“The Favourite” é a celebração da mulher, onde tudo é entregue com sentido de escárnio e ironia

por Comunidade Cultura e Arte,    21 Fevereiro, 2019
“The Favourite” é a celebração da mulher, onde tudo é entregue com sentido de escárnio e ironia
“The Favourite” (2018), de Yorgos Lanthimos

Não estaria a mentir se dissesse que passei os últimos 3 meses a coçar-me todo para ver The Favourite. Yorgos Lanthimos é um realizador que já me conquistou desde Dogtooth (2009), mas desde aí para cá, The Lobster (2015) e The Killing of a Sacred Deer (2017) cimentaram-no como um dos melhores realizadores a trabalhar hoje em dia, e também um dos meus favoritos (get it?). E (finalmente) a Academia foi obrigada a dar-lhe atenção. Aleluia.

A história segue a Rainha Anne de Inglaterra (Olivia Colman) no século XVIII. A guerra com França está em total ebulição, mas a rainha é uma completa inapta no que toca a liderar, sendo a sua amiga mais próxima, Sarah Churchill (Rachel Weisz) a governar o país atrás das cortinas. Nisto chega à corte Abigail Hill (Emma Stone), uma prima de Sarah e antiga senhora caída em desgraça, à procura de emprego. Entretanto Abigail tenta lentamente aproximar-se da rainha, criando uma rivalidade com Sarah pelo amor da Rainha.

“The Favourite” (2018), de Yorgos Lanthimos

A última obra de Lanthimos é, à semelhança de um número respeitável de filmes este ano, a celebração da mulher. Claro que sendo um filme do mestre grego, tudo é entregue com um sentido de escárnio e ironia, o que no fundo acaba por amplificar cada elemento temático do filme, exemplo disso é facto de todos os homens serem apresentados com perucas extravagantes, quantidades quase nocivas de maquilhagem, ares pomposos e mais focados nas futilidades como por exemplo corridas de patos (sendo o pato Horatio uma das estrelas do filme), do que no futuro do país.

Enquanto isso, as três mulheres carregam todo o filme, não sendo os homens mais do que meros peões nas suas mãos. Não se pode dizer que o filme tenha uma história com uma finalidade incrível ou um terceiro ato onde existe um ponto alto dramático e tudo e resolve, mas temos, isso sim, arcos narrativos que se finalizam de forma magnífica. É exatamente o que apresenta ser. Uma luta pela atenção da rainha, e entre dois amores muito diferentes. Enquanto o amor que Sarah lhe oferece é verdadeiro, mas também cruel, a atenção que Abigail lhe dá transpira a falsidade e aproveitamento, mas é também muito mais carinhoso em oposição a este primeiro. É estranhamente paradoxal e forma-se uma luta interessante entre Weisz e Stone que tem tanto de hilariante como de macabro.

“The Favourite” (2018), de Yorgos Lanthimos

O filme merece ser experienciado no grande ecrã, porque a fotografia é espantosa. Vê-se muita inspiração em Barry Lyndon (1975) (eu sei que ando a abusar das referências a Stanley Kubrick) com o uso total de luz natural que aqui funciona de maneira espantosa, muito graças à escolha das localizações favorecer este tipo de luz. Tem também uma escolha interessante de ângulos, porque a maioria dos diálogos é filmado num plano extremamente baixo, dando um gigantismo estranho e um tanto engraçado às personagens em questão. Eu vou parar porque podia falar da fotografia de The Favourite durante horas, e eu não tenho esse tempo, nem vocês.

A música clássica é usada com mestria como sempre é nos filmes de Lanthimos, mas o uso de várias cordas experimentais usadas em diversos pontos do filme, amplificam a estranheza do ambiente.

“The Favourite” (2018), de Yorgos Lanthimos

Fazer esta crítica foi difícil, mais do que o habitual. Tenho tido dificuldade em transparecer até que ponto The Favourite é o trabalho de um génio porque sinto que quaisquer que sejam as palavras que eu possa usar, serão sempre, ou demasiado curtas e fúteis, ou excessivamente longas e maçadoras. Esta última aflige-me principalmente, porque este filme foi de tal modo hilariante que estar a fazer uma crítica mais densa parece-me estranho, mas por outro lado, há tanto conteúdo para ser explorado que fica difícil decidir o que fazer.

Vou arrumar a trouxa. Já chega. Posso dizer que dos 10 Óscares para que está nomeado, e tendo visto praticamente tudo o que tinha de ver, The Favourite é o melhor filme em 9 das categorias, apenas a de realizador deixo aberto entre Cuarón e Lanthimos, embora eu ainda assim prefira o grego. É provavelmente o meu filme de 2018 também.

É preciso mais? Se puderem vão ao cinema dar os vossos euros ao senhor Yorgos, ele não é mau a fazer filmes. Desenrasca-se.Crítica de Rafael Félix
Rafael Félix tem 22 anos é natural de Sintra e abandonou uma licenciatura de Engenharia Informática para se dedicar totalmente às suas duas grandes paixões: a escrita e o cinema, ambicionando seguir os seus estudos na área do Jornalismo.

Esta crítica foi originalmente publicada no site www.cambadadecriticos.pt, tendo sido aqui publicada com a devida autorização do autor.

 

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