e com eloquentes jogos entre campo e fora-de-campo, Bartas contraria os impulsos voyeuristas da sua personagem principal (e do seu público), restando apenas a noção de que da guerra apenas morte advém.
18. Spell Reel
Partindo de imagens de arquivo do cinema guineano, Filipa César criou projeções que tomaram lugar tanto na Guiné, como na Alemanha. O resultado é Spell Reel, um filme que, fazendo uso abundante de sobreposições, coloca o seu espetador no lugar de uma segunda audiência: a nossa experiência das imagens de arquivo não é unicamente marcada pelo seu conteúdo, como também pelas reações às suas projeções. São colocados num mesmo plano, como forma de questionamento, polos opostos: passado e presente, analógico e digital, colonizador e colonizado.
17. Columbus
Um drama indie e minimalista, cheio de alma, trazido por Kogonada e uma fotografia fascinante de Elisha Christian, que nos leva num verdadeiro roteiro em descoberta de uma localidade cheia de edifícios com poderes curativos, que nos levam à contemplação, acompanhados de dois talentosíssimos actores: John Cho, na pele de Jin, e Haley Lu Richardson, como Casey, a interpretarem dois espíritos vagueantes, mas de forma diferente.
Um filme sensorial sobre a experiência de um britânico em duas das prisões mais perigosas da Tailândia, onde a única forma de sobreviver é através do Muai Thai. A tensão das cenas é elevada a extremos, através de factores simples: a falta de legendas na maior do filme, a falta de condições nas celas, a violência extrema, a religião que contrasta em variadíssimos momentos com a falta de valores, as tatuagens e olhares assassinos dos reclusos, o tráfego de droga, os assassinos e as violações. Este é um filme que choca até os mais durões.
15. Annihilation
Pode-se fizer que este foi uma aposta da Netflix. Annihalation é um filme que transcende a ficção científica e entra no patamar filosófico. No fim, é difícil não ficarmos com um sentimento de inquietude e questionar-nos se compreendemos a mensagem e tudo o que se tinha passado. No meio de uma Natureza violenta e que não distingue humanos de plantas, existe uma beleza surreal que vai para além do primeiro impacto.
14. The Killing of a Sacred Deer
Um filme incrivelmente perturbado que se baseia na mitologia grega, onde o palco do teatro são as próprias cenas e o pathos vai aumentando até um patamar em que o espactador fica em silêncio paralisado. Este é mais um filme desconcertante a acrescentar à lista do já conceituado realizador Yorgos Lanthimos. No fim, questionamo-nos até que ponto compreendemos a mensagem ou sequer existia uma; todo um cenário hipotético e extremado que nos faz pensar na nossa própria moral.
13. Western
Uma tranquilidade sublime que retrata a aventura de um estrangeiro num país que lhe é totalmente desconhecido, mas também a humildade, o amor, o patriotismo exacerbado, o colonialismo e a Natureza. Tudo num só, sem mensagens explícitas, mas cheio de riqueza. Vale a pena ver este filme e reflectir o que é ser um cidadão de um mundo cada vez mais globalizado, mas onde ainda existem recantos onde a cultura e a tradição ainda têm um papel importante, bem como o sentimento de comunidade.
12. Hereditary
Hereditary é não só uma obra-prima de género em termos de argumento e realização, como o eleva com uma interpretação fabulosa de Toni Colette, já premiada nalguns círculos. Um slow-burner de terror familiar que vai gelando o espectador em crescendo, para um climax arrasador. Raramente o ambiente de horror foi tão bem capturado em cinema. Hereditary fica nos compêndios do género ao lado de títulos como Rosemary’s Baby ou o Exorcista.
11. Blackkklansman
O novo filme de Spike Lee é um misto refrescante de thriller, comédia e horror, que põe o dedo na ferida da temática da desigualdade racial nos Estados Unidos de forma descomplexada e com uma narrativa light na forma, mas pesada no conteúdo, com uma estrutura formal invulgar a duas velocidades, alternando entre tensão e descompressão. O cenário 70s e o duo buddy cop composto por John David Washington e Adam Driver é delicioso.
10. First Man
Ao terceiro filme, Damien Chazelle atinge a maturidade cinematográfica. First Man é mais que um documentário ficcionado sobre a viagem de Neil Armstrong à Lua, é um portento técnico visceral e provavelmente o filme mais bem realizado do ano. Chazelle foge aos chavões do biopic para se focar numa experiência muito mais fria e imersiva para o espectador, arredada numa interpretação sem desprovida de sentimento de Ryan Gosling.
Black Panther é o terceiro filme do realizador Ryan Coogler, o mesmo de Creed e Fruitvale Station, e Chadwick Boseman volta a interpretar o papel de T’Challa a.k.a. Black Panther. Black Panther é uma reflexão aprofundada de uma história de um continente, de um país, de uma família da realeza e de um jovem rei que enfrenta diversos problemas e para os resolver tem que ser diferente dos seus antecessores. Pantera Negra coloca-nos em confronto com diversos temas: se devemos abdicar do nosso estilo de vida para ajudar outros com mais necessidades, quando é sabemos que temos recursos para apoiar os outros, ou se nos devemos concentrar só em nós próprios.
À semelhança de outros filmes de Philippe Garrel, um dos nomes mais fortes do cinema independente francês, L’amant d’un jour é um filme observacional, mais do que aquilo a que estamos habituados num filme típico. Um triângulo composto por pai, namorada e filha é o centro de estudo das relações que nos são dadas a estudar e analisar. Os silêncios, os olhares, os gestos inacabados. Tudo tem significado nas obras de Garrel.
Obra baseada nas obras autobiográficas de Nic e David Sheff, jovem adulto viciado em metanfetaminas e seu pai, a expectativa era a de um filme singular acerca do vício e da dinâmica da relação entre pai e filho. Duas interpretações fantásticas de Chalamet e de Carell como filho perdido e pai desesperado, respetivamente, e a exposição de uma tipologia familiar que raramente se encontra no cinema: a do pai como principal encarregado de educação, com a mãe relegada a um papel secundário.
Um dos melhores filmes do ano é sem dúvida First Reformed, de Paul Schrader. Uma brilhante carta de amor ao cinema de Bergman, Dreyer, Bresson e Ozu que apresenta ideias próprias raramente tratadas em cinema, como o confronto entre a fé, o aquecimento global e os interesses industriais. First Reformed trata-se de um belíssimo drama interior de personagem do argumentista de Taxi Driver através de uma das melhores interpretações da carreira de Ethan Hawke. Um portento estético a nível de cinematografia e planos, com uma realização transcendental, como Schrader havia descrito no seu livro de 1972.
Um documento histórico tremendo, vigoroso e fortíssimo, demasiado valioso para ser subestimado. Até porque teremos de regressar a ele, pois a forma como o realizador de 87 anos sintetiza a sua maneira de encarar o mundo merece todo o nosso esforço e até uma certa perplexidade, neste processo de constante maturação que compõe este ‘Livro’, como se fosse uma pintura multimédia criada num momento de êxtase criativo. É que Godard trabalha os excertos, os fotogramas (ou os pixels) e o som da mesma forma como um DJ mistura uma banda sonora e cria algo novo.
The Florida Project é um filme brutalmente honesto, gracioso e descarado, como a idade dos seus principais protagonistas assim obriga, e com um dos finais mais marcantes do ano. Um verdadeiro grito de socorro e de despertar de consciência. A obra de Sean Baker ganha com o facto dos seus actores serem praticamente todos estreantes (Bria Vinaite foi inclusive descoberta através do Instagram ), dando ao filme um cunho de frescura, de verossimilidade, e a nós, que não estamos habituados a ver as caras, ajuda-nos a transportar para esse Mundo de outsiders da sociedade.
3. Shoplifters
O vencedor da Palma de Ouro em Cannes, Hirokazu Koreeda traz-nos a temática familiar hiper-realista que é subgénero no cinema japonês, aperfeiçoado pelo mestre Ozu. A forma como observa a natureza passional e sanguínea do laço familiar é desarmante, bem como a realização invasiva do seio familia. A delicadeza semi-documental com que filma as relações entre personagens e as desenvolve é algo de arrebatador até para o espectador mais frio, e ainda assim Koreeda resiste à catarse em tela, deixando para o recato do espectador.
2. Roma
Roma é um livro aberto, é uma carta de amor à mulher que nos educa e nos cria. É um retrato da vida infantil, em contraste com o mundo dos adultos, mas é sobretudo uma dedicação às memórias intimistas e passadas de Cuarón. Alfonso resolveu usar duas horas para nos dar a conhecer a saudade que sente dos momentos simples e passageiros da sua infância: a chuva vista através da janela, a água no lava-loiça, a ida ao cinema ou as brincadeiras com os irmãos. Essa saudade nota-se graças à atenção dado ao detalhe que nos faz sentir como se pudéssemos continuar a ver estes momentos infinitamente. Uma obra de homenagem à mulher que o criou.
Com Phantom Thread, Paul Thomas Anderson parece ter atingido o ponto de rebuçado, de equilíbrio perfeito aliado a uma visão cinicamente eficaz e indestrutível, tal é a lógica do que observamos em tela, sobre essa tão díspar arte que é o cinema. A verdadeira estrela de Phantom Thread não é o seu preciso argumento ou as suas muito inspiradas interpretações (à dos dois protagonistas junta-se uma terceira, Lesley Manville, enquanto irmã de Woodcock), mas antes toda a sua componente técnica, com a banda sonora de Jonny Greenwood a ser o adorno perfeito, impondo a sua presença como se de uma personagem se tratasse, sobretudo ao piano, guiando o diálogo, o movimento, o olhar e a tensão que pauta todo o filme.