‘Timbuktu’ um filme ficcionado que mais parece um documentário

por João Estróia Vieira,    24 Agosto, 2016
‘Timbuktu’ um filme ficcionado que mais parece um documentário
“Timbuktu”, filme de Abderrahmane Sissako

Nomeado ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2015, ‘Timbuktu’ de Abderrahmane Sissako é figura habitual e proeminente nas listas de melhores filmes deste ano, é tão actual ao ponto de ser facilmente confundível com um documentário, como de resto nos parece ser o objectivo. É ficção, mas não é.

‘Timbuktu’ é, antes de mais, um filme que balanceia gentilmente entre a opressão e a esperança mostrando propositadamente a harmonia que existe entre os dois lados e trazendo até certo ponto um lado humano aos radicais. Uma oposição constante entre a tranquilidade das paisagens e a repressão a que os seres vivos que lá habitam são submetidos por parte da ocupação jihadista na cidade do Mali.

As imagens de perseguições a gazelas, de AK-47 na mão, não são inocentes. Os predadores são facilmente identificáveis, e as presas também. Os predadores de espírito e de liberdade através do uso de restrições impostas por leis fictícias e teocráticas, parcas em fundamento mas emanadas de um fundamentalismo islâmico sufocante aos habitantes de uma cidade histórica que se vê proibida de ser feliz, de tocar música, de jogar futebol. Se vê, portanto, proibida do espírito tribal e livre que a identifica, ou identificou outrora.

Num drama que gira à volta da morte de uma vaca chamada “GPS” — nome irónico num país que perdeu também ele o rumo ou qualquer resquício de orientação — surge uma série de acontecimentos que nos guiarão em toda a trama mostrando a afectação que “tribunais” e “autoridades” (que não o são) exercem poder à base da força e do medo sobre os habitantes da região, sobretudo as mulheres.

Com alguns momentos visuais impressionantes como um rio ou as paisagens maioritariamente áridas mas nem por isso desprovidas de uma beleza natural assinalável, Timbuktu é muito mais que o visual, aliás, coloca-o em segundo plano. Aqui o filme obriga-nos a uma reflexão à situação do Mali e a uma brutalidade que provém de um fundamentalismo que está longe de estar geograficamente circunscrita ao país e muito menos à cidade onde se passa todo o filme.

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