“The Architect”: a série estilo “Black Mirror” sobre a crise da habitação
Este artigo pode conter spoilers.
De nome original “Arkitekten”, “The Architect” é uma série norueguesa estilo “Black Mirror” de quatro episódios com aproximadamente vinte minutos cada que está disponível na plataforma Filmin. Esta ficção (não tão) especulativa, transporta-nos para uma Oslo constringida, futurista, sem carros, onde se tem de consumir para usufruir do espaço “público” e onde os empréstimos bancários são demasiado difíceis de suportar e a crise habitacional leva pessoas com rendimentos acima da média a viver em parques de estacionamento.
A curta duração dos episódios poderia à partida ser uma crítica negativa a apontar, mas seria injusto fazê-lo. É, outrossim, interessante analisar o que a série nos consegue mostrar e transmitir em tão pouco tempo sobre esta “distopia” tão real aos dias de hoje, demonstrando assim toda a mestria da realizadora Kerren Lumer-Klabbers, premiada na Berlinale de 2023 por esta série.
A balança social em perspectiva e os valores humanos postos em causa num mundo cada vez mais focado no “eu” e não na sua inserção em sociedade e onde o sucesso profissional se sobrepõe a tudo e a todos são alguns dos tópicos levemente mas também certeiramente trazidos por este verdadeiro tesouro norueguês onde acompanhamos a actriz Eili Harboe (também conhecida pela sua aparição na série “Succession”), aqui como Julie, uma recém formada arquitecta destinada a não passar de estagiária.
Uma verdadeira roda dos ratos onde tantas pessoas hoje se encontram presas individualmente mas sempre em competição com os seus pares. Como diz a crítica do The Wall Street Journal de forma absolutamente certeira “quanto menos uma ficção especulativa tem de especular, mais perturbadora se torna“.
Releva-se ainda da série o debate “arte vs utilidade”, das idealizações arquitectónicas industriais e frias na busca de uma solução para a crise habitacional. Uma Oslo pouco simpática e acolhedora, assim potenciada pela ausência de cores quentes na fotografia da série.
Trata-se de um piscar de olho a vários tópicos que afectam as gerações actuais numa série que, apesar da sua curta duração, consegue ser brilhante na forma como nos traz um conceito que parece tão absurdo quanto real e num contexto tanto distópico como actual e familiar. “The Architect” é um must see que junta a crítica social a um humor nórdico sempre “cinzento” mas certeiro que nos faz rir de tristeza de nós mesmos.