A nova explosão musical dos Linda Martini
Falar de Linda Martini é abordar um dos maiores fenómenos da música portuguesa nos últimos quinze anos. E, para além da identidade inicial da banda ainda se manter, a qualidade também tem vindo a ser aprimorada. Há poucos casos como o dos Linda Martini no nosso panorama musical; discografias de tanto sucesso e com músicas de subgéneros musicais de nicho. A justificação não se prende apenas à notável qualidade de cada um dos membros do colectivo – Cláudia Guerreiro, Pedro Geraldes, Hélio Morais e André Henriques são dos melhores músicos nacionais que por aí andam desde há muitos anos. Mas este estrondoso sucesso nacional reflecte ainda o elevado sentido de coesão que a banda transmite a quem a ouve, os conhecimento de composição e a inteligência musical para criar aquilo que se aproxima de um novo género musical, e que talvez só mais tarde possamos absorver na totalidade. Esta combinação de elementos do post-punk, mathrock e post-rock – misturada com elementos tão portugueses, como por exemplo a forma como André Henriques canta, por vezes roçando o fado – cria uma identidade única.
Se no passado chegaram a ser comparados a Ornatos Violeta, hoje em dia não faz sentido conotar as duas bandas. Não há projecto como os Linda Martini, nem em Portugal nem provavelmente em lado nenhum do mundo. Esta originalidade constitui simultaneamente uma vitória para a banda – conseguida à custa de tantos anos de trabalho – e uma prenda para o seu público. Quantas bandas, ao longo da sua carreira (iniciada em 2003), conseguem inovar álbum após álbum, sem destruírem a sua própria identidade?
2018 traz-nos agora o novo álbum da banda, homónimo. Pesado, duro e arriscado, Linda Martini reflecte as melhores capacidades da banda: composição, talento musical e capacidade de arriscar. Apesar do crescimento a nível nacional, os Linda Martini mantém a mesma identidade, algo que pode ser testemunhado da primeira à última faixa.
Um dos maiores desafios de uma banda que ao vivo é agressiva e energética é conseguir transmitir esse mesmo sentimento num álbum gravado em estúdio. Os Linda Martini têm-no feito quase desde o início. Este novo álbum é a confirmação dessa antiga certeza. É admirável a forma como André brinca com as palavras e compõe os trocadilhos de cada uma das estrofes das canções. A sua voz, natural e cheia de vivacidade, remete-nos para um qualquer fado fugidio e selvagem, característica importante na caracterização do som do projecto.
Os singles “Gravidade” e “Boca de Sal” constituem excelentes exemplos dessa sonoridade, na certeza de estarem a tocar aquilo que querem, para si próprios e para os fãs que os acompanham de Norte a Sul do país; mesmo em caves, ou salas minúsculas com qualidade de som duvidosa, assumindo a sua vocação underground que se tornou fenómeno. E este álbum grita isso mesmo: estão cá para tocar o que gostam.
“Semi Tédio dos Prazeres” e “Amares Volta” – dois trocadilhos, um bastante lisboeta, e o outro referência à banda The Mars Volta – são duas das melhores canções deste disco. Se por um lado sentimos Hélio a destruir a bateria (num bom sentido, claro), por outro temos o baixo sempre intenso de Cláudia Guerreiro, a elevar-nos à agressividade tão natural da banda, algo que Pedro Geraldes consegue controlar e assegurar com a sua guitarra. No seu conjunto, o álbum não é só uma viagem, mas também uma colectânea de memoráveis singles. Qualquer das músicas poderia vir a ser exibida com um belo videoclip, como montra de apresentação do álbum.
Não há dúvida que estamos a viver uma das mais estimulantes décadas da música portuguesa. Nomes como Dead Combo, The Legendary Tigerman, Orelha Negra e Mão Morta irão figurar na história da moldura musical de Portugal. Mas os Linda Martini estão a conseguir outra coisa: elevar os estilos musicais que sempre foram de nichos a um patamar universal, cruzando a música tipicamente portuguesa com o que de melhor se faz por esse mundo fora, criando uma nova identidade musical, provavelmente sem equiparação até aos dias de hoje.