Filha de Orson Welles pede à Netflix para estrear ‘The Other Side of the Wind’ no Festival de Cannes
A guerra entre o Festival de Cannes e a Netflix parece ter agora uma nova protagonista de peso: Beatrice Welles, filha do aclamado cineasta Orson Welles e da actriz italiana Paola Mori.
“O festival escolheu celebrar a distribuição em vez de celebrar a arte cinematográfica. Estamos comprometidos a 100% com a arte cinematográfica. Aliás, todos os outros festivais de cinema do mundo também estão”, disse o director de conteúdos da Netflix Ted Sarandos ao IndieWire.
Agora, e segundo a Vanity Fair, Beatrice Welles enviou um email a Sarandos onde se pode perceber claramente que a a filha do realizador está insatisfeita com os contornos da decisão: “Fui testemunha de como as grandes companhias de produção destruíram a vida dele, o seu trabalho, e dessa forma um pouco do homem que tanto amava. Odiaria que a Netflix fosse outra dessas companhias”, disse Beatrice e acrescentou ainda: “Fiquei muito perturbada e inquieta ao ler nos jornais da indústria sobre o conflito com o Festival de Cannes. Tenho de defender o meu pai. Fui testemunha de como as grandes companhias de produção destruíram a vida dele, o seu trabalho, e dessa forma um pouco do homem que tanto amava. Odiaria que a Netflix fosse outra dessas companhias.”
Orson Welles começou a realizar ‘The Other Side of the Wind’ nos anos 70, a obra foi escrita a duas mãos: pelo próprio Welles e pela sua companheira croata Oja Kodar. O filme era um falso documentário que retratava um lendário cineasta que decidiu regressar a Hollywood para realizar a sua suposta obra-prima, isto depois de se ter exilado na Europa. No entanto, Welles acabou por nunca concluir o filme.
Agora, a Netflix e o realizador Peter Bogdanovich, que era amigo pessoal de Welles, e que também entrava no filme, decidiram recuperar e restaurar ‘The Other Side of the Wind’. No entanto, a guerra entre o Festival de Cannes e a Netflix agravou-se este ano e a gigante de streaming norte-americana acabou por retirar todos os filmes que tinha planeado estrear no festival francês. A decisão foi tomada após declarações do delegado-geral de Cannes, Thierry Frémaux, e das novas regras que vão ser implementadas: para um filme entrar em competição tem de ser exibido nas salas de cinema.
“No ano passado achei que poderia convencer a Netflix, mas eles recusaram-se [a exibir os filmes nos cinemas]. É o modelo económico deles e eu respeito, mas o nosso foco é cinema e queremos que os filmes que estão em competição sejam lançados. Este é o modelo dos apaixonados por filmes e a Netflix deve respeitar. (…) no ano passado, em França, os filmes de Noah Baumbach [“The Meyerowitz Stories”] e Bong Joon-ho [“Okja”] lamentavelmente não existiram. Perderam-se nos algoritmos da Netflix. […] Eventualmente vamos entender que a história do cinema e a história da internet não são a mesma coisa.“, disse Thierry Frémaux à Variety e acrescentou ainda de forma positiva: “Dito isto, a Netflix é bem-vinda em Cannes fora da competição oficial e da Un certain regard. Encontrámos-nos recentemente em Paris, o diálogo continua e tenho certeza que será produtivo. Eles querem muito voltar e nós também queremos que eles voltem.”
Ted Sarandos achou que as novas regras eram um ataque directo aos filmes produzidos pela empresa e então foi decidido retirar ‘The Other Side of the Wind’ de Cannes. Mas para além do filme de Welles, há mais 4 filmes que sofreram com esta decisão: “Roma”, de Alfonso Cuarón, “Hold the Dark”, de Jeremy Saulnier, “Norway”, de Paul Greengrass e o documentário de Morgan “Neville They’ll Love Me When I’m Dead” (sobre Welles) também foram retirados do Festival de Cannes.
Por fim, Filip Jan Rymsza, produtor de “The Other Side of the Wind” também já manifestou o seu relativamente a esta guerra entre Cannes e a Netflix: “O que é triste e mais difícil de aceitar é que toda a gente perde nesta decisão – Cannes, a Netflix, os cinéfilos e todos nós que trabalharam neste esforço histórico”. Mas também relembrou que “não haveria The Other Side of the Wind sem a Netflix”