Gabriel, o Pensador escreve direito por linhas tortas
Beleza. Bê-lê-za. A leitura do vocábulo em idioma português do Brasil assume outros contornos. Provavelmente, até faz lembrar alguém cuja reminiscência não entra de rompante no relvado mental. Várias são os semblantes capazes de serem associados ao pronunciar de um termo aparentemente parco em significância.
Tenho por hábito pensar antes de consumar qualquer dedilhar de teclas. Caso o contrário não aconteça — ou seja, olvidar a prática desse exercício – posso induzir, transportar e emanar uma espécie de angústia. Angústia essa que pode traduzir-se em dor. Escoltado por este raciocínio lógico, afirmo que tento pensar antes de poder causar dor.
Há quem pense enquanto disserte sobre dor. Gabriel, o Pensador. Aulas de segregação urgem. Incutir Fernando Pessoa nestas linhas não era, de todo, uma perda de tempo, embora não tenhamos tempo para fazê-lo. Contextualizar historicamente o passado do Homem que queria morar e fundir-se com uma favela não constitui prenúncio fulcral, embora as letras – ou poesia transparente, como gosto de denominar — retratem a realidade, nua, crua, pobre, indigente.
Uma certeza, desde cedo: Escrever. Uma vez mais, isolam-se sílabas. Crer: a fé num corpo social denso em vivências, experiências múltiplas e riquezas que não compõe o palpável, o fugaz e o coeficiente hábil no eclodir de disparidades culturais, económicas e sociais. Ver: contemplar a envolvência sem recorrer e engolir patranhas, corresponder às necessidades de discurso de uma fração social incapaz de fazer arrolar o seu ímpeto, estar alerta e alertar para os perigos e contratempos e comportamentos subversivos como o racismo, a xenofobia e a obrigatoriedade do serviço militar.
Registar os momentos através dos quais a observação pode ser examinada sob o ponto de vista de uma Arte e escoada para um Sentido. Gabriel urde, na perfeição, o encargo e posterior pintura de um retrato. Visam-se copiosas problemáticas de cariz comunitário. O espetro assenta os polos na venda e consumo de droga e nos que lutam pela sobrevivência.
A impressão inicial pode aludir a um solitário. Surfista, mas também naquela que se caracteriza por relação afetiva. O seu fiel companheiro é Deus, o patrono. Os agradecimentos são constantes, a crença move esta locomotiva que — aqui — manifesta e desbrava outro trilho da maratona que exibe a sua personalidade. Até à data, longas listas de suplicas dirigiu a quem trata da papelada e da proveniência de parte da sua inspiração.
A renúncia à violência e a comportamentos que a adotem é uma das armas mais utilizadas por quem é acusado — sem alegações — de assassinar o presidente. Verbalmente, preterindo o sentido literal. O estilo mordaz, o inconformismo, a insubordinação e a mutabilidade de preocupações com ponto de partida na corrupção corroeram as feições dos mais altos cargos da nação, incluindo o à altura primeiro-ministro Collor de Melo. Estas quatro balas trespassavam o manto de imputabilidade que cobria (e continua a cobrir) o Brasil.
Pausa para cachimbo e para realizar a devida fumaça.
Nota: Gabriel merece a minha afeição, o meu fascínio. Desde cedo que, aquando do deparo com vanguardistas e revolucionários capazes de conduzir as massas, brotou a admiração pelas pessoas que incluo neste lote e o cantautor integra a convocatória. Porque é, foi e sempre será preciso agitação, ebulição. O lema do Brasil é incisivo: Ordem e Progresso. Gabriel, o Pensador analisa a consciência coletiva, expõe-na e é capaz de ditá-la. Assim, se faz jus ao epíteto de uma nação.