Melhores álbuns internacionais de 2019 (até agora)
Escolhas da redacção da Comunidade Cultura e Arte.
Por esse mundo fora, todos os dias é lançada música nova. Seja numa conta mais tímida do Soundcloud ou Bandcamp, ou por artistas gigantes com direito a campanhas de marketing mundiais, o lançamento daquele álbum antecipado — ou de uma agradável surpresa — é um acontecimento que tem impacto na vida de todos os melómanos. Só entre os nossos colaboradores foram mencionados quase 50 álbuns diferentes por seis pessoas, o que revela que esta primeira metade de 2019 já nos traz razões de sobra para nos alegrarmos. Confere as escolhas da nossa redacção de dez álbuns que não podes perder:
“Sendo este o primeiro álbum que Pratt grava em estúdio, acaba por resultar de diferentes métodos e abordagens à composição e gravação de canções. Mas nem por isso perde o intimismo a que estamos habituados após os dois álbuns anteriores. A produção é mais polida, mas retém uma certa aura rústica, que aquece os ouvidos e a alma. É um bálsamo tranquilizante para o bulício dos dias e, tendo em conta os seus meros 27 minutos, apetece ouvir uma e outra vez. A simplicidade das melodias não lhes retira o impacto emocional e revela como Jessica Pratt consegue fazer algo tão bonito com poucas ferramentas. Quiet Signs é daqueles álbuns que ficam como o estandarte de uma certa disposição musical. Aqueles álbuns em que pensamos quando nos apetece ouvir algo que conjure um certo ambiente ou que coadune com aquilo que sentimos naquele momento. O momento fica a cargo do ouvinte; Jessica Pratt fornece a banda sonora.” – Bernardo Crastes
- Flying Lotus – Flamagra
Flamagra é mais do que um álbum; é um estado de espírito. O conceito é o fogo, pelo que o crepitar convidativo das chamas nos rodeia constantemente ao longo dos 27 rascunhos que Steven Ellison criou, sempre na senda do nicho sonoro que tem vindo a explorar — um jazz electrónico esquizofrénico que encontrou o seu pináculo em You’re Dead!. Neste follow-up, o que mais importa é a atmosfera que as canções criam — nesse aspecto, é um álbum único. Estas desenrolam-se como um incêndio lento a consumir um edifício recheado de ideias e pessoas — neste caso, um leque de convidados musicais invejável. A voz ríspida de George Clinton em “Burning Down the House”, o baixo timbrado do colaborador frequente Thundercat, a voz aveludada de Solange em “Land of Honey” ou até uma história perturbadora de David Lynch adicionam personalidade a uma obra que apenas pedia um pouco menos de receio de melodias viciantes. A longa duração e introspecção de algumas faixas faz Flamagra requerer especial atenção — que é totalmente merecida. – Bernardo Crastes
“Mais do que uma questão, WHEN WE ALL FALL ASLEEP, WHERE DO WE GO? é um convite, para um lugar subjectivo, e esse local inventado, bem real na psique de cada um, é o que a artista norte-americana nos convida a perscrutar ao longo de 14 temas de pop discretamente avassaladora, minimalista na sua construção e grande no sentimento que evoca. É o primeiro grande estrondo de uma artista que destila o seu imaginário num conjunto de temas por vezes emocionais, por vezes brincalhões, mas sempre com uma sonoridade distinta. É um sonho tornado música e estamos todos convidados para fechar os olhos e fugir para a terra adormecida onde Billie Eilish explode majestosamente.” – Miguel de Almeida Santos
- Big Thief – U.F.O.F.
U.F.O.F. é o terceiro álbum dos Big Thief e o primeiro acrónimo, acrónimo para “Unidentified Flying Object Friend”. É uma viagem íntima em busca de algo desconhecido, encontrando pelo meio bonitas melodias e arranjos vocais sussurrados misturados com guitarras acústicas que tanto podem ser abrasivas e cortantes como encantadoras e leves. É indie folk feito com letras de uma assustadora beleza e produzido por uma banda que sabe o que está a fazer, profissionais da sua criatividade. Ouvimos a angústia que assombra alguns dos momentos mais solenes da discografia de Bon Iver, mas também a vontade sonora que os Fleet Foxes nos dão de largar tudo e ir viver para a floresta. É um álbum potente e solitário, que soa como se tivesse sido gravado numa clareira de fantástica acústica da nossa nova casa. – Miguel de Almeida Santos
- Helado Negro – This is How You Smile
De regresso com o seu synth-folk cósmico, como lhe chama Eric Torres na Pitchfork, This is How You Smile é o sexto e melhor álbum de Helado Negro, nome artístico do americano Roberto Carlos Lange. Dançando entre o inglês e o espanhol, num misto de Devendra Banhart e Sufjan Stevens (com quem já colaborou diversas vezes), a voz doce de Roberto Carlos Lange acompanha melodias tão suaves e calmas que só nos apetece fechar os olhos, embalando-nos a nós mesmos para um universo onde tudo é harmonioso – Miguel Fernandes Duarte
- Little Simz – Grey Area
Grey Area é já o terceiro álbum de Little Simz, apesar da sua tenra idade de 25 anos. O timbre grave da sua voz e maturidade das canções acabam por nos confundir ainda mais relativamente à artista, que se tornou um dos nomes do hip hop britânico a ter em atenção com o lançamento deste álbum pintado a preto e branco. As letras são carregadas de crítica social, seja ela relativa à sua pátria ou ao patriarcado (como na fabulosa “Venom”, cuspida a um ritmo alucinante). A música tanto oscila entre baixos de peso (“Boss”) como sintetizadores mais coloridos (“101 FM”), mas é quase sempre convidativa, escolhendo pôr-se à margem das tendências actuais e atribuindo mais atenção a detalhes agradáveis (como o piano do single “Selfish”) e ao replay value para o ouvinte. – Bernardo Crastes
“O crescimento não só se reflecte nas letras, mas também na música, que sempre foi buscar influências a locais longínquos, mas de uma forma mais uniforme. Agora, parece concentrar tudo aquilo que a banda foi ouvindo e captando ao longo da sua vida e carreira. Toda esta variedade resulta num álbum riquíssimo — quer em histórias, sons ou sentimentos. Parece ser uma espécie de sinopse do crescimento da banda até agora, assim como uma pit stop antes de um novo futuro, ao qual os fãs ainda terão de se habituar. Cada um terá o seu ritmo, mas, canção a canção, este Father of the Bride certamente conquistará a sua audiência.” – Bernardo Crastes
“O título já prometia. A capa do álbum também. Felizmente a música — o que realmente interessa — veio confirmá-lo. Após o lançamento dos primeiros singles, passou a esperar-se qualquer coisa de especial. E é verdade: temos um novo épico da pop alternativa, numa sonoridade que, à semelhança dos seus anteriores trabalhos (mas aqui elevado a um expoente de qualidade muito mais apurado) cruza o barroco com o progressivo. Titanic Rising está repleto de pormenores e passagens ricas — mas, igualmente importante, tem um sabor a todo, a inteiro; é uma proposta coesa e diversa, um hino. De tempos a tempos lá surge uma obra assim. Proposta: vamos juntar este navio ressuscitado ao cânone do que não queremos deixar de ouvir, e do que não queremos esquecer.” – Tiago Mendes
“Um encontro. Foi por meio de um encontro que James Blake se encontrou. O músico inglês que ao longo desta década cruzou os caminhos da electrónica, da pop e do R&B, sempre espelhou no seu som o aperto e a claustrofobia de emoções emaranhadas, frequentemente contidas; sons pintados de dúvidas, desilusões, incapacidades e lugares escuros. Um percurso que ao fim de três álbuns nos apertava o peito — com muita beleza à mistura. Em Assume Form mostra testemunhos líricos poderosos de alguém que ultrapassou uma fase muito difícil e, graças a um encontro, saiu por cima. Há muitos palcos possíveis para palavras tão bonitas — a música é um deles, e James Blake compôs neste álbum um manifesto admirável de luz e esperança. Um trabalho que vive no limbo entre o material e o transcendente, entre a sensação e o pensamento. É difícil ficar-se indiferente à beleza.” – Tiago Mendes
“Um longo contínuo sonoro povoado de 808s e dos sintetizadores a que Tyler nos vem habituando, Igor é um álbum muito mais conduzido pelo instrumental, com a voz de Tyler a aparecer apenas ocasionalmente, cantando quase sempre com alterações de tom, raramente na sua expressão normal. Com uma produção por vezes muito crua, recheada de distorção no baixo, mas, ao mesmo tempo, muito quente, é um álbum mais dançável, cheio de groove. Fica evidente a posição de Tyler, The Creator no panorama musical actual, capaz de suceder o já surpreendente Flower Boy com uma nova direcção e um álbum tão sonicamente inovador e de paisagem sonora incrivelmente coesa e entusiasmante. Pode não ser o Tyler que tínhamos ouvido até agora, mas tudo aqui é inegavelmente seu. Talvez só o rap tenha ficado um pouco ausente, mas, depois de ouvir Igor, quem quererá realmente queixar-se disso?” – Miguel Fernandes Duarte