Se calhar, ter começado com o elevador não foi boa ideia
Pensei num elevador, mas considerei a possibilidade dialética em demasia. Que espécie de psique reflete sobre mecanismos que ascendem não sei para onde e pendem para valores negativos? Já sei. Uma pertencente à categoria “repugnância e fobia pela exatidão da Matemática”. Face à conjuntura anterior, todo o racional, sem segregações, devia integrar a Ordem dos Pensantes. O bastonário e o principal responsável pela organização seriam eleitos democraticamente e substituídos mediante a erosão contemplada. Assim como numa partida de futebol com os amigos.
Neste momento, espremi todos os gomos da ideia laranja. Ideia laranja não significa necessariamente algo concreto, apenas uma expressão utilizada e arrogantemente disposta na frase. Se eu expuser a situação e fingir que me encontro nas instalações do Quem Quer Ser Milionário ou do Joker, posso solicitar a ajuda da plateia? Prometo erigir os esforços possíveis para dividir equitativamente o prémio monetário.
Falei com o Rui André Soares e propus-me a redigir alguma coisa sobre a dificuldade (ou facilidade) que as pessoas detêm em planear e estruturar uma conversa de circunstância. Ao que parece, foi aprovado prontamente e deixado à minha inteira responsabilidade. Todo o ser humano erra e, por norma, só se apercebe do erro quando não logra os trunfos para o remediar.
Se calhar, ter começado com o elevador não foi boa ideia. As conversas sobre a meteorologia estão gastas e a maioria dos filmes/séries atingem elevados níveis de boçalidade quando tentam, de alguma forma, reproduzir a trama e os silêncios que extrapolam as paredes do pequeno retângulo.
Qualquer professor catedrático que observasse esta dissertação e pensasse estar na presença de um trabalho académico, demandava ironicamente pela definição e contextualização do termo “conversa de circunstância”, não olvidando a bibliografia disponibilizada ao longo as aulas e a pesquisada posteriormente, para bem do aluno. Com sentimento de piedade a tender para menos infinito, informo que esta não é matéria sobre a qual possam erguer críticas tão construtivas e frutíferas como a primeira casa dos Três Porquinhos.
A etimologia da expressão “conversa de circunstância” é conhecida por poucas pessoas e nenhuma delas faz parte a minha rede de contactos. Rodrigues (2022) sustenta que o fenómeno que transforma e traduz a locução nominal em latim é pedante porque atribui e descredibiliza as orações proferidas em sítios como o Vaticano e tal.
Por sua vez, Alves (2022) assegura que a conversa de circunstância acontece in loco e que pode constar no curriculum vitae de vivalmas; por acréscimo, tece uma objeção à teoria de Rodrigues, declarando que se a utilização de termos em latim se impusesse um ato de descrédito, o mundo da advocacia estaria condenado.
A apreciação crítica surge dentro de momentos. Não prima o botão de bloqueio do seu telemóvel. Se lidou com imbecilidade até ao momento, por que não continuar a fazê-lo?
Estabelecer conversas com colegas de profissão com os quais não acasalamos psicológica ou fisicamente e fingir que nos interessa saber qual o membro mais votado para o epíteto de “alcoólico da comunhão do enteado” ou visualizar as fotografias do empregado mais velho do escritório em 1972, num tasco de Alfândega da Fé, a folhear o Primo Basílio e a fazer um manguito — num claro desafio à Opus Dei e ao Estado Novo — é doloroso.
Contactar com familiares que nunca vimos em festas ou velórios de pessoas em comum, perceber que eles são nossos tios numa rápida fração de segundos e ser quase impingido a resumir-lhes a vida pessoal em 15 minutos ou conhecer os progenitores do/a nosso/a companheiro/a, conservar a posição ideal da cavidade bocal num sorriso torturante e aflitivo e conter ao máximo o turbilhão das infinitas maneiras de admitir que gostamos da filha/o — sem dar a entender que, cinco vezes por semana, à tardinha, nos amigamos mútua e constantemente — é cruel.
Definitivamente, prostrar o “elevador” à ideia da composição foi cogitação que podia ter sido evitada.