Ainda é permitido parar para pensar?
O jovem do século XXI vive um paradoxo clássico, mas num novo ritmo: o de viver somente o momento presente e captar tudo numa fração de segundo. Não aguenta esperar e não consegue apreciar. Não consegue parar para reflectir e acaba por ter um cada vez menor sentido crítico sobre as grandes questões da sua época. Precisa de estar a par de tudo, como um ser omnipresente.
Através das novas tecnologias e das redes sociais, tenta absorver toda a informação e simultaneamente participar nesse mesmo mundo. Deste modo, criou um novo medo: o de não existir virtualmente. Como é que eu provo a minha existência? Há a resposta clássica de que se sofrermos, então existimos. É quando batemos no fundo que sabemos que não vivemos numa ilusão. Mas isto já não basta. Não basta dar um grito na rua, movermo-nos ou simplesmente existirmos para comprovarmos tal coisa. Agora precisamos de mostrar, através da publicação de uma foto ou da atribuição de um like – graficamente representado por um polegar – que estamos vivos e somos ativos. Para além disso, é através deste método que mostramos o quão interessante é a nossa vida. Ou não. Obviamente que não considero que, por si só, exista um problema em captar um momento através de uma fotografia. A própria génese da arte de fotografar é a captação de um momento, de um espaço ou de um sentimento. O grande problema é termos criado um mundo incontrolável do qual dependemos. E é esta dimensão que decide quem somos, não o oposto.
Atualmente, vivemos numa bolha virtual que foi criada pela globalização. Quanto mais as fronteiras se alargaram, mais viciados ficamos de um mundo paralelo. Vivemos num mundo onde é mais fácil viajar pela Europa fora ou ir a um festival. As barreiras físicas são menores, mas não nos tornámos em cidadãos mais conscientes e críticos. Ao mesmo tempo que pomos um like numa foto ou adicionamos uma pessoa supostamente interessante, esquecemo-nos da crise dos refugiados que já chegou às nossas costas. Da mesma forma que no século XX, nos EUA, a maioria da sociedade branca vivia numa bolha na qual não conhecia o quotidiano de um cidadão negro. Achavam que os negros faziam coisas diferentes ou, pelo menos, não tinham a certeza que faziam as mesmas coisas essenciais para qualquer ser humano. Agora vivemos num mundo virtual que faz com que seja difícil percecionar as novas problemáticas com que as sociedades se deparam. Passamos pela rua de telemóvel na mão e cabeça inclinada e não reparamos no sem-abrigo que se aquece protegido por uma muralha feita de cartão. Quanto mais profunda é a nossa dependência maior é a nossa hipocrisia. O mundo virtual é tanto a nossa maior alegria como a razão para a nossa depressão. A bolha que nos defende de todo o mal que abala o ser humano do presente, aquele mundo perfeito e rosa, é a mesma que nos obriga a ser outra pessoa, uma persona que nos faz sofrer e é constantemente exigente.
Ainda acredito num espaço, por mais pequeno que seja, para nos debatermos sobre as grandes questões fraturantes da nossa sociedade. Debatermos sobre o papel da política ou da imprensa em vez de emojis; das crises humanitárias ou do terrorismo em vez de lives; de Trump e o seu amigo norte-coreano em vez da criação de personas virtuais. Tudo isto, obviamente, constatando o devido mérito e benefícios destas mesmas redes sociais e das novas tecnologias. Como muitos problemas da vida, de uma perspectiva humilde, as coisas resolviam-se através de uma dose de moderação e um pouco de sentido crítico.