Quarentena. 10 previsões para o pós-pandemia
Rui Cruz é humorista, stand up comedian e um génio (palavras dele). Escreve coisas que vê e sente e tenta com isso cultivar o pedantismo intelectual que é tão bem visto na comunidade artística.
Hoje não me apetece falar do presente. Não vou falar do vídeo de propaganda ridículo do Trump e da vergonha que foi aquela conferência de imprensa para a democracia americana, não vou falar da telescola (ainda…), não vou falar da crise económica que aí vem e que ser bem pior do que pensávamos, não vou falar do novo bate boca Norte vs Sul ou Sul vs Norte, para ninguém ficar ofendido, não vou falar de nada disto. E não vou porque hoje não me apetece estar aqui, neste tempo, preso a esta realidade. Hoje apetece-me estar lá à frente, no futuro, depois da quarentena ser levantada, a ser como o Malhão e a passear na rua. E como hoje não me apetece falar do presente, vou antes deixar as minhas previsões para os tempos pós quarentena. Porquê? Porque me apetece e porque se a Maya faz isto e ainda há quem lhe pague, pode ser que me aconteça o mesmo.
E aqui estão elas. 10 previsões para o pós pandemia:
1- Marcas de roupa vão lançar coleções de material de protecção com nomes tipo “PanDemiGoddess”, “CoviDifferent” ou “Bad Bitchorona” e com o mote “A pandemia também pode ser sexy”. Influencers criam máscaras com o seu sorriso estampado e miúdas compram às centenas para finalmente terem os lábios da Kylie Jenner sem precisarem de fazer um botão de rosa a um copo.
2- Clubes de futebol vão deixar de poder comprar jogadores e ter de aproveitar os que estão emprestados. Jhonder Cádiz faz dupla demolidora com Seferovic no Benfica e Bruno Gaspar com Paulinho no Sporting.
3- Acabam os reality shows em Portugal porque ninguém quer ouvir falar de gente presa em casa nos próximos 20 anos. Futuros concorrentes têm de arranjar trabalho o que vai provocar uma saturação do mercado de RPs, barmaids, PTs e “modelos de instagram”. Discotecas do interior do país perdem metade da programação cultural com o fim das “presenças”.
4- Portugal vai bater o record de acidentes na estrada o que vai causar mais mortes do que o vírus em si porque, se já não conduzíamos bem, agora que perdemos a prática cada viagem vai parecer o demo jogável do Karmageddon.
5- O Tinder vai crashar devido ao aumento vertiginoso de actividade e adesão e, copiando a pandemia, atingir um pico que a app não estava preparada para ter. Pessoas vão ser obrigadas a conhecer outras pessoas na rua e a desenvolver skills sociais. Emoji beringela fica em vias de extinção.
6- Turismo entra em colapso e todos os estabelecimentos com um nome acabado em “…do Bairro” vão transformar-se em escape rooms de terror onde tens uma hora para descobrir como vender pica-pau rijo e moelas sem sal, a 50€ o pires, a portugueses. Milhares de trotinetes são abandonadas nas ruas criando matilhas selvagens que atacam transeuntes e centenas de animais selvagens são vistos a passear em Airbnbs agora despidos de presença humana. #OVírusSomosNós
7- Marcas de bronzeador artificial sofrem aumento brutal na procura e solários ficam cotados em bolsa. Góticos latinos ficam felizes porque, pela primeira vez na vida, não precisam de meter base de palhaço na cara para parecer que não apanham sol há meses.
8- O problema da população envelhecida é finalmente resolvido com as milhares de crianças que vão nascer da irresponsabilidade dos festejos e com a quantidade de velhos que o bicho vai matar até lá. Aumento das famílias monoparentais e de bebés na reciclagem.
9- Quim Barreiros lança uma música a tempo das festas académicas com rimas marotas com a palavra “corona” e trocadilhos com “covid”. Qualquer coisa como “ela bem que gritava: ‘ai que eu tenho corona’, mas a gente o c’ovid foi ‘ai que eu tenho uma con…’!”. Humor.
10- Artistas portugueses pedem apoios ao estado para cobrirem as despesas das obras que tiveram de fazer em casa para conseguirem fazer lives sem se ver a humidade nas paredes e as rachas no tecto.
E aqui ficam as sugestões do dia:
Comédia:
Eddie Griffin – You Can Tell’Em I Said It
https://www.youtube.com/watch?v=SrHQtE-c-rk
Música:
Oasis – Definitely Maybe
Cinema:
Federico Fellini – Roma
Literatura:
Friedrich Nietzsche – Assim Falou Zaratustra