‘Ready Player One’ oferece-nos um fantástico e bem concebido objecto de entretenimento visual
Até se poder partir desconfiado para Ready Player One: Jogador 1 – foi o meu caso – antecipava uma proposta de aventura virtual direcionada para um target juvenil mas com perfil para agradar a todos. Naturalmente, embalado pelas inevitáveis referências retro aliadas a um novelo de efeitos especiais de encher o olho. Nada de novo, sempre assim foi. De óculos 3D no nariz em vez dos VR propostos no filme, lá avançámos, eu e o meu Lucas de 11 anos. E depressa confirmamos essas expectativas, embora percebendo como está intacto o grau de saúde da sua capacidade para nos encantar nos universos de imaginação que recria.
Embarquei então nesta delirante viagem virtual, a invocar em cada um de nós a nostalgia e o encantamento pela descoberta do entretenimento eletrónico. Claro que Spielberg parte do romance geek de Ernest Cline, um autor muito marcado pela cultura gamer mais retro, para chegar ao ambiente do cinema pop dos loucos anos 80, embora deixando no ar o apelo a uma mensagem de lucidez no meio de um certo absolutismo, ou escapismo, de entretenimento. Bem vindos então à vulgarização das experiências VR convertidas numa espécie de novela alternativa em que a realidade pardacenta é substituída por todos os excessos visuais que a mente humana pode conceber.
Mais do que criar algo novo, Ready Player One: Jogador 1 possibilita-nos esse embrenhar num universo de entretenimento comunitário. Afinal de contas, o Oasis, esse espaço de ampla escolha virtual, não passa de uma variante do que foi a experiência Second Life, em que cada um podia ser quem quisesse, embora aqui no formato mais atual dos MMO (massive multiplayer online), permitindo assim essa possibilidade narrativa, algures próxima de uma visão orwelliana, ou uma matrix cibernética. É neste universo, seguramente familiar à esmagadora maioria dos adolescentes de hoje, oferecido por James Halliday (em mais uma incrível recriação de Mark Rylance), um eterno menino, algures num cruzamento entre Bill Gates e o próprio Spielberg, num desafio póstumo à comunidade global de sugerir a possibilidade de encontrar um ‘Easter Egg’ que permitirá ao vencedor tomar controlo do Oasis e da companhia que o criou.
Desenham-se assim um grupo de personagens juvenis à procura desse Eldorado cibernético. Mesmo sem ser totalmente original, Ready Player One: Jogador 1 funciona na plenitude ao oferecer-nos um fantástico e muito bem concebido objeto de entretenimento visual. No qual se diverte a colocar diversas ‘tags’ de referências da cultura popular que as gerações mais jovens possam absorver e os mais maduros reconhecer com gosto. Assim vão as diversas referências de jogos de antanho (a começar em Space Invaders), bem como a cultura de cinema, em que o conceito temporal de Regresso ao Futuro é aproveitado para esta invocação da memória, em que os gloriosos e muito pop anos 80 têm um destaque natural. É nesse playground que Spielberg se deleita, inclusive com a ousadia de recriar um mundo alternativo ao The Shining de Kubrick. Ora, foi nessa sugestão de permanente encanto que o Avatar de James Cameron falhou redondamente – pois tudo técnica e nada história.
Se pensarmos bem, tem sido a criação destes pequenos mundos fantásticos que tem funcionado o seu cinema. Arrisco mesmo a dizer desde o ‘perdido’ Firelight, a sua primeira experiência no cinema, em 1964. No fundo, indícios que detetamos nos ambientes únicos de Indiana Jones, Jurassic Park, Tintin, A.I., Relatório Minoritário… You name it.
É claro que no final desta exuberante e convincente experiência e realidade virtual, uma gadget que está apenas a dar os seus primeiros passos, o filme tinha de nos deixar a piscadela de olho pedagógica, e dizer mesmo – a realidade é a única coisa que é real, como que a confirmar que existem outros conteúdos que valem a pena para além de queimar pestanas diante dos monitores. No final, percebi saí mas do que convencido.
Artigo escrito por Paulo Portugal em parceria com Insider.pt