A estrada dos nossos sonhos
Quem sai aos seus pode não degenerar e quem se subjuga à massificação, normalmente, apresenta um índice elevado de desinformação. Constituo um exemplo vivo destas amostras, primeiramente pelo facto de os meus pais não se envolverem no escutismo e eu o ter feito e por, em segundo lugar, discordar daquela maioria completamente obtusa e ignóbil face ao movimento que profere “que o escutismo é vender bolos à entrada das igrejas” ou “ajudar velhinhas a atravessar passadeiras”. A inflexibilidade destas almas é assustadora, porque nunca vivenciaram e, como não o pretendem fazer, destilam a missiva odiosa ou porque efetivamente já provaram o trago, soube-lhes mal e estendem a pregação boçal.
Graças aos meus (quase) 14 anos embebidos no espírito de Baden Powell, quatro pessoas (comigo incluído, obviamente), embarcam dia 2 de setembro para aquela que, seguramente, se traduzirá numa das mais distintas caçadas de uma vida. Uma Road Trip pelo Douro Vinhateiro. Até aqui nada de extraordinário, também concordo. O segredo está na confeção e na cozedura dos ingredientes: um fogão, uma tenda, um carro, primeiros socorros, quantia de dinheiro previamente estabelecida e segregação integral do mundo dos bytes e dos cliques. Aventura provecta e inveterada? Talvez. Se é comum e usual em pleno século XXI? Não. Se queremos primar pela diferença e esta é a oportunidade ideal? SIM.
À demanda, sem margem para dúvida, do zénite existencial e da essência de vida, na nossa perspetiva. E tal empreendimento não aconteceria se os nossos âmagos não se encontrassem em total e constante fusão: a vontade inenarrável de sondar aquilo que a natureza tem para nos segredar sob a alçada de todos os imprevistos a ela confinados, calcorreando e contemplando as paisagens que já todos conhecemos e de visitar e grafar as zonas prósperas em História, mas olvidadas pelo centralismo abrupto e enrugado.
A meta da concretização pessoal estimula-se pela proximidade à população anciã. A ajuda é pedra basilar, almejamos cingir esforços e energias com o desígnio de colmatar as suas inaptidões naturais e viver contiguamente às suas preocupações e vulnerabilidades, demonstrando que ainda existem pessoas que dão sem receber, que se interessam pelo Interior de Portugal, que dão importância ao trabalho ago-pecuário árduo desempenhado ao longo de uma vida e que pretendem permutar testemunhos e experiências. E não, não é uma promessa politizada e utópica como as que evacuam o Parlamento, é a palavra de quatro jovens e isso basta.
E claro, a fuga à realidade. O assunto eclodiu e, após uma conversa demorada, concluímos que a viagem seria uma espécie de subterfúgio ao mundano, ao supérfluo, à índole parasitária produtora da frivolidade de tudo e mais alguma coisa, às redes sociais, aos reality shows que estupidificam e embevecem qualquer pessoa pela escassez cultural que auferem, às mordomias da gama política, às músicas dos Delfins e dos Pólo Norte e ao processo E-Toupeira. Aqui, vem à baila Fernando Pessoa e a “dor de pensar”: quem pensa é dominado pela infelicidade, porque a ingenuidade traz felicidade. Serão, certamente, sete dias felizes…