“HyperNormalisation” atordoa qualquer um. Um documentário obrigatório
Somos pequenos. Muito pequenos. Conforme vamos descobrindo o mundo, ainda mais pequenos nos tornamos. Não é preciso estarmos imiscuidos numa multidão de um concerto, num estádio de futebol, ou numa metrópole numa hora de ponta para que isso aconteça. Basta sentarmo-nos à frente de um dado visor, e darmos por nós a ver um documentário sobre o mundo, e a sua história. Os anos mais recentes são aqueles que mais nos dizem, por razões normais. Foram aqueles em que vivemos, e os anos transatos a esses foram os que influenciaram a que esse trajeto se concretizasse.
A pequenez torna-se aprofundada e amedrontada conforme vamos espreitando a mundividência conspirativa. Por mais ilegítima que se confirme, as teorias vão surgindo. São pontos de especulação, que nos conduzem a pensar (sobre) o mundo. Assim como os pensadores, que vão figurando e configurando perspetivas distintas e discrepantes em relação ao que os meios de comunicação nos veiculam. Pelo meio, as corporações. São dinheiros acumulados, apetrechados, e voltados para dar o apoio multiforme que tanto urge, perante a mutabilidade da realidade. Urge, de igual forma, que não se releguem as teorias que, por mais descabidas que aparentem ser, fazem descolar pestanas.
Os Estados Unidos da América. Uma nação multiplicadora da divisão. Surge assim no rumo de um sonho pintado, transplantado para o rumo dos mais vastos sonhadores do mundo. Mais do que os Grand Canyons ou as Cataratas do Niagara, está Las Vegas, Nova Iorque, Los Angeles. Polos de atração, onde voa a idolatria, a ganância, a sede pelo negócio bem-sucedido. O desejo de envergar um fato ou um vestido, e de cantar, mais do que valores, glória. Mais do que viver em verdade, viver na fatalidade de uma morte da qual se foge em eternos retornados encantamentos. É um ciclo vicioso, pernicioso no final das contas, quando as operações disparam para as casas de unidades esbanjadas e esquecidas, perante os amores não-vividos, perante a verdade descartada perante as iniquidades sensaboronas do mundo.
Foi Reagan, foram Bushes, foi Nixon, foi Clinton, foi Obama. Agora, é Trump. Como é que se tornou Trump? As eleições foram limpas, transparentes. Contudo, pulula a polémica da intromissão russa, bombardeada em temores e terrores pelas imprensas do Ocidente. Por mais que a realidade não traduza o governo perfeito, a verdade não deixa de perder o seu estatuto prioritário, para onde quer que viaje. Também na Rússia, o idílico não existe. Nem com as promessas soviéticas e socialistas isso se procedeu, ou isso aconteceu. Nem por isso. A queda da URSS mostrou o derrube de um confronto velado, armado em ideias e em propagandas. Tal e qual como se proliferou para lá dos seus êxitos limítrofes.
O Médio Oriente. O que dizer dele? Será ele o palco de um terror provocado pela genética, ou pela feitura ambiental? Será recinto forjado de uma arena de gladiadores dispostos a entregar a vida pelas causas mais desmesuradas, pelas loucuras mais lunáticas, noticiadas como focos a serem arrasados, sem deixar raízes? Síria, Irão, Iraque, Egito, Afeganistão, Líbia, Israel, Palestina. Todos eles contaram com presenças alheias, destinadas a regular as peripécias mundiais, procurando uma paz pela guerra. Ninguém é Tolstoi neste conto de bruxas disfarçadas de fadas, especialmente no final espiritual e transmutador da vida deste. Imagine-se, autor de nacionalidade russa, nacionalidade partilhada com Estaline, Brejnev, Gorbachev, Putin. Sim, Vladimir Putin. Esse medonho autocrata, neutralizador de toda a oposição, ex-agente do KGB. O medo divide-se, fragmenta-se, e confronta-se em palanques alheios, onde são as armas as principais oradoras.
Tudo com vista a proteger a ordem do mundo. A ordem regulada pela desordem? As antíteses são flagrantes, em constantes diatribes com a sensibilidade apurada dos pensadores, dos tais que decidem navegar em águas profundas, mesmo que a comunicação se destine a arrasá-los, sem lhes prestar o devido apoio no equipamento de mergulho. São investigações feitas em campo, que não se ficam pelos laboratórios da manipulação das massas, em caldeiradas nas quais ninguém se apercebe que está submergido. Escalda sem saber como, nem porquê. As vozes levantam-se após os danos estarem feitos, após a refeição estar servida na mesa, a ser degustada por aqueles que assumem a comissão dos sentimentos e ressentimentos calcados pela diversidade e pela tolerância emergentes. Os direitos expandem-se, embora os deveres morais conheçam uma crise de valores. Os conservadores viam-se perdidos, até que os paladinos de uma verdade transmutada decidem apresentar o mundo como o veem. Não, isto não é arte. É a vida real. E que rica caldeira, não é verdade?
Voltemos a Trump. Afinal de contas, tudo está na órbita de Donald Trump, ora não fosse ele o vigente presidente da nação que se bradou liberal e independente. O país do progresso, do lucro, do sonho celebrizado e concretizado. Antes da realidade saltar cá para fora, o filtro norte-americano nunca se coibiu de lhe passar uma vista de olhos. Se as mãos interviram? Dizem-se coisas, especulam-se outras. O que é certo é que os factos saltam à vista, à boa maneira científica, com as fontes plenas e transparentes. Ou será que essas mesmas foram forjadas? Afinal, o que são os Estados Unidos da América? O que é e como foi Donald Trump parar onde está? O que é que o Eixo do Mal tem a ver com isto? Somos filhos do século XX? A genealogia não engana. A realidade dispõe-se para lá do que pensamos, do que sentimos, do que vemos. Expressa-se na artificialidade sistémica, onde a regulação não tem mão nem perna. E o que percebem disso os políticos? As corporações? Chamem-se os pensadores, os questionadores, os problematizadores. Chamem-se, também, aqueles que, isolados e imunes ao vício da associação à deturpação, clamam para que a realidade não celebre o Carnaval mais frequentemente do que este, realmente, é.
As questões torneiam pelo real. O mundo questiona-se, cada vez mais, porque, para além de meios, há desafios. O passado reinventa-se, entre olhares e perspetivares distintos, que louvam os heróis dos estardalhaços, e que repelem os vilões das conjeturas. Anormaliza-se uma normalização que os interesses movem, jogando o volante de um lado para o outro. A realidade complica-se, embora se facilite nessas novas posições facilitadas pela sensibilidade apurada para mexer com as chagas abertas e fendidas. O que é feito da verdade? Desconcertada, desconcentrada. Com que linhas é que se cose a História? Um ponto de cruz onde consta a parte e não o todo. Afinal, heróis ou vilões? Vidas ou mortes? Realidades ou fatalidades? Dia ou noite? Questões que não conseguimos amarrar, mas que conseguimos desenhar, no auge dos nossos sonhos, em que reivindicamos a acertada perceção. Somos e não somos mundo. Haverá normalidade para tamanha anormalidade?