As vidas de Robert de Niro
Com uma carreira recheada de papéis emblemáticos no mundo do cinema e pontificando como um dos melhores atores das décadas de 70 e 80, Robert De Niro sempre apresentou um cunho personalizado nas suas interpretações. Exibindo intensidade e transmitindo um ar autoritário nas suas personagens, o norte-americano brilhou em diversos tipos de papéis, tais como um criminoso em ascensão ou como um detrator da sociedade. De Niro é um nome indissociável dos grandes nomes do cinema norte-americano, transportando uma mística reverenciada pelos seus sucessores.
Robert De Niro nasceu a 17 de agosto de 1943 na zona de Manhattan, Nova Iorque, nos Estados Unidos da América, zona essa que viria a ser cenário de vários sucessos do ator. Os pais de Robert tinham ligações artísticas, sendo filho de uma pintora e poeta e de um pintor e escultor expressionista abstrato, corrente artística que predominava na zona em que vivia. Com ascendência italiana e irlandesa, o jovem desde cedo mostrou apetência para a representação, destacando-se na peça “The Wizard of Oz” ao representar o leão cobarde e frequentando diversos conservatórios e até abandonando os estudos para perseguir o seu sonho de ator de cinema.
Com alguns trabalhos na década de 60 e nos inícios dos anos 70, inclusive um dos primeiros filmes de Martin Scorsese denominado “Mean Streets” (1973), foi no ano seguinte que De Niro atingiu o seu primeiro pico de notoriedade no cinema. Com 31 anos, o nova-iorquino assumiu o desafio de representar a juventude de Vito Corleone em “The Godfather II”, após ter comparecido em castings para vários papéis do antecessor deste filme, como Sonny ou Michael Corleone, sem alcançar sucesso. Ao interpretar o papel essencialmente em dialetos sicilianos, apesar de escassas falas em inglês, o ator fez história ao ser o primeiro ator a conquistar um Óscar (Melhor Ator Secundário) com essa particularidade. Para além disso, a personagem foi a primeira a arrecadar dois galardões para dois atores diferentes, com o antecessor de De Niro, Marlon Brando (1972), a também conquistar um no primeiro filme da trilogia, realizada por Francis Ford Coppola. Estava, assim, lançada uma carreira que viria a ser muito frutífera.
“One of the things about acting is it allows you to live other people’s lives without having to pay the price.”
Robert De Niro quanto a uma das particularidades do seu ofício.
Após um papel que exigiu do ator uma frieza exemplar e uma postura firme e imponente, vários foram os filmes em que tanto conquistou Óscares (“Raging Bull”, de 1980) como arrecadou nomeações para os mesmos (“Taxi Driver”, de 1976; “The Deer Hunter”, de 1978; “Awakenings”, de 1990; “Cape Fear”, de 1991 e “Silver Linings Playbook”, de 2012). Apresentados os seus maiores êxitos, para além de “Once Upon a Time in America” (1983) e “Goodfellas” (1990), importa destacar a sua profícua parceria com o realizador Martin Scorsese. Com ambos a nutrirem uma intensa paixão e vontade de explorar os meandros de Nova Iorque, Scorsese raramente abdicou do ator nos seus trabalhos e, com isso, abriu portas a que uma lenda da representação norte-americana se edificasse.
Dentro desta sinergia, importa destacar a relevância dos filmes Taxi Driver, Raging Bull e Goodfellas, embora este numa nota menos significativa. No primeiro, De Niro representa um taxista e veterano da guerra do Vietname que, com uma consciência crítica bastante ativa, tem um horário extenuante e, aliado a um estado de depressão e de solidão, começa a desprezar o que o rodeia e a indiciar princípios de um transtorno psicológico em relação à sociedade. Assim, no auge da sua loucura, começa a adquirir armas na tentativa de “limpar” a cidade dos podres que a intoxicam, como os toxicodependentes, os ladrões e os “pimps” (a famosa deixa “You talkin’ to me” surge à tona). De Niro representa o papel de forma subtil e discreta mas não deixando de expressar claramente o que a personagem pensa e o que lhe apoquenta. O filme, que se revelou num dos grandes esplendores psicológicos dos anos 70, permitiu que o ator demonstrasse uma nova vertente do seu trabalho e que lhe permitiu abrir horizontes para além dos criminosos que usualmente interpretava.
“I go to Paris, I go to London, I go to Rome, and I always say, “There’s no place like New York. It’s the most exciting city in the world now. That’s the way it is. That’s it.”
Robert De Niro sobre Nova Iorque.
Quanto a Raging Bull, De Niro assume o papel de Jake LaMotta, um boxer que realmente existiu e com o filme a tratar-se de um traçado biográfico do mesmo. Para a personagem, o ator engordou 27 quilos para as cenas em que retrata os anos avançados do desportista e expôs novamente a sua versatilidade como artista. Para além de mostrar um lado feroz, acérrimo e até psicopático que parece intrínseco de De Niro, o nova-iorquino carateriza também o pólo boémio e confraternizador confortavelmente, explicitando a facilidade que tem de entreter o espectador. Em suma, temos novamente o norte-americano a consolidar as virtudes que tem ao representar um homem impulsivo e agressivo mas também a conseguir implicitar esta faceta dando lugar a um carismático e divertido personagem que garante facilmente a empatia com o espectador.
“I’ve never been one of those actors who has touted myself as a fascinating human being. I had to decide early on whether I was to be an actor or a personality.”
Robert De Niro quanto à sua personalidade.
Em suma, Robert De Niro é considerado como um dos atores com maior prestígio da atualidade, granjeando a sua maior fatia de sucesso nas décadas de 70 e 80. Um nova-iorquino de gema, manteve uma parceira de imenso sucesso com o realizador Martin Scorsese e deu a conhecer, através de representações sensacionais tanto a nível emotivo como psicológico, os prós e os contras de Nova Iorque. Com um talento especial, que lhe permite ir do vilão mais acérrimo e maquiavélico até ao homem mais perdido e perturbado, o ator norte-americano percorreu e vem percorrendo, embora agora com menos êxito, um caminho que é inspiração das seguintes fornadas de atores que se afirmaram na década de 90 e seguintes. De Nova Iorque para o mundo, do entretenimento até ao drama, dos esquemas até às emoções mais recalcadas, de grupos criminosos até à solidão de um espírito pobre e sem rumo. Robert De Niro conseguiu representar tudo isto e sem desnudar oscilações de rendimento. É este o melhor elogio que se pode fazer a um ator, o de poder representar tudo e sem fantasiar.