Uma lista de 10 especiais de stand-up da Netflix para chorar a rir, ou rir a chorar
A chegada da Netflix, potenciou, não só novas formas de consumo, como novos formatos e novos tipos de conteúdos. Exemplo disso é a aposta desta plataforma de streaming em humor, principalmente em especiais de stand-up. Há uns anos atrás não os víamos com tanta frequência, fosse por falta de acesso, fosse porque nenhum algoritmo nos sugeria, ou simplesmente porque não existiam assim tantos. Como fã de humor, isto devia ser vantajoso para mim, mas, se por um lado é óptimo ter acesso a estes conteúdos, por outro, torna-se um problema quando os consumimos compulsivamente. Acontece que, no último bimestre, vi mais de 20 especiais de stand-up comedy. Para além daqueles que já tinha visto anteriormente, claro. Posto isto, decidi reunir numa lista de 10 desses espectáculos, que mais me surpreenderam pela positiva:
“Humanity” de Ricky Gervais (2018)
Desde o espectáculo “Science”, de 2010, que Ricky Gervais não fazia um tour de stand-up. Oito anos depois, volta a mostrar a razão pela qual é um dos mais famosos no meio. Humanity flui como uma conversa, na qual Gervais satiriza temas pessoais como a sua riqueza, o seu sentido de humor e polémicas com piadas suas, sempre com humor de observação que nos habituou. Achei que me ia desiludir, no entanto, aconteceu o contrário.
“Afraid of the Dark” de Trevor Noah (2017)
Embora o seu espectáculo mais recente, “Son of Patricia”, também esteja bem conseguido – na minha opinião – decidi optar por este. Noah tem uma capacidade excelente de fazer uma espécie de “clean comedy” e mesmo assim ser extremamente eficaz a arrancar reacções da plateia. Politica, culturas, idiossincrasias e linguagem são os pontos principais do seu humor, que desconstrói e satiriza – também fisicamente – recorrendo muitas vezes às suas experiências pessoais.
“This is Me Now” de Jim Jefferies (2018)
Não era um apreciador de Jim Jefferies, admito. Nunca sequer lhe tinha dado muita atenção, para além de alguns vídeos no Youtube e meio “Freedumb”. Mas conquistou-me com este último especial de stand-up, que me fez ver com outra lente o que tinha feito para trás. O estilo pode não agradar a todos. Num tipo de personagem aparentemente de embriagado, Jefferies consegue falar das suas histórias, dos seus problemas actuais como a depressão e das suas alegadas “opiniões” depreciativas do que o rodeia, sempre sincronizado com o público.
“America is the Greatest Country of the United States” de Judah Friedlander (2017)
Com um estilo de humor “Deadpan”, Judah interpreta um personagem – do qual nunca sai – que não só é completamente “pró-América”, como também é “World Champion” de tudo. Filmado a preto e branco e sem artifícios, neste especial não é preciso mais nada a não ser a qualidade do texto de Judah e da sua interpretação. Para além disso, tem uma capacidade excelente de improviso, da qual usufrui de forma continua.
“Repertoire” de James Acaster (2018)
Digamos que estou a contornar as regras. É que “Repertoire” não é um só especial, mas sim uma série de quatro. Acaster assume uma postura de lunático e uma indumentária que normalmente condiz com a cor da cortina atrás dele. É difícil defini-lo num estilo, mas talvez seja suficiente dizer que foi nomeado cinco vezes para melhor espectáculo no maior festival de comédia do mundo: O Fringe de Edimburgo. Vi os quatro em maratona e surpreendeu-me a precisão de planeamento do texto, o timing e as técnicas humorísticas do guião.
“Daniel Sloss Live Shows” de Daniel Sloss (2018)
Não um, mas um par de espectáculos. Todos os humoristas desta lista têm nos seus espectáculos conteúdos reflexivos e pessoais, emaranhados numa teia de humor. Daniel Sloss leva isso ao extremo. Dá-nos detalhes explícitos de eventos pessoais dele e joga com isso. Deixa-nos desconfortáveis com as suas opiniões, que muitas vezes causam momentos de tensão, mas que ele corta com primazia, quando lhe apetece. É talvez aquele que me surpreendeu mais desta lista.
“3 Mics” de Neal Brennan (2017)
É co-criador do “Chappelle’s Show”, participa e escreve no Daily Show e, para além de imensas outras coisas, também está envolvido no “Comedians of the World”. Nos bastidores era aclamado por nomes grandes do humor internacional. Desta vez, foi ele a dar a cara. “3 Mics” tem um formato simples, mas muito bem conseguido. Num microfone diz “one-liners”, noutro é uma espécie de “Ribaldry” e humor negro, e noutro, faz-nos confissões extremamente pessoais e que nos deixam introspectivos. As transições entre estes três momentos jogam com as emoções do público, que alterna entre a compaixão, o choque e o riso. É um dos melhores especiais de humor que vi.
“The Overthinker” de Demetri Martin (2018)
Qualquer “overthinker” se vai identificar com este espectáculo. Um humor mordaz e inteligente, interpretado com uma postura muito calma por parte de Demetri. Ou pelo menos é o que aparenta. Isto porque, a voz-off – que é a voz de Demetri – vai narrando os seus pensamentos para nos mostrar como realmente pensa demais. Acompanha o texto com guitarra (em “one-liners”) e usa desenhos dele para ilustrar certas ideias. Numa linha meta-discursiva, é um especial que, com simplicidade de produção, conseguiu um excelente resultado.
“Make Happy” de Bo Burnham (2016)
Um dos novos humoristas preferidos do nosso Ricardo Araújo Pereira. O especial de Bo não é só um espectáculo de humor. É um musical, uma performance teatral e uma espécie de “happening”, mas com momentos pensados e planeados ao pormenor. É completamente imprevisível e é, desta lista, aquele que mais tirou partido dos efeitos audiovisuais e da realização cénica do espectáculo.
“Man on Fire” de Chris D’Elia (2017)
Embora não seja esse o motivo da escolha, o nome do espectáculo faz jus ao humorista em si. É que Chris D’Elia é eléctrico. O espectáculo tem um ritmo acelerado, porque ele próprio é assim, completamente hiperactivo. Com um tom depreciativo e com uma interpretação muito visual, Chris retrata através da sua “perspectiva”, eventos da vida de um homem de 36 anos. Admito que não conhecia e fiquei principalmente a gostar da energia em palco.
Menção Honrosa:
“Nanette” de Hannah Gadsby
Se nos rimos durante o especial? Claro. Mas, na minha opinião, “Nanette” distancia-se um pouco dos espectáculos de humor actuais. Embora todos tenham várias nuances de caráter pessoal, este assume demasiado esse formato. É demasiado pessoal. É um manifesto em grito por parte da humorista. Aborda temas sensíveis nos quais Hannah se expõe ao mundo. É inteligente, engraçado e comovente. Quem ainda não viu, que veja. Mas preparem-se para algo além do humor.
Claro que faltam nomes como Louis C.K., Bill Burr, Dave Chappelle, Anthony Jeselnik, Jimmy Carr, Seinfeld, Ellen DeGeneres, John Mulaney, Tig Notaro, Sarah Silverman ou Ali Wong (entre outros). Todos estes lançaram recentemente excelentes espectáculos na Netflix. Contudo, trata-se de uma lista de sugestões pessoal, influenciada não só pela minha perspectiva do trabalho dos humoristas, mas também pelo distanciamento temporal desde que vi primeiramente os espectáculos.