Entrevista. Constança Urbano de Sousa: “A Europa tem a obrigação jurídica e moral de acolher e proteger os emigrantes e refugiados”
Com o objetivo de aproximar os cidadãos da política, o projeto Os 230 continua a divulgar as entrevistas aos deputados da Assembleia da República. Desta vez, é Constança Urbano de Sousa, do Partido Socialista (PS), quem conversa com Francisco Cordeiro de Araújo, fundador da iniciativa. Entre os vários assuntos abordados, a deputada responde à questão se alguma vez voltaria a exercer funções num governo, defende uma reforma do sistema eleitoral e vê na pasta da Administração Interna, que ministrou entre 2015 e 2017, uma pasta retratada pela comunicação social como a da “desgraça”.
Apesar de ser natural de Coimbra, a infância da deputada do PS foi muito para além da cidade conhecida pelas tradições académicas. “Como filha de um juíz, andei a saltitar de terra em terra”, conta, fazendo referência a regiões com Vila Nova de Gaia, Amarante e Tavira. E, embora licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Constança Urbano de Sousa garante não ter grandes saudades da cidade portuguesa. Revelando-se uma “estudante atípica”, a deputada do PS conta que desde cedo gostou de viajar fora de Portugal e, a partir do 3º ano da licenciatura, “já passava grandes temporadas na Alemanha”, país onde viveu cerca de 7 anos.
Admitindo que esse período a fez olhar para o país e para o resto do mundo de uma forma diferente, a antiga Ministra da Administração Interna afirma também que essa fase alterou a sua forma de ser. “Há pessoas que dizem que sou muito germânica, muito austera, frontal, apegada a certos princípios… Pouco portuguesa às vezes”, conta.
Da pasta da Administração Interna ao tema da migração e dos refugiados
Aderindo ao PS em 2000, Constança Urbano de Sousa vê nesta força política o “partido campeão da justiça social” e garante: “sou socialista por natureza e convicção”. Em 2015 foi eleita Ministra da pasta da Administração Interna, com António Costa como Primeiro-Ministro, político pelo qual garante ter uma grande “admiração”. A cargo dessa pasta na altura dos incêndios de Pedrógão Grande que marcaram o país, a deputada define este cargo como “difícil” e que “depende de bastantes contingências”. “Não é uma pasta de floreados, não se inaugura pontes ou aeroportos…”, considerando que, quando surgem notícias sobre esta pasta, são sempre negativas.
No caso particular dos incêndios, Constança Urbano de Sousa dá uma garantia. “As pessoas em Pedrógão, aquelas que estavam a respirar o mesmo fumo do que eu, (…) estavam gratas pelo simples facto de eu estar com elas”. Por isso, e admitindo que na altura existiu um “circulo mediático hostil” à sua pessoa, fala também num “grande apoio”.
Com uma vasta experiência profissional e académica, o Direito Europeu foi uma das áreas em que se especializou. Neste sentido, o tema da migração e dos refugiados foi um assunto que abordou durante a entrevista. Referindo-se a esta área como uma “realidade que existe e que sempre existirá”, Constança Urbano de Sousa afirma que se trata de um “fenómeno que não se compadece unicamente com soluções puramente nacionais, porque é impossível regular um fenómeno humano que, por natureza, é transnacional”. Por isso, fala numa “tensão terrível”, considerando que, ao nível da União Europeia (UE), “não existe uma verdadeira política comum que regule o fenómeno de forma transparente, simples e humana”. Apesar de tudo, defende que “a Europa tem a obrigação jurídica e moral de acolher e proteger” os emigrantes e refugiados.
Tendo a convicção de que a UE não está a conseguir garantir um enquadramento jurídico que permita aos refugiados contarem com um local de proteção, Constança Urbano de Sousa defende que estão a ser favorecidas “redes criminosas de emigração irregular”. Com a “chamada crise dos refugiados” em 2015, a deputada fala ainda de uma “rápida ascensão de muitos partidos populistas de extrema direita por toda a Europa”, que fizeram do discurso antissistema e anti Europa um eixo, “propagando o medo”. É neste contexto que a deputada do PS faz referência a Angela Merkel, atual chanceler da Alemanha, que, na altura, “ganha expressão política com um grande cavalo de batalha: a luta contra o discurso do ódio”.
“Verão Quente de 1975”: as escolhas da deputada do PS
Na segunda parte da entrevista, mais dinâmica, Constança Urbano de Sousa responde a alguns “dilemas”. Entre o poder executivo e o legislativo, por exemplo, escolhe a primeira opção, e, quando questionada sobre o melhor Presidente da República, a deputada do PS escolhe Mário Soares.
E com que personalidade é que Constança Urbano de Sousa gostaria de almoçar? Barack Obama, garante. É também no segundo momento da entrevista que a deputada esclarece que coloca de parte a possibilidade de voltar para um governo. Sobre a distância que existe entre eleitores e eleito, refere que existe uma ideia de que “os políticos são uma «cambada» de corruptos e culpados dos males do mundo e, por isso, é preciso combatê-los”. “Mas isso não corresponde minimamente à realidade”, defende, considerando que, devido a este “preconceito”, “os melhores acabam por não seguirem a área da política”.
Quanto a uma reforma do sistema eleitoral, Constança Urbano de Sousa defende essa possibilidade, destacando a necessidade de uma solução que aproxime mais os eleitores dos eleitos. Por fim, a deputada do PS deixa uma mensagem de esperança aos portugueses.
Artigo escrito por Ana Filipa Duarte, colaboradora do projeto Os 230.