Oito filmes para ver no LEFFEST. Festival acontece este mês

por Miguel Rico,    22 Outubro, 2022
Oito filmes para ver no LEFFEST. Festival acontece este mês
“White Noise” (2022), de Noah Baumbach / Fotografia de Wilson Webb – Netflix
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Está de regresso o LEFFEST – Lisboa & Sintra Film Festival, um dos maiores festivais de cinema nacionais, que decorrerá entre os dias 10 e 20 de novembro. A programação conta e promove, como é costume, o contacto entre cineastas (e não só), muitos deles de renome internacional, e cinéfilos. 

O evento encontra-se repleto de bons e variados filmes e secções, a acrescer aos filmes em competição, fora dela, retrospetivas ao movimento L.A. Rebellion e ao trabalho de Sérgio Tréfaut e Jim Carrey, existe ainda um programa especial, “Romper as Grades”, que procura aproximar o público das realidades vividas nos estabelecimentos prisionais. Somam-se as sessões especiais do evento que contam com grandes nomes da sétima arte: David Cronenberg, Olivier Assayas, Alicia Vinkander, John Malkovich, Bella Freud, Rául Ruiz, Dominiqye Gibzalez-Foerster e Ange Leccia. É, ainda, possível realizar dois workshops sobre direção de atores, com o realizador Cristi Puiu, e assistir a concertos de Archie Shepp 4Tet, Dino d’Santiago, às atuações de Olga Rorirz & Corpoemcadeia ou à peça The Infamous Ramirez Hoffman, com John Malkovich, a partir de textos de Roberto Bolaño.

Entre todas as possibilidades, de um programa ao qual aconselhamos vivamente a consulta, selecionámos seis sugestões de filmes que prometem enriquecer o roteiro desta 16ª edição do LEFFEST- Lisboa & Sintra Film Festival. 

Crimes do Futuro (2022), de David Cronenberg

A metamorfose da anatomia humana por intervenção de tecnologia distópica não é uma novidade temática nos filmes de David Cronenberg, autor de películas como A Mosca (1986), Cosmopólis (2012) e eXistenZ (1999). Desta vez, Cronenberg apresenta-se no Leffest’22 para uma exibição e discussão do seu mais recente filme, Crimes do Futuro, que promete reinscrever-se na temática. Embora o realizador tenha estreado, em 1970, uma curta-metragem homónima, os filmes não se encontram, em qualquer medida, relacionados. 

Crimes do Futuro (2022) fala-nos sobre Saul Tenser, conceituado artista de artes performativas, que faz do seu corpo rocha sedimentar à escultura da sua própria fisiologia por alteração da sua constituição biológica. Enquanto Tenser abraça o transhumanismo, com todas as suas potencialidades, e germina, inclusivamente, novos órgãos internos, que procura retirar em cirurgia, potenciando o espetáculo, com a ajuda do seu companheiro, Caprice, as forças do antagonismo procuram policiar estas práticas. 

Cronenberg, génio absoluto e invicto da ficção científica, promete transportar-nos a um futuro que começa a insinuar-se, onde a matéria humana se molda e funde ao sintético e o surreal se transplanta ao espetáculo do quotidiano. 

A Noiva (2022), de Sérgio Tréfaut

A Noiva é o mais recente filme de Sérgio Tréfaut, começou por ser idealizado há cerca de uma década enquanto documentário e conta-nos a história de Umm Mohammed, interpretada por Joana Bernardo, uma adolescente europeia, de nome real, Barbara, que abandona a sua casa no ocidente para casar com um guerrilheiro do Daesh. Passados três anos tudo mudou, é mãe de duas crianças e está novamente grávida, encontra-se num campo de prisioneiros no Iraque, é viúva e será julgada pelos tribunais iraquianos. 

Nascido na cidade de São Paulo, no Brasil, Tréfaut tornou-se numa figura habitual dos grandes festivais de cinema, os seus filmes deslumbram pela aproximação ao real e fascinam pela pertinência sempre tão atual das temáticas.

Paulo Branco, célebre produtor português e diretor do LEFFEST, é também um dos distribuidores de A Noiva, filme que estreou na Seleção Oficial do Festival de Veneza, secção Orizzonti, e será uma das exibições desta 16ª edição, numa retrospetiva inteiramente dedicada à obra do realizador brasileiro. 

White Noise (2022), Noah Baumbach

Noah Baumbach é um nome familiar de Hollywood, a sua obra insere-se num subgénero não tão popular, o mumblecore, cujo mote central é abordar narrativas pessoais e tramas íntimas através de diálogos e performances naturais, mais próximas da realidade quanto possível.

Depois de sucessos como A Lula e a Baleia (2005), Um Peixe fora de Água (2004), Os Meyerowitz: Família Não se Escolhe (2017) e Marriage Story (2019), Baumbach traz-nos White Noise, um filme de humor negro e ficção pós-apocalíptica que reúne no elenco nomes como Adam Driver, Greta Gerwig, Raffey Cassidy, André 3000 e Don Cheadle. 

Adaptado do romance homónimo de Don DeLillo, White Noise traz-nos a história de Jack Gladney (Adam Driver), um professor universitário que, juntamente com a sua família, é forçado a sair da cidade onde vive quando um cataclismo provocado por um acidente químico assola a sua cidade.  

Em Busca da Verdade (1961), de Ingmar Bergman

Falando em peritos de altercações conjugais, Bergman é sempre uma figura a revisitar, e, quem o pretende, pode fazê-lo no LEFFEST’22 através do Ciclo “Sou Culpado?”, com o clássico Em Busca pela Verdade

Dizia-me, não há tempo, a poeta e dramaturga Maria Quintans que o que a fascinava verdadeiramente em Bergman era simplicidade que com que este nos “rasga a alma”. Concordo, Bergman é um realizador que se intrusa nos confins da nossa humanidade, sem permissão ou piedade e Em Busca pela Verdade não prova o contrário. 

Este “filme de câmara” apresenta-nos Karin (Harriet Andersson), que se batalha com a sua saúde mental durante umas férias na ilha de Fårö, na suécia, passadas com a tríade de homens na sua vida, marido (Max von Sydow), pai (Gunnar Björnstrand) e irmão (Lars Passgård). É um drama psicológico poderosíssimo que nos fala, sobretudo, de relações humanas, interdependência e saúde mental.

É um dos filmes mais místicos do realizador sueco e constitui um verdadeiro ensaio sobre crença, religião, psicologia e relações familiares. Uma obra que vale a pena recordar mesmo para o público já familiarizado, pois a obra de Bergman reaprende-se a cada exibição, reajusta-se aos tempos, aos locais e às pessoas, é eterna e apátrida.

Fugiu um Condenado à Morte (1956), Robert Bresson 

A estória tem lugar em Lyon, 1943, onde Fontaine (François Leterrier), membro da resistência, é detido pelas tropas alemãs, encarcerado e condenado à morte. Enquanto aguarda o último fado, Fontaine prepara a sua fuga e mesmo antes de começar a executar o plano, conhece Jost (Charles Le Clainche), conta-lhe o seu plano e ambos escapam de uma prisão conhecida por ser “inescapável”. 

“Fugiu um Condenado à Morte”, de título original Un condamné à mort s’est échappé, é a quarta longa-metragem do mítico cineasta Robert Bresson. O filme é particularmente relevante pelo uso que faz da linguagem audiovisual. 

O narrador, Fontaine, vai contando a história através de voz-off, no entanto, ao invés de se encontrar justaposta à ação das imagens, surge ligeiramente descontinuada ou antecipada e constituiu um elemento-chave que orienta a perceção do espectador de cena em cena. Este clássico é uma película onde o som é um autêntico domador da imagem.

Master Gardner (2022), Paul Schrader

Neste thriller de Paul Schrader, Joel Edgerton interpreta Narvel Roth, um jardineiro escrupuloso que trabalha para Sra. Haverhill (Sigourney Weaver), viúva de grandes posses e dona de uma grande propriedade, que lhe exige que acolha a sua irreverente sobrinha-neta, Maya (Quintessa Swindell), para que aprenda o ofício da jardinagem, o contacto com a jovem faz com que Edgerton regresse ao seu passado violento. 

Peter Bradshaw, crítico de cinema no The Guardian, descreveu o filme como “se Manoel de Oliveira realizasse um thriller policial, seria isto”, e ainda que com um toque de ceticíssimo, foi o suficiente para me despertar o interesse. 

Paul Schrader coescreveu, a par com Martin Scorcese, filmes como A Última Tentação de Cristo (1998), Touro Enraivecido (1980) e Taxi Driver (1976). Tem vindo a realizar filmes bastante aclamados e antecipados como Cães Selvagens (2016), No Coração da Escuridão (2017) e O Contador de Cartas (2021).  É adepto e connoisseur do transcendental style, tema que em tem vindo a moldar-se às suas obras e sobre o qual tem vindo a escrever e palestrar.

The Whale, de Darren Aronofsky

Darren Aronofksy, lenda do cinema contemporâneo e realizador de títulos como Pi (1998), Black Swan (2010), The Wrestler (2008) e Requeim for a Dream (2000), regressa agora com The Whale, uma adaptação da peça homónima escrita por Samuel D. Hunter. 

O filme tem como protagonista Charlie (Brendan Fraser), um professor de inglês de meia-idade, que se encontra num estado de obesidade grave, consequência de binge eating, e que agora procura reatar a relação com a sua filha adolescência. 

Existe um destaque particularmente relevante à aparência de Charlie, o trabalho de maquilhagem e de prostéticas demorava cerca de 4 horas diárias para acrescentar à volta de 130 kg a Fraser. Assim, a acrescer ao meticuloso trabalho de caracterização, soma-se uma performance que promete um regresso inesquecível de um ator que esteve parado pelo menos 12 anos. 

As expectativas para The Whale são altas, um retrato de crua realidade e autenticidade, com temáticas de enredo pertinentes e atuais e só Aronofksy, em parceria com a produtora A24, para fazê-lo sem tons paternalistas ou corretivos. 

Com estreia no Festival Internacional de Veneza, galardoado com prémios como o Golden Lion e o Interfilm Award,The Whale será no exibido nesta edição do LEFFEST  no Teatro Tivoli BBVA, dia 16 de Novembro, às 21h30, completando assim a Seleção Oficial Fora de Competição.

The Fablemans, Steven Spielberg

‘The Fablemans’ marca o regresso de Steven Spielberg que se alia, novamente, ao argumentista Tony Kushner para trazer uma carta de amor ao cinema. O filme conta-nos a história de Sammy Fabelman (Gabriel LaBelle), um jovem que se apaixona pela sétima-arte depois de assistir a uma sessão do clássico ‘The Greatest Show on Earth’ (1952) e se dedica a fazer pequenos filmes caseiros para animar a sua mãe, Mitzi (Michelle Williams). Após descobrir um surpreendente segredo de família, Sammy recorre ao cinema para assimilar e compreender a sua realidade e das pessoas que o rodeiam. 

O enredo, como os cinéfilos mais experimentados podem confirmar pelo trailer, é parcialmente autobiográfico. Durante as rodagens de Munique (2005), Spielberg contou a sua história de vida a Kusner, que lhe garantiu “Someday you’re going to have to make a film about this”.  Em 2019, ainda durante as filmagens do novo West Side Story (2021), a dupla terminou a escrita do argumento em cerca de dois meses. 

O filme foi o grande vencedor do Festival de Cinema de Toronto (TIFF) 2022 e estará em exibição no LEFFEST no teatro Tivoli BBVA, dia 13 (Domingo), às 17h, para quem pretender viajar até à infância do realizador que tanto trouxe à nossa juventude.

As sessões desta 16º edição do LEFFEST – Lisboa & Sintra Film Festival decorrerão nas salas do Cinema Nimas e Teatro Tivoli BBVA, em Lisboa, e no Centro Cultural Olga Cadaval e MU.SA- Museu de Artes, em Sintra.  

Este artigo tinha inicialmente seis filmes. No entanto, e com o anúncio de mais estreias, foram acrescentados dois filmes.

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