#40 Essenciais do Cinema. “Woman in the Dunes”, de Hiroshi Teshigahara
Se estás a ler isto é porque chegaste ao “Essenciais do Cinema”– uma nova rubrica da CCA para quem quer descobrir um pouco mais. Com temáticas menos generalizadas, por vezes menos actuais mas igualmente relevantes. Com tudo isto, é normal que por aqui encontres – e temos mesmo de te avisar – mais texto. Bem-vindo ao “Essenciais do Cinema”.
Woman in the Dunes (1964)
Realizador: Hiroshi Teshigahara
Protagonizado por: Eiji Okada, Kyôko Kishida e Hiroko Itô
“Woman in the Dunes”, de nome original “Suna no onna”, é um dos meus filmes preferidos e é, muitas vezes, referenciado como uma das derradeiras obras-primas do cinema japonês. É de um dos génios subvalorizados da indústria, Hiroshi Teshigahara, tendo resultado quase na ‘morte’ do próprio realizador, ironicamente. Ironia essa que será explicada mais à frente. A perfeição e genialidade do filme acabou por prejudicar a carreira de Teshigahara. Por isso mesmo, o cineasta é esquecido na lista dos mestres do cinema, com lançamentos frequentemente mal interpretados pelo público e ignorados aquando do lançamento. Apesar de tudo isso, Teshigahara é, agora, considerado um dos realizadores do cinema japonês e um dos mais influentes de todos os tempos. Não será a única vez que irão ler sobre o realizador nesta nossa rubrica dos Essenciais.
Este filme foi uma das raras excepções da senda de críticas nefastas ao realizador. Foi bem recebido e tornou-se num clássico do cinema, sendo um dos poucos filmes perfeitos alguma vez feitos. Desempenhos excepcionais e intrigantes, emoldurados com uma história cativante e filosófica, completam uma produção que não teve par na carreira do realizador. É um filme surrealista, apresentando uma versão modificada sobre a existência humana.
Um entomólogo está a fazer uma expedição e perde o último autocarro de volta para a cidade, numa vila semi-deserta rodeada por areia e dunas. Os habitantes da vila oferecem-lhe um lugar para pernoitar e é enviado para uma duna onde vive uma jovem viúva. O trabalho da viúva, apesar de parecer pouco importante, é, naquela situação, de suma importância. O trabalho dela é retirar a areia da duna, de forma a que a sua casa não fique enterrada de areia, sendo que a areia está sempre a avançar e a ganhar terreno, acabando por se tornar numa tarefa interminável e solitária. Esta tarefa, só de si, apresenta um simbolismo carregado de dúvida sobre a própria existência humana.
A relação entre os dois torna-se mais difícil com o avançar da história, principalmente a partir do momento que o homem percebe que não irá conseguir sair dali e voltar à cidade. Acaba por se ver obrigado a ser a companhia da mulher, que vê no homem uma presença carinhosa e amiga. O homem perdura na tentativa de fuga, mas a fuga é-lhe sempre negada. Eventualmente, esta relação ganha novas dimensões e vai tornando-se cada vez mais densa.
“Woman in the Dunes” (org: “Suna no Onna”) apresenta uma abordagem metafórica da existência humana, sendo simbólico do propósito da humanidade no planeta. A tarefa infindável realizada pela viúva poderá representar a questionável existência humana. Poderá também representar a sensação de perda e a necessidade de escape de uma realidade fútil. Também poderá ter uma interpretação política, a de uma sociedade que domina e controla tudo, deixando os mais inteligentes e capazes vulneráveis e sem saída. O filme está disponível na íntegra no YouTube.