As Escolhas dos Artistas
A equipa da vossa Comunidade Cultura e Arte dedicou este ano de 2017 a uma cobertura extensiva do que melhor se fez na música, tanto cá dentro como lá fora. Com mais de 150 críticas a álbuns, e reportagens de variadíssimos concertos e festivais, este foi um ano recheado de música na CCA. Nesta altura de final de ano, consideramos importante fazer um balanço daquilo que mais nos marcou ao longo de 2017; tanto por nós como por aqueles que nos lêem e contribuem para o nosso crescimento. Para este artigo, conversámos com alguns dos artistas que admiramos, para descobrir qual foi a música que mais os marcou ao longo de 2017.
Benjamim:
É-me sempre difícil fazer balanços de final do ano devido aos meus hábitos de consumo de música, que se atrasam em discos que normalmente já vêm de outros anos (ou décadas). Gosto de me demorar nas coisas que realmente valem a pena e não na banda incapaz de deixar sementes para o futuro, o tempo não estica e às vezes há que optar. O meu trabalho também envolve estar quase sempre a ouvir música (minha e de outros); é normal que o meu ano seja marcado por música que ainda não saiu e felizmente trabalhei em discos de artistas cuja música me deixa extremamente entusiasmado. Digo sem qualquer pudor que esses foram os discos que marcaram o meu ano, para minha grande sorte.
Na música portuguesa perdemos o enorme Zé Pedro. Nos discos destaco o Luís Severo, que tem um belo sucessor do Cara d’Anjo, Favourite Ghost de Tomara (grande surpresa do ano), Éme, Frankie Chavez (com quem tive a honra de tocar), Pega Monstro, Moullinex, mas ainda me falta pegar com calma no disco dos Ermo, no da Surma e Slow J.
Claro que não posso deixar de assinalar a edição que marca o regresso de uma das minhas bandas preferidas, os LCD Soundsystem, ou o novo dos Arcade Fire. Posso dizer mal do novo do Beck, a desilusão da década. Ainda não consegui pegar no sucessor do Lost in the Dream dos War On Drugs (provavelmente o meu álbum preferido de 2014) nem no disco dos Wolf Parade (nem em tantos milhares que quero ouvir!).
dB (Conjunto Corona):
A música portuguesa a ser mais portuguesa que nunca. Um grupo de jovens suburbanos de Gondomar a divertirem-se e a deixar o seu talento fluir sem grandes preocupações de conteúdo. Vê-los ao vivo é a verdadeira confirmação do seu enorme talento e espontaneidade, e este Linhas de Baixo é um dos melhores álbuns feitos em Portugal em 2017. É caso para dizer GUTE… GONDOMAR, GONDOMAR, GONDOMAR.
PZ – Império Auto-Mano
Um pouco suspeito da minha parte, mas realmente este é o meu disco favorito de sempre do artista Paulo Zé. “Dou-te com um taser / no blazer / Atiro-te uma pizza / à camisa”, “Tenho fome de lulas”, “Conheci uma gaja num bosque / que já tinha visto num quiosque”, “Estás descontraído / a ver Júlio Isidro / na RTP Memória / mas queres ainda mais” e citações afins; o próprio nome Império Auto-Mano: é mais do que música, é um modo de vida. PZ é o Larry David da música portuguesa, não há ninguém com mais capacidade do que ele para a nobre arte de dizer palavras e este álbum acompanha a genialidade do seu pensamento com alguns dos instrumentais (e vídeos) mais maravilhosos por ele criados.
Ermo – Lo-Fi Moda
Um daqueles discos que primeiro se estranha e depois é impossível não se entranhar. Um potencial enorme reside nesta banda de Braga e no seu neo-future-retro-pop com sabor bem português. Composições instrumentais com gigabytes de deliciosos detalhes digitais a fazer a cama a melodias com sabor a Antonio Variações séc. XXI? Não me admira se daqui a uns anos estiver a lembrar-me destas palavras enquanto assisto a um concerto de Ermo em Londres ou Berlim.
Ângela Polícia – Pruridades
Soulman/rockstar nos Bed Legs, cantor romântico-gótico no projecto Amante Negro, drill rapper e outras variações que tais no seu Pruridades, Ângela Polícia (ou Fernando Fernandes) é um camaleão artístico e não me surpreenderia se em 2018 lançasse, por exemplo, um álbum de canto gregoriano: tenho a certeza que o iriafazer na perfeição e juntar meia dúzia de arcebispos ao seu crescente clube de admiradores.
Éme
Antes de avançar, agradeço à Comunidade Cultura e Arte o convite. Eu não costumo agrupar os meus anos em listas, sobretudo em relação a coisas culturais que consumi, até porque nunca sei quando saíram as coisas de que gostei num determinado ano. Vou fazê-lo, mas antes aproveito este texto para agradecer a todas as listas que mencionaram o disco deste ano: Domingo à Tarde. É um orgulho estar no top do Público, Time Out, Expresso, Nuno Galopim, o “melancómico” Nuno Costa Santos entre outros; obrigado pelo apoio!
Este ano, como é óbvio, o meu album favorito (e para mim album do ano) é o Casa de Cima das Pega Monstro, um álbum que me enche de orgulho e foi definitivamente o álbum que mais ouvi dos que saíram este ano, tal como me orgulha o Orgulho de Ex-buds das Putas Bêbadas. Gostei e ouvi muito o do Severo, Luís Severo, também gostei do dos Ermo, Lo-fi Moda, mas ainda não ouvi tanto. Americanos foi Mount Eerie – mas não ouvi assim muito – Sufjan Stevens e Magnetic Fields.
Foi mais ou menos isto, obrigado pelo tempo de antena.
Ermo
2017 foi um ano de descobertas para nós. Os primeiros destaques seriam as sonoridades da editora DoHits, nomeadamente o Homeless do Howie Lee e o EP About Time da Meuko! Meuko. A onda digital foi algo muito presente na maior parte dos discos que nos chamaram a atenção este ano: recomendamos o Cool 3D World, com produção de Brian Tessler e Jon Baken, e os novos trabalhos de Machine Girl e Jade Statues. A descoberta de Wacław Zimpel trouxe-nos aos ouvidos um excelente disco deste ano e vários de anos anteriores, que temos rodado na sala de ensaio desde então. Continuámos, claro, à procura do que de melhor se fez no passado, e em 2017 passámos muito tempo com James Ferraro, Steve Reich e Pauline Anna Strom. Estamos sempre atentos à música portuguesa, e este ano gostámos muito dos discos do Luís Severo, Lavoisier, Putas Bêbadas e Nídia.
Filipe Sambado:
Os melhores discos deste ano provavelmente só os ouvirei daqui a uns anos. Isto é uma lista com algumas coisas importantes do meu ano:
Charli XCX – Pop 2
The Very Best of R. Stevie Moore
Éme – Domingo à Tarde
Deep Space – Model 500
James Ferraro – Night Dolls with Hairspray
Nelson Gonçalves – Naquela Mesa
Cartola – Preciso me Encontrar
Ariel Pink – Bubblegum Dreams
Quero deixar duas menções com menos destaque por serem amigos tão chegados. Mas isso é o problema de ter amigos destes… São dois homónimos, de Luís Severo e Primeira Dama.
Lena D’Água
Devo dizer que ouço pouca música em casa, mas acordo com a Antena 3 no rádio de pilhas que tenho na mesa de cabeceira; e também no carro é a minha sintonia preferida. Começo por referir o disco do Carlão. Viver p’ra sempre!! Que banho de energia boa!! A minha Sara Tavares com a sua ginga, que coisa bonita! A “Planície” do Luís Severo, que me leva até lugares de que tinha saudades… a “Rua das Flores” da Primeira Dama, que me comoveu tanto naquele final perto de mim, de que eu não tinha sido avisada! Obrigada, Manel! A querida Ana Bacalhau em seu nome próprio, go go girl! A aventura a dois do Benjamim e do Barnaby Keen, 1986, o ano do meu “Dou-te um Doce”!
Foi no meu velho auto-rádio que ouvi a voz do Luís Nunes pela primeira vez e o fui descobrir, e foi no meu novo auto-rádio que ouvi a voz daquele que está a ser para mim o grande estaladão do ano: Slow J, esse ser antigo em corpo de menino. Que voz, que palavras, que som, que produção! Tão bom. Deixo-vos em loop com o tema “Water”, do Richie Campbell, com a participação do J.
Feliz 18 para todos nós! Lena.
Luís Severo:
Estes são os 10 discos que ouvi e gostei em 2017. Confesso que não ouvi nem um terço dos álbuns que vejo nas listas que por aí andam, por isso perdoem-me alguma grande falha. Vou meter por ordem alfabética porque acho que isso das ordens de preferência é uma grandessíssima lolada.
Alförjs – Demons I
Ariel Pink – Dedicated to Bobby Jameson
Camané – Camané Canta Marceneiro
Éme – Domingo à Tarde
Ermo – Lo-Fi Moda
Fleet Foxes – Crack-Up
Magnetic Fields – 50 Songs Memoir
Pega Monstro – Casa de Cima
Primeira Dama – Primeira Dama
Putas Bêbadas – Orgulho de Ex-Buds
Primeira Dama:
Veenho – Veenho + Veeenho
Trago os dois EP’s juntos, fazem um disco… A força de estar vivo assim, dada de barato… A felicidade nas coisas simples e os amigos, mesmo quando estar bem parece impossível…
Putas Bêbadas – Orgulho de Ex-buds
Sabedoria numa chapada seca. Na “pareh sem fim” a esperança, nem sempre grande, de um futuro mais risonho, é fodido…
Pega Monstro – Casa de Cima
Continuo a não saber muito bem como descrever a música da Júlia e da Maria… Sublime parece um bocado ‘chartel’ mas é o melhor que consigo dizer, ainda que não seja suficiente… Comove-me sempre, faz-me feliz… Ainda que tenha muito rock sinto que podia sussurrar muitas das músicas deste disco, o das canções, aos ouvidos de alguém que me faça feliz…
Éme – Domingo à Tarde
Amigo, se estás triste ouve este Domingo à Tarde… Estas canções, as melhores que o meu amigo Éme fez, acompanharam-me desde a primeira Noite Xita (num concerto não planeado), ainda antes do disco sair, em concertos, e depois também… Serviram para cantar de alegria, que a “Lei é do cu e Liberdade é do coração”, para lembrar que a vida é dura mas que devemos seguir em frente e para lembrar o toque da pessoa que amamos…
Lucía Vives – Príncipe Real
Bem sei que é um EP de apenas três canções, mas tem a força de uma poesia que poderia e irá encher muitas mais… é um céu azul e infinito que desbrava, sem alaridos, a magia que é estarmos uns ao lado dos outros, de nos termos uns aos outros… Não consigo imaginar a minha vida sem a Lucía, as suas canções, os seus mimos e amor incondicional…
Duquesa – Norte Litoral
Um imaginário que, apesar da distância física, me é muito querido, assim como a pessoa que o escreve… Serviu para aliviar o peso de uma cidade de Lisboa cada vez mais sufocante. Uma fuga bilíngue sem sair de casa e linhas de baixo verdadeiramente contagiantes… Great adviser!
Mac DeMarco – This Old Dog
A afirmação final do rei da canção americana… Quando parecia impossível ficar melhor, eis que o Mac faz uma limpeza… O “molho” diminui mas as canções crescem como nunca, com a nostalgia como fundo… O tio Mac a repetir os exemplos (im)perfeitos de como amar alguém… mas desta vez já é mais crescido e, por isso, lembra-nos o quão importante é não nos esquecermos uns dos outros mesmo com o tempo a passar depressa e com a vida em constante mudança… A família e os amigos são a base do amor que não desaparece…
Homeshake – Fresh Air
Groove fresco e libertador… Quando estiverem verdadeiramente tristes mas não quiserem entrar numa onda de “ter dó de mim” é aqui que podem encontrar conforto… Eu prometo! Não há cá alarmismos pop… Aqui prefere-se uma sexiness para subir a auto-estima… ou o ego.
Eyedress – Manila Ice
O príncipe do Pacífico vem confirmar o que já era óbvio pelos singles que foram saindo nos últimos dois anos… está à vista um futuro lindo pelas mãos deste filipino. Esta magia pop-pesada, com ataques de post-punk e shoegaze, faz-nos acreditar no amor louco e à primeira vista, uma trip em que tudo, ao nosso toque, se transforma em êxtase sussurrado mas nem por isso mesmo intenso…
SZA – CTRL
Uma surpresa maravilhosa… Uma nova estrela pop que, na minha opinião, é talvez a primeira em muito tempo que possa chegar ao nível de uma Beyoncé ou de uma Ariana Grande… Ganha pelo registo mais elaborado em canções muito bem produzidas, pop sexy e de imagens forte, com uma boa escola do hip-hop… Assustador pensar num futuro que já sabemos que conta com uma produção de Mark Ronson e Kevin Parker!
Não tem uma ordem específica. Não escolhi discos nos quais tenha estado envolvido diretamente.
Rodrigo Vaiapraia (Vaiapraia e as Rainhas do Baile):
Os meus discos do ano são sempre os que me fazem mais companhia, em rotação constante e obsessiva. Este ano, não me lembro de ter ouvido mais nenhum tanto quanto o A Place I’ll Aways Go de Palehound. Quer dizer, tenho sempre o Exile In Guyville à mão, mas esse saiu em 1993. Definitivamente, vive-se um período bom na música porque ouvi mais coisas deste ano que me surpreenderam e animaram. Recomendo muito Premature Love Songs (Michelle Blades), Powerplant (Girlpool), Casa de Cima (Pega Monstro), Young Brothers (The Younger Lovers), Luís Severo (Luís Severo), Linhas de Baixo (800 Gondomar) e Cost of Living (Downtown Boys).
Comecei a ouvir Palehound com atenção mais de um ano depois do primeiro álbum dela ter saído e fiquei muito receptivo à espera deste segundo. É um disco de investidas poéticas embaladas com o talento na guitarra dessa mesma poetisa de Boston, Ellen Kempner (escute-se a simplicidade de “Turning 21” ou a electricidade do hit “Flowing Over”). Há um sentimento doentio que me contagia da primeira à última música. Os temas vão desde o medo/desejo de paixão e proximidade (“Room” ou “Backseat”) à morte de alguém próximo (“If You Met Her”) até esboços de um optimismo escuro como “Feeling Fruit” ou “At Night I’m Alright With You”. A Place I’ll Aways Go, literalmente um álbum onde me tem sempre apetecido regressar.
Surma:
Escolhi o Lo-Fi Moda dos Ermo como um dos melhores álbuns nacionais porque está com uma produção incrivelmente bem feita e com a estética de outro mundo! Já vi Ermo imensas vezes ao vivo e sou suspeita e uma fã nata destes rapazes! Acho que foi um dos melhores álbuns nacionais, sem sombra de dúvida!
Calendário do melhor de 2017 na música:
- 26/12: Concertos do Ano
- 27/12: Canções do Ano
- 28/12: Álbuns Portugueses do Ano
- 29/12: Álbuns do Ano
- 30/12: A Escolha dos Artistas
- 31/12: A Escolha da Comunidade