A arte da vida na cultura que somos
Por estes dias tenho lido o livro A Arte da Vida, de Zygmunt Bauman, e relembro os recentes périplos que o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, tem feito mensalmente, intitulados de Cultura que Somos.
Esta é uma importante iniciativa que coloca decisores ao lado de makers, que dá voz a quem poucas vezes a tem, ou pelo menos que faz ouvir quem tem algo a dizer e expressar, literalmente.
Fiz, na minha leitura, esta ponte porque Zygmunt nos lembrou no livro do discurso de Kennedy em março de 1968, em que nos dizia que o PIB não mede o que faz a vida valer a pena. É impossível, hoje em dia, não fazer esta ponte. Numa altura em que se valorizam as contas certas, em que queremos vida além do défice e oxigénio além do que a inflação nos estrangula, temos de ter em mente aquilo pelo qual aqui andamos e de valorizar (seja através de que “indicador” for) aquilo que gostamos.
Recentemente, numa entrevista ao PÚBLICO, o ministro dizia-nos, a propósito do potencial estado de graça que este Governo poderia ter gozado ou não e daquilo que se vai passando nos programas de comentário político, que tão bem ele conhece, esclarece o que temos insistido em esquecer ou fazer de esquecidos por conveniência ou preguiça intelectual, é que o Governo não se pode concentrar nem viver a angústia dos últimos 10 minutos — que naquele mesmo livro do polaco ele dizia que vivemos na ansiedade do instantâneo — mas sim pensar, planear, executar e monitorizar políticas públicas. Naturalmente que são necessárias ações para os problemas que vão surgindo, mas temos de esperar dos políticos e, sobretudo, dos decisores, que pensem futuro.
Há muito que não tínhamos um ministro da Cultura com esta exposição mediática que, há até quem o aponte sucessor de Costa ou um delfim do mesmo, verdade seja dita, há muito que esperávamos por um ministro da Cultura que colocasse ao serviço da desta área 2% do valor de despesa do Estado. Se foi uma condição para aceitar o cargo ou não, se são verbas que vêm do PRR ou diretamente de receitas próprias do Estado ou não, não interessa. O que interessa é que o valor está orçamentado e interessa, isso sim, acompanhar a execução desse mesmo valor.
Cá estaremos, com muita vontade de acompanhar este promissor trabalho.
Crónica de Pedro Perdigão.
Mestre em Políticas Públicas. Com interesse pela educação e ensino superior, desigualdades sociais (acabar com elas ou pelo menos reduzi-las), emancipação jovem, cultura e ambiente e sustentabilidade. Nortenho e cidadão do mundo.