Edwin Hubble: o mensageiro das estrelas distantes
Edwin Hubble foi um dos mais ilustres e brilhantes astrónomos da época contemporânea. O seu enorme contributo para a astronomia permitiu que fossem descobertas galáxias para além da Via Láctea, observações que também viriam a sustentar a teoria do Big Bang ao comprovar que o Universo se encontra em expansão, ficando conhecido como o “pioneiro das estrelas distantes”. Embora o seu nome esteja associado ao telescópio espacial, lançado em 1990 pela NASA e baptizado em sua honra, Edwin Hubble deixou um enorme legado na astronomia e na cosmologia, graças às suas observações preciosas que fizeram com que conhecêssemos um pouco mais sobre o universo e sobre as suas possíveis origens.
Edwin Powell Hubble nasceu a 20 de Novembro de 1889 em Marshfield, no estado de Misouri nos Estados Unidos da América. A família de Hubble mover-se-ia no ano seguinte após o seu nascimento para Wheaton em Illinois. Durante os seus tempos de juventude Edwin Hubble notabilizou-se mais como atleta do que como aluno. Embora tenha sido brilhante a todas as disciplinas que tinha, excepto línguas no geral, foi no desporto que começou por dar os primeiros voos, no basebol, no futebol americano e também no atletismo, tendo ganho diversos prémios durante a sua juventude. Ingressa mais tarde na Universidade de Chicago para estudar Matemática, Astronomia e Filosofia. Torna-se numa figura chave na equipa de basquetebol da mesma universidade, levando-a ao título da big team conference em 1907. Os seus dotes atléticos não se sobrepunham de todo aos seus dotes académicos, e obteria a sua licenciatura com distinção em 1910. Acabaria por passar um ano no laboratório de Robert Millikan que viria a ser galardoado mais tarde com o Prémio Nobel da Física em 1923, dadas as suas contribuições no efeito fotoeléctrico.
No entanto, a insistência do seu pai ao querer ver o seu filho formar-se em direito levaria mais tarde a partir para o velho continente, passando três anos no Queen’s College em Oxford, no Reino Unido. A morte do seu pai em 1913 fez com que regressasse novamente aos Estados Unidos para cuidar da sua mãe e dos irmãos mais novos. Sem motivação para exercer direito acaba por ser professor de Castelhano, Física e Matemática em New Albany no Indiana, onde treina a equipa de basebol masculina do liceu onde lecciona. No ano seguinte ingressa na Universidade de Chicago, desta vez como estudante de doutoramento no observatório Yerkes. A entrada dos Estados Unidos na primeira grande guerra, Hubble interrompe a sua dissertação para ingressar no exército norte-americano, chegando a major. Após a guerra regressa ao Reino Unido, passando um ano em Cambridge, onde adquire uma nova bagagem sobre diversos conhecimentos sobre astronomia e cosmologia que viriam a ser muito importantes na sua carreira de astrónomo.
Em 1919 ingressa no Observatório de Mount Wilson na California, chegando ao cume da montanha pronto para começar a utilizar o recém-inaugurado telescópio Hooker, o mais poderoso do mundo naquela época. Hubble trava uma certa competição com Harlow Shapley, que na altura já era conhecido pelos seus trabalhos sobre as medições do tamanho da Via Láctea. Contrariamente ao seu rival, Hubble utilizou para tal uma série de estrelas brilhantes, denominadas como Céfedes, como fontes de luz padrão, calculando que tinha cerca de 300 mil anos-luz de largura, dez vezes mais do que os valores na altura estipulados e que coincidem com os valores hoje já estabelecidos graças a observações e a cálculos mais sofisticados. Mas as observações de Hubble iriam muito para além das dimensões na nossa galáxia.
Durante muitos anos os astrónomos acreditavam que havia somente uma galáxia no cosmos, e que seria mesmo a Via Láctea, onde nos encontramos. O filósofo Immanuel Kant sugeriu que a M31 (Messier 31, corpo celeste incluído no cátalogo do astrónomo Charles Messier), seria outra Via Láctea composta por um grande número de estrelas, e lançou o termo “universos-ilhas” para denominar corpos semelhantes. Descobriu-se que estas estrelas identificadas na M31 por Edwin Hubble, em 1924, eram mais pálidas e menos nítidas do que aquelas que observara na nossa galáxia. Isto clarificava que a M31 se encontrava muito mais distante do que as restantes estrelas, cerca de dois milhões de anos-luz. Uma distância desta dimensão não poderia corresponder simplesmente a uma estrela, mas a algo muito maior. A M31 é assim conhecida hoje como aquela que é a galáxia Andrómeda.
Em parceria com o seu colega Milton L. Humason e seguindo a orientação dada por V. M. Slipher, do Observatório Lowell, ambos fizeram medições dos espectros das galáxias, evidenciando que estes são desviados na região do espectro de luz vermelha e que, quanto mais distante uma galáxia se encontra, maior o desvio para o comprimento de onda correspondente à luz vermelha. Com isto, tornava-se evidente que as galáxias se encontravam em afastamento de umas em relação às outras, e seria assim formulada uma lei com o seu nome proveniente destas observações: a Lei de Hubble. Tal conduziria também a que Humason e Hubble, aos poucos, conseguissem sustentar a tão célebre teoria do Big Bang sobre a origem do universo. Apesar de esta ser apenas uma teoria, porque não se sabe ao certo como terá sido, esta continua a ser a explicação mais recente e plausível sobre o modo como tudo terá começado com uma expansão violenta de algo muito denso, com uma rápida formação de partículas subatómicas e de átomos, seguindo-se de uma formação muito mais lenta das galáxias e dos astros que hoje conhecemos. O afastamento das galáxias, umas em relação às outras, evidenciava que de facto algo terá eclodido no início, dando início a uma expansão que ainda perdura embora de uma forma muito mais lenta do que aquela que ocorrera há 13.8 mil milhões de anos atrás.
Hubble provou a existência de nebulosas fora das fronteiras da Via Láctea, constituídas de sistemas estelares independentes. Daí, que tenha ficado conhecido como o “pioneiro das estrelas distantes”. Foram diversas as galáxias semelhantes à Via Láctea que Hubble conseguiu desvendar, e ainda muitas outras outras com formas diferentes. Utilizou um critério de classificação conhecido como “Sequência de Hubble”, que mais tarde foi expandido pelos astrónomos Gérard de Vaucouleurs e Allan Sandage. Aglomerou-as em galáxias espirais (com forma de espiral plana, com a Via Láctea), galáxias elípticas (como forma elíptica), lenticulares (com forma de lentícula, mais achatada do que a elíptica) e ainda as irregulares que não contêm uma forma definida (como as Nuvens de Magalhães). O único reconhecimento que lhe faltou foi um Prémio Nobel, e não terá conseguido por falta de esforço ou falta de reconhecimento do seu trabalho. Na altura o prémio Nobel da Física estava mais virado para teorias comprovadas e experimentações obtidas com sucesso. Hubble contou com uma enorme campanha como inclusão a astronomia como possível ramo de estudo de Física, que envolveu inclusive publicitários. Consta-se estava prestes a ser galardoado durante os anos 50, década em que falecera. Quando o comitê Nobel decidiu que a astronomia poderia ser encarada como um ramo da Física, já seria demasiado tarde.
Hubble sofreu um ataque cardíaco em 1949, e desde então não voltou com a mesma energia que tinha às suas observações astronómicas. No entanto, nenhuma nova descoberta poderia já acrescentar o que quer que fosse à sua reputação que era mais do que enorme. Faleceria a 28 de setembro de 1953, aos 63 anos, em San Marino na Califórnia, vítima de uma trombose venosa cerebral, deixando a sua mulher Grace Lillian Leib com quem casara em 1924. Ambos não tiveram descendência. Hubble não teve cerimónias fúnebres e a sua mulher nunca revelou o local onde se encontra sepultado. Algo que se tornou uma incógnita sobre o desfecho da vida de alguém que nos revelou os mais íntimos mistérios de um universo repleto de tanto por conhecer.
Após as importantes observações astronómicas através na luneta de Galileu durante o século XVII, reportados de forma bem detalhada na obra Siderius Nuncius (O Mensageiro das Estrelas) foram determinantes para o conhecimento do nosso sistema planetário, de astros desconhecidos, fundamentando também a teoria heliocêntrica que se oponha à geocêntrica defendida pela igreja católica e assumida como um dogma durante séculos. Edwin Hubble acabou por ser um sucessor de Galileu nesse aspecto, ao trazer-nos informações preciosas através das suas observações, que nos permitiram ver que o universo é muito mais infindável do que aquilo que julgávamos ser, elevando ainda mais os conhecimentos sobre astronomia e cosmologia que hoje temos ao dispor. Hubble acabaria por ser o nosso mensageiro das estrelas distantes, ao desvendar o que ainda está muito para além do nosso alcance, mas não fora do alcance das observações astronómicas.
A sua verdadeira homenagem e compensação póstuma viria com o Telescópio Espacial Hubble, lançado pela NASA a 24 de Abril de 1990, que consiste num satélite em órbita do planeta Terra. Este satélite, não tripulado, transporta um grande telescópio que capta imagens do espaço através de luz visível e infravermelha. Ao fim e ao cabo, acaba por ser um satélite em órbita terra, algo que terá sido o sonho de muitos astrónomos de que poderíamos ter em órbita da Terra, um telescópio lançado por um foguete, termo utilizado quando ainda nem sequer se imaginava a existência de vaivéns espaciais como transportadores de satélites artificiais. Apesar de ser o mais célebre, este não foi o primeiro telescópio espacial a ser lançado, mas sim o primeiro de grandes dimensões. Antes já os Estados Unidos teriam lançado o OAO-2, em 1968, e que tivera um tempo de vida de cinco anos.
O telescópio Hubble trouxe-nos informações precisas sobre o Universo, que permitiu a descoberta de outras galáxias distantes, informações que permitiriam a que chegássemos a uma idade do universo com maior precisão, novos dados que admitiam a possibilidade da existência de matéria negra no espaço e ainda evidencias de supernovas, buracos negros que mais tarde foram desvendados com maior detalhe. No dia de Natal de 2021, um outro telescópio foi lançado pela NASA, e que foi imediatamente visto como possível sucessor do Hubble. O James Webb, baptizado em honra de James Edwin Webb, militar e líder das missões Apolo (a Apolo 11, de 1969 tornou-se a mais célebre por colocar pela primeira vez o Homem na Lua), tem-nos trazido imagens com maior detalhe que nos permitem ter um conhecimento mais amplo do infindável que nos rodeia. No entanto, foi o telescópio Hubble que foi o pioneiro dos grandes telescópios espaciais, acabando por ser o pai dos potentes telescópios que ainda haverão de existir e que nos abrirão portas ao que ainda nos falta conhecer sobre o universo e sobre as suas origens.
Sejam quais forem as maravilhas que os telescópios espaciais cada vez mais potentes nos venham a revelar, as primeiras aconteceram na luneta de Galileu Galilei e as mais espantosas no cume solitário da Califórnia onde Edwin Hubble vislumbrou as infindáveis dimensões do universo. Numa das famosas frases de Albert Einstein, a grande figura da Física do século XX, este dizia que “Só existem duas coisas infinitas. O universo, e a estupidez humana. E não estou certo quanto à primeira”. Hubble acabou por nos demonstrar que o universo é bem mais infindável do que julgamos e que as suas origens bem mais remotas do que pensávamos. Tudo terá começado com o Big Bang, há cerca de 13.8 mil milhões de anos, que nos conduziria muito lentamente àquilo onde nos encontramos hoje. Ainda se desconhecem quais são verdadeiramente as dimensões do universo e se este terá algum limite. No entanto, estas revelaram-se muito maiores do que alguma vez poderíamos imaginar, graças às observações preciosas que Edwin Hubble nos conferiu.