A participação de Portugal nas eleições para o Parlamento Europeu
A adesão de Portugal à então CEE
Depois do 25 de Abril de 1974 e de uma ditadura que tinha como lema o “orgulhosamente sós”, abriu-se um nova etapa para Portugal que teria o desafio de apanhar o comboio do progresso, do desenvolvimento económico e das suas infraestruturas. Portugal teria de se abrir ao mundo mas, como a socióloga Alice Cunha relembrou na entrevista à CCA publicada no dia 10 de Maio deste ano: “Na realidade, logo após o final da Segunda Guerra Mundial, iniciou-se um movimento de cooperação económica europeia, nomeadamente com a aplicação do Plano Marshall, que conduziu à criação da Organização Europeia de Cooperação Económica, da qual Portugal foi membro fundador. Podemos traçar até 1948 a inserção do Estado português nos movimentos que se estavam a iniciar, então, de cooperação económica a nível europeu, movimentos esses que, depois, se foram desenvolvendo e que conduziram, nomeadamente, a que Portugal aderisse à EFTA [European Free Trade Association] em 1960, mas também a que se aproximasse, por razões exclusivamente económicas à data, à Comunidade Económica Europeia [CEE] e assinasse, em 1972, um acordo comercial que serviria de base, aliás, para as futuras negociações de adesão”, lembrou a investigadora à CCA.
A vigência de um sistema democrático seria uma condição instransponível para Portugal fazer parte da então CEE. Ao todo, foram oito anos de negociações que culminaram, dessa forma, com a assinatura do Tratado de Adesão, em 12 de junho 1985, pelo então primeiro-ministro Mário Soares, e com a entrada oficial do país enquanto membro, no dia 1 de Janeiro de 1986: na ocasião, ainda era Ramalho Eanes que assumia as funções da presidência da República. Doravante, Portugal passaria a estar integrado no Parlamento Europeu (PE) e, tal, trouxe como direito cívico a participação dos cidadãos portugueses nas eleições europeias que decidem a sua composição.
O que é e como funciona o Parlamento Europeu?
O PE trata-se do órgão legislativo da União Europeia (UE). Como explica o sítio web oficial da UE, instituiu-se em 1952 como Assembleia Comum da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço que acabou por evoluir, em 1962, para Parlamento Europeu, tendo as suas primeiras eleições diretas em 1979.
Segundo o que está exposto no sítio online da UE, o PE tem três tipos principais de poderes: o poder legislativo, de supervisão e orçamental. O poder legislativo abarca “a adoção da legislação, juntamente com o Conselho da UE, com base em propostas da Comissão Europeia.” Decide sobre os acordos internacionais, sobre os alargamentos e analisa, igualmente, “o programa de trabalho da Comissão e convida-a a propor legislação”. Já os poderes de supervisão permitem ao PE “exercer o controlo democrático de todas as instituições da UE; eleger o presidente da Comissão e aprovar a Comissão no seu todo; a possibilidade de votar uma moção de censura, obrigando a Comissão a demitir-se;
conceder quitação, isto é, aprovar a forma como o orçamento da UE é gasto; examinar as petições dos cidadãos e abrir inquéritos; debater a política monetária com o Banco Central Europeu; interrogar a Comissão e o Conselho e realizar observações eleitorais.” Por último, os poderes orçamentais concedem ao PE o poder de “definir o orçamento da UE, juntamente com o Conselho, e aprovar o quadro financeiro plurianual da UE.” De relembrar que as instituições da UE, como a Comissão Europeia, respondem perante o Parlamento Europeu.
O PE funciona através de comissões parlamentares e sessões plenárias. As comissões parlamentares servem para a preparação da legislação. Segundo o que está no sítio web oficial da UE: “O Parlamento conta com 20 comissões e três subcomissões, todas responsáveis por um domínio político específico. As comissões examinam propostas legislativas e os deputados ao Parlamento Europeu e os grupos políticos podem apresentar alterações ou propor a rejeição de uma proposta de lei. Estas questões são igualmente debatidas no âmbito dos grupos políticos.” Quanto às sessões plenárias, servem para a “aprovação da legislação. É na sessão plenária que todos os deputados se reúnem no hemiciclo para proceder à votação final do projeto de legislação e das alterações propostas. Normalmente, estas sessões têm lugar em Estrasburgo, durante quatro dias por mês, mas, por vezes, são realizadas sessões adicionais em Bruxelas”, tal como se encontra no sítio oficial da UE.
Actualmente o PE conta com 705 deputados mas, a partir das eleições europeias que se avizinham, dia 9 de Junho, esse número irá aumentar para 720, ou seja, existirão mais 15 membros. Os deputados são eleitos de forma directa pelos cidadãos dos Estados membros da UE, de momento 27 países e, posteriormente, estes integram-se na sua respectiva família, grupo político a nível europeu. Actualmente existem sete grupos/famílias políticas: O Partido Popular Europeu (PPE), do qual faz parte o PSD e o CDS-PP portugueses; a Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas (S&D), a família europeia do PS português; o grupo Renovar Europa, ao qual pertencerão os deputados da Iniciativa Liberal (IL) caso elejam; o grupo dos Verdes/Aliança Livre Europeia, aos quais se juntarão os deputados do Livre e Pan, caso elejam; o grupo dos Conservadores e Reformistas (ECR); o grupo da Identidade e Democracia (ID), grupo no qual o Chega formalizou a sua integração; e a Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde (GUE/NGL), grupo a que pertencem o BE e o PCP. O número e a formação destes grupos podem sofrer alterações ao longo do tempo. Para tal podem contribuir possíveis alianças ou coligações entre estas famílias europeias ou partidos, assim como o surgimento de novas tendências partidárias no espaço da União Europeia.
A participação portuguesa nas Eleições para o Parlamento Europeu:
Até ao momento, Portugal participou em oito eleições europeias, sendo o sufrágio de Junho de 2024 a nona participação de Portugal para a composição do PE. Como indicado neste artigo, foi em Janeiro de 1986 que, formalmente, o país passou a membro da então CEE, agora UE, começando a eleger, pela primeira vez, eurodeputados em 1987, ou seja, logo no ano seguinte ao da adesão. A particularidade das primeiras eleições europeias, a 19 de Julho de 1987, foi o facto de terem sido conjuntas, ou seja, ao mesmo tempo das eleições legislativas. No mesmo ano em que Aníbal Cavaco Silva conseguiu a sua primeira maioria absoluta na assembleia portuguesa, Portugal elegeu 24 deputados europeus, o número de eurodeputados a eleger que coube, então, ao país. Ao todo concorrem 12 partidos – o PSD, o PS, o CDS, a CDU, o PRD, o PPM, a UDP, o PDC, o PSR, o MDP, o PCR e o PCTP – e, destes 12, só cinco conseguiram eleger deputados. O PSD, tendo Pedro Santana Lopes como o primeiro na lista, ganhou as eleições com 37,45 %, conseguindo eleger dez eurodeputados. O PS, tendo à cabeça Maria de Lourdes Pintasilgo, conseguiu 22,48% dos votos, almejando um total de seis eurodeputados. O CSD, com Francisco Lucas Pires como cabeça de lista elegeu quatro; a CDU, com Carlos Aboim Inglez, três e, por fim, o PRD (Partido Renovador Democrático), conseguiu a eleição do seu cabeça lista, José Medeiros Ferreira. Os primeiros deputados eleitos por Portugal iriam integrar as suas filiações europeias sendo estas, respectivamente, a Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa (PSD); o Partido Socialista Europeu (PS); o PPE (CDS); Comunistas e Aliados (CDU) e a Aliança Democrática Europeia (PRD). De destacar que, no país, estas eleições tiverem um alto nível de participação do eleitorado, 72,42%, apenas com uma abstenção de 27,42%.
As eleições seguintes para o Parlamento Europeu dar-se-iam em 1989. O mesmo número de deputados a eleger por Portugal manteve-se, 24, mas estas foram as primeiras eleições europeias independentes, ou seja, sem serem ao mesmo tempo de um outro qualquer tipo de sufrágio. Elegeram deputados o PSD (9), ficando à frente; o PS (8), tendo eleito nas suas listas um deputado do PRD; a CDU (4), com o primeiro deputado do PEV eleito; e o CDS com três deputados eleitos. Como cabeças de lista apresentaram-se, respectivamente, António Capucho (PSD), João Cravinho (PS), Carlos Carvalhas (CDU), e Francisco Lucas Pires (CDS). Ingressaram, consequentemente, nas famílias políticas Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa (PSD), Partido Socialista Europeu (PS), Coligação de Esquerda (CDU), e Partido Popular Europeu (CDS). Estas eleições não foram tão participativas pelo eleitorado, mesmo assim conseguindo a aderência de 51,10% dos eleitores, sendo a abstenção de 48,9%.
Os altos níveis de abstenção e a participação baixa do eleitorado nas restantes eleições europeias, que teriam lugar em 1994, 1999, 2004, 2009, 2014 e 2019, seriam a grande sombra deste acto eleitoral. A participação do eleitorado oscilaria sempre dentro da casa dos 30%, tendo atingindo mínimos históricos em 2019, ou seja, nas últimas eleições para o Parlamento Europeu, com apenas 31 % de mobilização dos eleitores, o que se traduziu numa abstenção de 69% no total.
No cômputo geral, nas restantes eleições, o número de eurodeputados a eleger pelo país foi sofrendo modificações. Em 1994, Portugal passou a eleger mais um deputado, 25, o que se manteve até às eleições de 1999. Em 2004 o país voltou a eleger 24 deputados; em 2009, 22 eurodeputados e, partir de 2014 passou a eleger 21, o número de eurodeputados que mantém agora e irá eleger já nas eleições deste ano.
Houve também modificações na própria composição eleitoral nacional, assim como nas respectivas famílias europeias a integrarem os partidos com assento na Assembleia da República portuguesa. Como exemplos, o PSD passou a integrar o Partido Popular Europeu (PPE), a primeira família europeia do CDS, a partir das eleições de 1999. Por conseguinte, o CDS ainda oscilou entre a Aliança Democrática Europeia e União pela Europa, passando a sedimentar-se no PPE a partir de 2004. Já o PS, da família do Partido Socialista Europeu, desde 2009 passou a integrar o S&D, o Grupo da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas no Parlamento Europeu. Diferenças notórias, essencialmente, pelas alianças, coligações, tanto dentro do seio das famílias europeias, como por próprias coligações internas entre os partidos, como as geradas entre PSD e CDS.
Novos agentes políticos também apareceram como o Bloco Esquerda, que passaria a integrar a família do Grupo da Esquerda no Parlamento Europeu – GUE/NGL, com a CDU; assim como mais tarde o PAN que conseguiu eleger um deputado, nas eleições de 2019, passando este a independente. Desde então, e muito em particular desde as eleições legislativas que se dariam em outubro de 2019, ano das últimas eleições europeias, a mudança da Assembleia da Republica portuguesa também mudou com a entrada de novos agentes políticos e tem a vindo a mudar, assim como as novas preocupações dos cidadãos europeus. O PE está em constante evolução assim como a própria sociedade europeia. Aguardam-se as próximas eleições.