A 12.ª edição do Motelx não foi das melhores mas nem tudo foi mau
O último dia da 12.ª Edição do Motelx foi porventura o mais fraco no que diz respeito à oferta que a programação deste ano apresentou, com uma escolha para filme de encerramento que foi um completo tiro ao lado face ao que é esperado pelos fãs do festival. Embora “Elizabeth Harvest” seja um filme criativo imageticamente interessante, não é o filme de terror crowd pleaser que tem sido exibido como encerramento ao longo dos anos. A prova é que pela primeira vez em muitos anos, e talvez desde sempre, a sessão de encerramento do Motelx não esgotou, e enquanto balanço final poder-se-á dizer que, no que a entusiasmo do público diz respeito, esta edição ficou aquém das expectativas. O São Jorge não esteve tão movimentado como em anos anteriores, talvez devido à ausência de novidades, convidados de peso e à perda da sala do Tivoli, do outro lado da Av. da Liberdade que tinha por hábito estar inserida na programação.
Outro factor foi o facto da sessão de abertura com o aguardado “The Nun” ter sido limitada a convites e passatempos, o que enfureceu uma boa franja de espectadores fiéis ao Motelx. Por outro lado, as escolhas exibidas este ano apresentaram uma qualidade em média superior face a anos anteriores. Apesar de não se ter visto nenhuma obra-prima (“Hagazussa” foi o único filme digno de 4 estrelas que vimos), também não se pode dizer que tenha passado por esta edição do festival algum filme verdadeiramente medíocre. Houve ofertas muito sólidas como “Piercing”, “Mandy”, “Gonjiam” ou “Upgrade”, entre outras belas ofertas. Na sessão de encerramento, antes da exibição de “Elizabeth Harvest”, “Hagazussa: Heaten’s Curse”, de Lukas Feigelfeld, foi designado vencedor do concurso para melhor longa metragem de terror europeia. A “Estranha Casa na Bruma”, de Guilherme Daniel, foi a melhor curta de terror portuguesa a concurso. Já o novo prémio do público foi atribuído à meta comédia de horror “One Cut of the Dead”, filme do japonês Shin’ichirô Ueda. No último dia vimos ainda o agradável “Brother’s Nest” e “Exorcism of Mary Lamb”, um dos piores filmes nesta edição do Motelx.
“Elizabeth Harvest”
A sessão de encerramento da 12.ª Edição do Motelx exibiu “Elizabeth Harvest”, um thriller com apontamentos sci-fi e de horror aprimorado esteticamente e original em termos de estrutura narrativa, mas que acaba por se confundir a si mesmo à medida que vai acrescentando camadas à sua já por si complexa estrutura. Elizabeth, protagonizada pela bela Abbey Lee, é recém casada com um brilhante cientista milionário que tem algo a esconder.
O filme rapidamente explica ao espectador que este não será um thriller convencional e muito menos um filme de terror, mas antes mais uma daquelas auto apelidadas experiências sensoriais e contemplativas que a nova corrente colorida neo-noir nos tem trazido, com alguma filosofia, romance e bio-ética à mistura. Não é que não seja interessante e até inteligentemente construído durante algum tempo, mas a rigidez com que o é, limitando os seus actores a meros executores de tarefas, e enamorando-se com a pretensa inteligência do seu argumento, esgota qualquer entusiasmo que um filme rodeado de mistério deveria ter. Ao procurar discutir diversas temáticas por alguém rotuladas como delicadas, desde a bio-ética ao amor proibido, passando passando pela libertação feminista, o realizador Sebastian Gutierrez parece perder-se em tantas mensagens. O que sobre é um cocktail vistoso que sabe bem, mas que vendo a receita não passa de água com açúcar.“Brother’s Nest”
Vindo da Austrália, “Brother’s Nest” é um original thriller familiar que coloca dois irmãos não propriamente jovens em preparativos para assassinar o seu padrasto por causa da herança. O filme tem uma bela premissa de drama familiar, bem misturado com uma pitada de humor negro saboroso, mas o seu unidimensionalismo impede-o de fazer algo mais que discutir com algum jeito, mas muito arrastamento, uma interessante temática moral.
O filme constrói-se com um entretenimento de belo efeito para deitar tudo a perder no seu último terço, com uma conclusão no mínimo deslocada perante o argumento que nos foi apresentado até então e um deitar para o lixo de uma complexa construção psicológica de personagens que afinal não eram mais que fachada, vendo-se ambas reduzidas a um estereótipo de bem contra mal no final. “Brother’s Nest” acaba por ser, com muita pena, um exercício fílmico inútil.
“Exorcism of Mary Lamb”
Desengane-se aquele que pensar que “Exorcism of Mary Lamb” tem algo que ver com aquilo que o seu título propõe. O filme do japonês Yasumasa Konno não é um filme de terror. Não existe nenhuma personagem chamada Mary Lamb, e tão pouco existe qualquer exorcismo. Este é, na verdade, um thriller policial psicológico cheio de vaidades artísticas inúteis e um argumento pobre, confuso e com mais buracos que a bola de futebol que usávamos em todos os intervalos da escola.
Este “Exorcism of Mary Lamb” (nome aleatório, podia chamar-se batatas com feijão verde), quer ser “Insomnia”, “Se7en”, “Shutter Island”, tudo ao mesmo tempo, num filme que se arrasta até à exaustão sem qualquer linha narrativa minimamente lógica e com um twist final risível que nem sequer é possível perante as leis do próprio filme. Este amadorismo argumentativo, ou inabilidade de o transpor para a tela, procura refugiar-se numa realização observadora e atenta às técnicas utilizadas em filmes do género mais recentes no Japão e na Coreia do Sul, mas é um exercício de esforço inglório, que ainda assim o salva do zero absoluto.