A sexualização e objetificação de personagens femininas no cinema: uma visão

por Cátia Biscaia,    18 Janeiro, 2023
A sexualização e objetificação de personagens femininas no cinema: uma visão
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Em cada início de semestre, aos meus alunos de Cinema, enquanto falamos sobre a etimologia da palavra que dá nome à cadeira, abordo o assunto de uma forma bastante holística, culminando, quase sempre na mesma ideia: «o Cinema inspira-se na realidade; e a realidade reflete o Cinema. É um ciclo.» 

Sabendo disto, e se falarmos sobre a representação de personagens femininas na grande tela ao longo dos anos, acabamos por sentir que é fundamental que a indústria cinematográfica trabalhe para mudar a representação das mulheres, de forma que se alcance uma maior igualdade de género e combate às desigualdades.

Isto porquê? 

Ora, a sexualização de personagens femininas no cinema, refere-se à forma como as mulheres são retratadas de maneira, sexualmente, atraente ou sensual com o objetivo de atrair a atenção do público masculino. Isso pode incluir cenas de nudez, roupas reveladoras, cenas de sedução, etc. Essa representação pode ser problemática, pois perpetua a ideia de que as mulheres são objetos sexualmente disponíveis para serem consumidos pelo público masculino e reforça estereótipos de género desrespeitosos. Da mesma forma, a objetificação de personagens femininos, revela que as mulheres são retratadas como objetos sem personalidade ou características próprias; com o único objetivo de serem vistas como atraentes. Isso pode incluir cenas onde as personagens são mostradas apenas como “objetos de desejo” sem qualquer outra função na história do filme.

Temos vários exemplos disso, como por exemplo, em grande parte dos filmes das sagas James Bond, ou, mais recentemente, nas sequelas de «Transformers: onde as personagens femininas são exibidas como belas e sensuais, com cenas de cenas de sedução, retratadas como objetos de desejo para os personagens masculinos. Já no filme «Passengers» (2016), de Morten Tyldum, temos a personagem interpretada por Jennifer Lawrence retratada como objeto sexual de Chris Pratt, sendo a sua história amorosa a sua principal motivação. Ou ainda, em “Avengers: Age of Ultron”: (2015), de Joss Whedon, temos uma Scarlett Johansson exibida em cenas de luta, com roupas reveladoras e, constantemente, retratada como objeto de desejo masculino.

A lista é interminável e poderia quase escrever um livro com exemplos. O que é certo é que a representação feminina acaba por estar objetificada de alguma forma. Coisa que, muito raramente (ou nunca), acontece com personagens masculinos.

Kathryn Bigelow, a primeira mulher a ganhar o Óscar de melhor realizadora, disse: «não há nada mais importante do que o personagem. Se não tens um personagem, não tens nada. E se o seu personagem é uma mulher, ela não deve ser tratada de forma diferente do que um homem.»

É importante, então, e urgente, que argumentistas, produtores e realizadores trabalhem para criar personagens femininas tridimensionais e respeitosas; que sejam complexas e multidimensionais e não sejam simplesmente retratadas como objetos para serem admirados ou desejados. Isso pode incluir a representação de mulheres em papéis de liderança, com personalidade forte, e desenvolver histórias que as valorizem como indivíduos completos e não apenas como acessórios para a história de um homem.

A indústria do Cinema tem sido, gradualmente, mais consciente e crítica a esse problema, e várias iniciativas têm surgido para promover a representação mais justa e equilibrada de personagens femininas, mas, ainda existem muitos desafios e muito a ser feito, por isso, enquanto espectadores, todos nós também deveremos ser críticos quando compramos e assistimos os filmes. Porque, lá está: «o Cinema inspira-se na realidade; e a realidade reflete o Cinema. É um ciclo.»

Esta crónica foi originalmente publicada no Jornal de Leiria, tendo sido aqui publicada com a devida autorização.

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