Em ‘Hive Mind’, The Internet criam o som do verão que gostaríamos de ter
Celebrando agora o quarto LP da sua discografia, os The Internet são um nome que para muitos não passa da banda secundária de alguns membros dos Odd Future, coletiva criada por Tyler, the Creator e hoje encabeçada por nomes como Frank Ocean ou Earl Sweatshirt. E se os dois primeiros lançamentos da banda não iam além disso mesmo, pela sua ligeireza e falta de foco – são álbuns passiveis, quase que demos de trabalhos que poderiam ter sido tanto mais –, “Ego Death”, de 2015, fez a musicalidade da banda destacar-se pela primeira vez no panorama em que se insere. A atmosfera temperamental e os baixos pronunciados de “Get Away” e “Special Affair” contrastaram com a leveza melódica de “Under Control” e “Something’s Missing”, tornando-o num dos mais cativantes álbuns de soul do ano, ganhando ainda muito do merecido reconhecimento pelas colaborações que apresentou, como Vic Mensa ou Kaytranada.
Ora, “Hive Mind”, lançado agora, supera o seu antecessor. É integralmente o melhor álbum da banda, em termos de consistência, articulação instrumental, produção e estilo. Para este triunfo funk, compreende-se que teve um importante papel uma certa liberalização estrutural da banda. Steve Lacy, o guitarrista/baixista no grupo – e também produtor a solo, sendo o responsável, por exemplo, pela “PRIDE.” de Kendrick Lamar – toma agora as rédeas vocais em algumas musicas, quebrando a constância do flow abafado da vocalista Syd. “Roll (Burbank Funk)”, o primeiro single, foi premonitório precisamente dessa alteração, e resume bem a ambience geral que o grupo procurou transmitir com o álbum. A par de “Come Together” e “Beat Goes On”, “Roll” tem uma das secções rítmicas mais preponderantes não só do álbum, mas como de todo o presente ano; As percussões remanescem ora ao trabalho de mpc de J Dilla quando computorizadas, ora ao toque jazz-y da bateria de Karriem Riggins quando combinadas com os baixos on the pocket de Lacy e Patrick Paige II.
“Wanna Be” é a musica que melodicamente mais ressoa; uma melodia claramente escrita por Lacy, num estilo que o próprio descreve enquanto “Plaid” – literalmente enquanto o padrão xadrez escocês, e que é claramente reflexivo da guitarra de Mac DeMarco –, funde aquilo que o musico fez no seu primeiro EP a solo com a suavidade de Syd, que juntas conseguem exceder no tempo criado por Christopher Allan Smith na bateria.
Liricamente, à semelhança dos álbuns anteriores do grupo, não há grandes assuntos em destaque, visto haver uma continuo retorno a temáticas genéricas e repetição persistente; as musicas focam-se maioritariamente num trabalho de sedução de Syd (“You’re beautiful babe / You’re really something” em “Come Over”) e na redundância de Lacy em sentir a vibe (“I just came to dance / Wanna move” em “La Di Da”). Contudo essa levianidade é precisamente o que a musica de “Hive Mind” infere: dança e flirt veranil; é musica que trabalha mais o instrumental e o ritmo que qualquer mensagem que lhe seja adjacente, não requerendo grandes textualidades. Pontualmente há alguma maior primoria nesse aspeto, por exemplo, em “Bravo”, onde há uma narrativa metafórica entre performance e atitude social, com as palavras reprovadoras de Syd a balançarem entre um e outro – “Look around, what a mess you made / Watching from the crowd, it’s astounding”, ” Thought that you had changed / I found out it’s just a role you play”.
No seu todo, “Hive Mind” acaba por funcionar muito como “99.9%”de Kaytranada, seguindo muitas vezes a mesma espécie de receita (fácil de detetar em “Mood” e “Hold On”), o que é expectável quando considerando que seguem muitas das mesmas influencias; ainda assim, a The Internet nunca descuram de uma identidade própria que permitiram o publico vislumbrar pela primeira vez em 2015, entregando um álbum de destaque, o seu melhor até à data, que funciona em pleno especialmente nesta época veranil.