“O Velho e o Mar”, de Ernest Hemingway: um magnífico exercício sobre resiliência e superação
Este artigo pode conter spoilers.
Este pequeno livro da autoria do Nobel da Literatura de 1954 foi escrito no ano de 1951 e publicado em 1952, a título de curiosidade, foi escrito em Cuba e este facto inspirou o contexto e a estética desta história, pois: o autor Americano viveu na ilha um pouco mais de um terço da sua vida, cerca de vinte anos. Considero que esta é uma obra imprescindível para quem gosta de divagar pelos clássicos da literatura (e verificar porque o são), é também uma ótima introdução à escrita de um dos mais conceituados escritores do século XX.
O escritor português Jorge de Sena (1919-1978) traduziu esta história de Hemingway, sendo o prefácio da sua autoria e afirma rendido ao talento da prosa: “Ante uma obra como esta — da mais alta qualidade artística e da mais nobre categoria ética — um obra que nos eleva à contemplação da dignidade do homem e do mundo em que é um ser pensante, através da mais avassaladora singeleza: devemos curvar-nos gratamente e fazer votos porque, numa tradução que procurei fosse escrupulosa e fiel, pouco se tenha perdido de tão pura obra-prima, do seu poder encantatório, da sua frescura narrativa”, pode ler-se em “O Velho e o Mar”, de Ernest Hemingway.
A personagem central da história é Santiago, um velho pescador de Cuba que se encontra numa sequência de 84 dias sem pescar um único peixe no Golfo do México. Ao 85º dia, e instigado pelo jovem Manolim, regressa ao mar no seu pequeno barco e depara-se com um gigantesco Marlim na sua linha de pesca. Este encontro dá início a um intenso embate entre o velho pescador e este descomunal espécime, através de uma sequência narrativa com voltas e reviravoltas que nos prendem à luta solitária deste homem contra a natureza (e que serve de teste às suas virtudes e limitações).
“O peixe aproximava-se na sua volta, calmo e belo à vista, apenas movendo a grande cauda. O velho puxou-o quanto pôde, para o trazer para mais perto. Por um instante, o peixe deitou-se um pouco de lado. Logo se endireitou e principiou outra volta. — Fi-lo mexer! — exclamou o velho. — E é que fiz. Sentiu-se de novo a desmaiar, mas segurou no grande peixe com quanta força pôde. «Mexi-o», pensou. «Talvez que desta vez o apanhe. Puxem, mãos. Aguentem, pernas. Cabeça, não me falhes. Não me falhes. Nunca me falhaste. Desta vez, apanho-o.»”
“O Velho e o Mar”, de Ernest Hemingway
Quando Santiago finalmente derrota o enorme peixe, com pouco ou nada a fazer, vê a sua conquista ser atacada por diversos tubarões. Esta reviravolta inglória (entre outras) demonstra o quão efémera pode ser a vitória, mesmo após uma conquista de grande empenho e sacrifício.
“O Velho e o Mar” é um magnífico exercício literário sobre resiliência ou superação face à adversidade que, no meu caso em particular, alimentou a paixão pelos livros começando na minha infância. É uma daquelas histórias marcantes que faço questão de recomendar a toda a gente. Das que se devoram e degustam de forma intensa, que podemos e devemos ler (e reler) em diferentes fases da nossa vida, originando assim renovadas reflexões a cada nova leitura. Ernest Hemingway produz uma história simples na sua génese, mas complexa na profundidade da sua mensagem, que nos transporta de forma vívida para aquele barco na escura imensidão do mar, da solidão da vida.