A veia ativista de Roger Waters
Para além de célebre intérprete de uma das bandas mais conhecidas de todos os tempos, Roger Waters é um artista que se inspira muito no exterior e que se transcende ao agir neste. Toda a atualidade política e social não escapa ao seu trabalho, tendo esse pendor repercussões na discografia da sua banda Pink Floyd e nos seus álbuns e concertos a solo.
A sua mais recente expressão desse trilho intervencionista da sua carreira radicou na última sexta-feira, dia 20 de janeiro, jornada na qual Donald Trump foi empossado Presidente dos Estados Unidos da América. Como muitas outras figuras da atualidade, Waters interpretou uma das músicas que integra o álbum Animals, dos Pink Floyd (que exploramos aqui), de seu nome “Pigs“. No concerto, o músico recorreu a diversos elementos visuais que satirizaram a figura de Trump, tal como o seu enquadramento no meio do grupo racista Ku Klux Khan e como impropérios dirigidos ao recém-empossado presidente. O vídeo ao fim deste artigo, publicado pela página oficial do cantor no Facebook, apresenta um excerto deste concerto no qual tudo isto se sucedeu.
No entanto, não se trata de um caso virgem na carreira do artista. Atuando em diversos concertos de beneficiência (tais como em 2004, após o terramoto e tsunami no Oceano Índico e ao lado de Eric Clapton), a sua postura sempre se mostrou bastante afoita a levar os seus valores avante. Indo contra a proibição de caça em Inglaterra nesse ano, acabou por se envolver em marchas a favor da sua despenalização e por defender o direito à caça, mesmo sem nunca ter esclarecido se era a favor da prática ou não e remetendo-se à moralidade do direito. Eventualmente, e após deixar o seu país com desagrado pelo estado deste, tornou-se numa figura proeminente em algumas organizações norte-americanas, tais como a Millennium Promise, destinada a lutar contra a pobreza extrema e a malária. Para além disso, fez parte de um concerto destinado a aumentar as atenções para os desafios que o aquecimento global suscitam. Foi este o Live Earth concert e decorria o mês de 2007, ainda longe dos tempos nos quais Trump desprezaria a sua importância.
Numa amplitude mais internacional, o músico mostrou-se sempre crítico de Israel, embora tenha sempre refutado as as acusações deste ser anti-semita. Entre essas demonstrações de oposição, elencam-se a oposição ao Muro da Cisjordânia, o apoio dado ao movimento BDS (Boycott, Divestment and Sanctions) e de ter integrado numa tournée sua (The Wall Live) um avião bombardeiro a deixar cair a Estrela de David e símbolos de dólares. Tudo isto gerou alguma polémica e prejuízo para a sua carreira, sendo forçado a modificar o vídeo e perdendo patrocínios para as suas diferentes tours. Waters tornou também mais recorrente a entoação de canções do álbum The Wall (dos Pink Floyd, datado de 1979), reconhecendo a sua importância após os conflitos no Iraque e nas perdas aí existentes. Desde então, foi-se mostrando igualmente ativo em concertos de reconhecimento aos veteranos militares americanos (Stand Up for Heroes, 2012) e emitindo as suas opiniões sobre contingências da atualidade, defendendo à data Chelsea Manning, militar acusado de ter revelado quase um milhão de documentos confidenciais à WikiLeaks.
Assim, e com mais ou menos controvérsia, Roger Waters segue a sua carreira de forma muito ativa, no auge dos seus 73 anos. Nunca desperdiçando as circunstâncias para expressar aquilo que pensa e o integrar nos seus espetáculos, o baixista dos Pink Floyd volta a exibir-se em estilo e em acutilância, numa ebulição de tournées. Tudo com muito de nostalgia que se adequa e que retrata com plenitude a verdade dos nossos dias.