Que futuro(s) para o SNS?
É inquestionável que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) permanece um dos garantes mais robustos da democracia, pela defesa da coesão social, consubstanciada no acesso universal e tendencialmente gratuito. À medida que o país e o mundo mudam, torna-se essencial que as organizações de saúde acompanhem essa evolução. Para isso, é importante que, apesar das dificuldades de curto e longo prazo, haja uma visão de governança do SNS que encare o futuro de modo construtivo e otimista. Para tal, é fulcral que se debata, em Portugal, quais as tendências que marcarão a saúde nos próximos anos e quais as que deverão ser incorporadas na arquitetura do SNS. Os cidadãos contam com instituições de saúde modernas, com otimização dos outcomes em saúde, esperando um sistema que use tecnologias emergentes e inovadoras.
Acredito que existam 5 tendências que serão importantes de acompanhar. É preciso repensar a Saúde à luz da revolução no Digital. Para isso, é importante defender maior cobertura de teleconsultas, investimento de dispositivos de monitorização à distância e disponibilização de tratamentos em regime de domiciliação, com enfoque na disponibilização de terapias digitais, em áreas como a psiquiatria ou a neurologia. Por outro lado, é hoje consensual que os doentes respondem ao tratamento em função da sua variabilidade genética, hábitos adotados e estilos de vida. Desta forma, é perentório desenhar abordagens focadas no que define o cidadão: contingências genómicas, epigenéticas e clínicas, aliadas a contextos psicossociais. Tal é conseguido pela incorporação de práticas de Medicina de Precisão, através da redefinição das políticas de saúde e de um acesso mais transparente e facilitado a dados. Adicionalmente, com a contribuição das doenças crónicas e o envelhecimento populacional na aceleração dos novos modos de prestação de cuidados, é fulcral que se estabeleça, em linha com a Medicina de Precisão e a Transição digital, um modelo de Cuidados Centrados no Doente. Um modelo que deve ser estabelecido através da articulação de smart homes com hospitais e com uma aposta na literacia digital dos próprios profissionais de saúde.
De igual modo, é necessário que as mudanças se acompanhem de esforço para a redução de disparidades socioeconómicas. O SNS deverá ser um agente promotor de sustentabilidade social, climática e de modelos de governação, com a criação de programas que se debrucem sobre equidade no acesso a cuidados de saúde, com aumento do acesso a cuidados a grupos populacionais em risco e com implementação de políticas de contratação inclusiva em conselhos de administração, de ética, de compliance e anti-fraude.
Por fim, é importante repensar o modelo de financiamento vigente, nomeadamente ao nível dos regimes de comparticipação: existem, atualmente, ferramentas de saúde digital, nomeadamente as mobile apps, validadas cientificamente, que poderão passar a ser comparticipadas, impulsionando uma tipologia de cuidados mais acessível e deslocalizada. O SNS deve defender um regulamento que permite que terapêuticas digitais possam ser prescritas por médicos, nos mesmos parâmetros em que as terapêuticas convencionais — nomeadamente farmacológicas — são prescritas.
A modernização do SNS deverá configurar um dos eixos estratégicos fundamentais por parte de quem planeia a direção que irá tomar, nos anos vindouros. Para que os melhores cuidados estejam sempre disponíveis (sobretudo quando mais nenhuma instituição queira suportar os custos) e para que sejam acompanhados, sempre que possível, com níveis acrescidos de eficiência e satisfação dos utentes.