“The Trial of the Chicago 7”: o melhor elenco do ano (para já) num empolgante drama legal
“The Trial of the Chicago 7” é apenas o segundo filme realizado por Aaron Sorkin, mas há já 30 anos que o norte-americano tem deixado a sua marca na cultura pop. Na televisão, criou e escreveu as aclamadas séries “Sports Night” (1998-2000) e “The West Wing” (1999-2006). No cinema, a lista é longa e cheia de êxitos: o courtroom drama “A Few Good Men” (1992); a comédia romântica “The American President” (1995); a trilogia de filmes biográficos “The Social Network” (2010), “Moneyball” (2011) e “Steve Jobs” (2015). Guionista em todos estes filmes, vencedor até do Óscar de Melhor Argumento Adaptado por “The Social Network”.
A escrita por si só não satisfazia Sorkin e por isso aos 56 anos virou-se para a realização com “Molly’s Game” (2017). O filme, protagonizado por Jessica Chastain, foi uma desilusão de bilheteira. Boas notícias: “Chicago 7” não sofrerá desse problema. Face à atual situação pandémica, a Paramount vendeu o filme à Netflix, que o lançou diretamente em streaming. Mais boas notícias: em termos de qualidade, “Chicago 7” é uma melhoria em relação a “Molly’s Game”.
O ano é 1968. A Convenção Nacional Democrata está prestes a realizar-se na cidade de Chicago. Três grupos distintos – os Estudantes por uma Sociedade Democrática, o Partido Internacional da Juventude (os yippies), e a Mobilização Para Acabar Com a Guerra no Vietname – organizam protestos pacíficos contra o recrutamento mensal para o esforço de guerra contra o Vietname. Escusado será dizer que o confronto policial que se seguiu foi tudo menos pacífico.
Sorkin não nos mostra o conflito de imediato. Salta do pré-convenção para o julgamento pós-convenção: o governo dos E.U.A. contra os 7 maiores representantes dos protestos, acusados de incitação a revolta. Sete é um grande número e Sorkin encarrega-se de o preencher com um elenco memorável: destaque maior para Mark Rylance (o advogado da defesa), Sacha Baron Cohen (o conhecido Borat, aqui num papel tanto dramático como cómico) e Frank Langella (o desprezível juiz). Os grandes nomes não ficam por aqui: Eddie Redmayne, Jeremy Strong, Yahya Abdul-Mateen II, Michael Keaton, Joseph Gordon-Levitt, entre muitos outros. É um verdadeiro ensamble, com fantásticas interpretações que por si só justificam ver o filme.
Onde Sorkin mais surpreende é no balanço que o seu argumento consegue fazer de tantos temas diferentes em um filme só. “Chicago 7” é sobre protestos civis e violência policial, mas também sobre um sistema judicial corrupto. É sobre racismo, mas também sobre a América dos anos 60. Na verdade, todos estes temas encontram-se naturalmente relacionados, mas Sorkin atinge um equilíbrio ideal, abordando tudo sem fazer pesar o filme.
Obviamente, Sorkin é primeiro um argumentista, segundo um realizador. Constatamo-lo em “Chicago 7” pelo rol de sorkianismos presentes, as marcas distintivas da sua escrita: tom sério mas com humor (check), diálogo veloz (check), cena carinhosa entre pai e filha (check), referências desportivas (check), auto-plágio (check, a piada do ovo já fora usada em “The West Wing”). Sorkin não consegue evitá-lo. É mais forte que ele. Mas não há problema: é a sua marca, é o que faz dele Sorkin.
O problema surge quando Sorkin usa e abusa do que o torna tão característico. Não há situação mais propícia a tal do que um filme no qual Sorkin é tanto o argumentista como o realizador. Não há ninguém que o chame à Terra, que controle os seus impulsos. É por esta razão que as parcerias de Sorkin com cineastas – Rob Reiner, David Fincher, Bennett Miller, Danny Boyle – funcionam melhor que os seus projetos a solo. “Chicago 7” não é exceção: a cena da empregada doméstica a confrontar Tom Hayden, a troca de olhares destroçados entre Dellinger e o filho que assiste nas bancadas, o último discurso de Hayden… São três momentos de revirar os olhos e exemplos da lamechice a que Sorkin recorre quando não há ninguém que o supervisione. No caso particular de “Chicago 7”, uma boa parceria teria sido com Steven Spielberg, que curiosamente intencionava realizar este filme em 2007.
Em suma, “Chicago 7” é um filme de grandes diálogos e grandes interpretações. É tão revolucionário como a revolução que retrata? Não, de todo. É um filme comercial à moda antiga. Mas é bem produzido, bem escrito, bem representado e bastante cativante. Se for fã de courtroom dramas, vai gostar deste filme. Se for fã de Aaron Sorkin, vai gostar deste filme. E se for membro da Academia, vai adorá-lo e com certeza nomeá-lo para o Óscar de Melhor Filme.