União Europeia precisa de mais mão-de-obra qualificada para apoiar o crescimento económico, assume a Comissão Europeia
“Os menores não acompanhados estarão isentos do procedimento de fronteira, a menos que representem uma ameaça à segurança”, avançou a assessoria responsável pela imprensa dos porta-voz da Comissão Europeia, após a Comunidade Cultura e Arte (CCA) ter tentado entrar em contacto com Anitta Hipper, porta-voz dos Assuntos Internos, Migrações e Segurança Interna.
Quanto à situação da rota migratória irregular do Mediterrâneo, a assessoria diz que a par do Plano de Acção da UE para o Mediterrâneo Central e o Plano de Dez Pontos para Lampedusa, estão a ser implementadas “parcerias operacionais contra o contrabando” com os Balcãs Ocidentais, Marrocos e Tunísia, para se poder dar uma resposta ao contrabando e tráfico de seres humanos. Quanto ao Blue Card, um meio de imigração legal para imigrantes altamente qualificados, a assessoria responde que “a UE precisa de mais mão-de-obra qualificada para apoiar o crescimento económico“. Não deixando de reforçar a prioridade da força de trabalho doméstico, afirma que “a migração de trabalhadores é uma parte necessária da solução.”
Apresentado pela Comissão Europeia em Setembro de 2020 e acordado entre o Parlamento Europeu e o Conselho, em Dezembro de 2023, o Pacto para as Migrações e Asilo tem sido alvo de diversas discussões, principalmente após Abril, altura em que foi aprovado pelo Parlamento Europeu. Este foi também um tema decisivo que marcou a agenda das Eleições Europeias, a 9 de Junho, entre críticas e quem visse neste Pacto a solução para a resolução dos problemas associados à imigração, marcando as posições dos então candidatos, passando pelas rotas migratórias irregulares: o ano passado foi considerado aquele com mais mortes nas rotas migratórias em todo o mundo, ao passo que a do Mediterrâneo tem sido considerada como a mais mortífera da União Europeia (UE), nomeadamente a do Mediterrâneo Central. Ao todo, nesta rota, morreram 3129 pessoas, em 2023. Quanto ao Pacto para as Migrações e Asilo em específico, as grandes críticas passam por um maior controlo da entrada de imigrantes, o facto de ser possível a detenção de menores, mesmo que não em contexto prisional, e a possibilidade de Estados-Membros pagarem os custos de integração de imigrantes em outros países da UE, caso não os recebam ou não os possam receber. Sendo também possível a estes Estados escolherem o tipo de solidariedade que pretendem auferir.
Desde a fuga de conflitos – recorde-se a Guerra da Síria e, recentemente, a Guerra da Ucrânia – até à procura de melhores condições de vida, são várias as razões que podem levar aos movimentos migratórios. Segundo os dados divulgados pelo Eurostat, segundo lembrado pelo artigo da RTP, houve perto de sete milhões de pessoas que, em 2022, rumaram à UE como destino de imigração. Pelos mesmos dados, verifica-se que 5,1 milhões são de países terceiros à UE; um milhão e meio circulou de um país da UE para um outro, e há cerca de 400 mil imigrantes cujo país de proveniência é desconhecido. Estes números equivalem a um aumento de cerca de 117 por cento, 2,7 milhões, face a 2021, conduzindo a um recorde dos dados do Eurostat que remontam ao ano de 2010. Só a Alemanha, a Espanha, França e Itália, por si só, sendo os países com mais imigração da UE, receberam 60 por cento do total de imigração. Às aspirações de quem imigra, soma-se a tendência mais proteccionista por parte dos países da União Europeia. A Itália tem, no momento, Georgia Meloni, de extrema-direita, como Primeira-Ministra e recorde-se que a França de Macron, entre 2022 e 2023, reintroduziu o controlo das fronteiras terrestres, a par da vitória de Marine Le Pen nas eleições Europeias de Junho. No entanto, os mesmos dados também mostram que, em 2022, mais de metade dos imigrantes, em 25 dos 27 países, não tinha a nacionalidade do país para o qual imigraram.
De forma a perceber as dinâmicas deste Pacto cujo Plano Comum de Implementação vai entrar em vigor em 2026, entender os desafios de uma tendência mais proteccinista face à imigração e a necessidade de preservar os direitos humanos de quem tenta uma vida melhor fora do seu país de origem, a CCA tentou contactar Anitta Hipper, porta-voz da Comissão Europeia para os Assuntos Internos, Migrações e Segurança Interna, e obteve as explicações que se seguem por parte a assessoria responsável pela imprensa dos porta-voz da Comissão Europeia.
São dez os “novos textos legislativos” que o pacto apresenta. “O conjunto de reformas estabelecerá uma nova base legal para uma forma mais justa e eficiente de gerir a migração“, esclareceu à CCA a assessoria. A crítica que se impõe e que tem causado preocupação por parte de várias ONG é, precisamente, a possível detenção de menores, mesmo que esta não seja em contexto prisional. À CCA a assessoria respondeu, face a esta crítica, que “a detenção pode ser aplicada nos procedimentos de fronteira, mas não há nenhuma disposição que permita aos Estados-Membros impor a detenção automática aos requerentes de proteção internacional.”
Recordando que a detenção só pode ser usada “apenas como último recurso, pelo menor tempo possível e nunca em instalações prisionais ou em qualquer outra instalação destinada a fins de aplicação da lei“, a assessoria dos porta-voz da Comissão Europeia reiterou que “se deve fazer tudo o que seja possível para garantir que sejam encontradas alternativas adequadas para os menores e os membros da família“, reforçando que “os menores também não devem ser separados dos seus pais ou encarregados.“
Complementou que “a detenção só pode ser aplicada de acordo com todas as salvaguardas previstas na Directiva sobre Condições de Acolhimento, ou seja, só pode ser usada quando for necessária e proporcional, tendo como base uma avaliação individual, e como medida de último recurso quando medidas menos coercivas não forem possíveis, além de estar sujeita a escrutínio judicial“. Concluiu ainda que “nesse contexto, a reforma exige o desenvolvimento de orientações para alternativas à detenção e que a Comissão faça a monitorização da possível detenção no procedimento de fronteira, garantindo que o requerente não fuja.”
Outras das críticas que o Pacto tem gerado prende-se com o facto dos Estados terem de pagar os custos de acolhimento de migrantes num outro Estado-Membro, caso não recebam esses mesmos imigrantes. A questão que se tem levantado é a possibilidade de Estados com mais poder económico poderem fazer este pagamento, de forma regular, caso não queiram receber imigrantes. A esta crítica, a assessoria de imprensa responde que “o Pacto para Migrações e Asilo define regras claras para que todos os Estados-Membros assumam a sua parcela de responsabilidade na gestão da migração, garantindo que nenhum deles fique sozinho para lidar com pressões desproporcionais. Pela primeira vez, a União colocará em vigor um mecanismo permanente de solidariedade obrigatória. Nenhum Estado-Membro ficará sozinho sob pressão. Ao mesmo tempo, cada Estado-Membro contribuirá para os esforços de solidariedade de forma flexível, podendo escolher o tipo de solidariedade que oferecem.“
Esclareceu-se ainda que “o sistema também incluirá regras eficazes para detectar e prevenir movimentos secundários. A cada ano, até 15 de outubro, a Comissão adoptará um relatório anual para avaliar a situação migratória determinando, assim, se um determinado Estado-Membro está sob pressão migratória ou em risco de pressão no ano seguinte.” A Comissão afirmou também que há uma proposta para a criação de um Acto de Execução do Conselho com os números de realocações e contribuições financeiras de solidariedade necessárias para o próximo ano. Ao elaborar o relatório anual, a Comissão deve levar em consideração uma série de indicadores qualitativos e quantitativos. Isso inclui o número de pessoas desembarcadas após operações de busca e salvamento; o número de pedidos de protecção internacional; o número de pessoas sujeitas ao procedimento de fronteira e o número de beneficiários de protecção temporária. Os indicadores qualitativos incluem situações de instrumentalização, escala e tendências de movimentos não autorizados.”
Explicou-se ainda que em “termos de apoio disponível em cada caso, os Estados-Membros sob pressão migratória podem receber apoio na forma de realocações, contribuições financeiras ou medidas alternativas de solidariedade (como apoio em pessoal e em espécie). Também podem receber uma dedução total ou parcial de sua promessa de solidariedade. Os Estados-Membros, ao enfrentarem uma pressão migratória significativa, só podem beneficiar de uma dedução parcial ou total das suas contribuições de solidariedade prometidas.”
Quanto à rota do Mediterrâneo, a assessoria afiançou que a Comissão está trabalhar com “toda a energia” para implementar o Plano de Acção da UE para o Mediterrâneo Central, a par de outras medidas operacionais, incluindo o Plano de Dez Pontos para Lampedusa”. Referiu ainda que “a Comissão está a apoiar a Itália operacionalmente, por meio dos Planos de Acção, e financeiramente, ao mesmo tempo que intensifica o diálogo e a cooperação, em termos de imigração, com países parceiros. O Plano de Acção inclui iniciativas direcionadas no campo de Busca e Salvamento, incluindo a reactivação do Grupo de Contacto SAR [Busca e Salvamento]“.
Complementou também que “as Agências da UE estão no terreno para prestar apoio”, garantindo que a Frontex e a Agência da UE para o Asilo, graças ao plano de dez pontos para Lampedusa, reforcem ainda mais o seu apoio à Itália, tanto em termos de pessoal quanto de recursos.“
A par do plano de Lampedusa, “a UE está a estabelecer parcerias com países parceiros, tendo como foco várias áreas de cooperação como a economia, o comércio, a energia verde, o digital, bem como a gestão da migração e segurança. Além disso, estão a ser implementados outros instrumentos, como Parcerias Operacionais contra o Contrabando, com países parceiros como os Balcãs Ocidentais, Marrocos e Tunísia, para aumentar a cooperação e responder aos desafios relacionados com o contrabando de migrantes e tráfico de seres humanos, bem como a imigração irregular em direção à Europa a partir de países de trânsito”, refere a assessoria. “Essas medidas também são apoiadas por iniciativas e acções que mitigam partidas irregulares, bem como a implementação de mecanismos de protecção e asilo fortalecidos nos países parceiros, criando-se oportunidades de retorno e reintegração a partir de países de trânsito. A discussão acerca das causas fundamentais da imigração também é uma das grandes prioridades.”, conclui.
A assessoria da Comissão Europeia informa ainda que o novo pacto tem como objectivo “fomentar fronteiras externas mais seguras: todos os migrantes irregulares serão registados à chegada e passarão por uma rigorosa verificação de identidade, segurança, saúde e vulnerabilidade. Aqueles que provavelmente não precisem de protecção, representem riscos de segurança ou enganem as autoridades estarão sujeitos a um procedimento de fronteira rápido. Este procedimento permite uma rápida análise das suas candidaturas de asilo e, se estas forem rejeitadas, estas pessoas farão um regresso rápido, sem que sejam autorizadas a entrar no território da UE. Todos os Estados-Membros serão obrigados a ter capacidade para acolher um certo número de requerentes de asilo durante os procedimentos, em condições adequadas. Vão ser aplicadas salvaguardas legais e rigorosas, e os menores não acompanhados estarão isentos do procedimento de fronteira, a menos que representem uma ameaça à segurança.”
Complementa ainda que “vão ser aplicadas regras internas justas e firmes sobre o asilo e o retorno: as novas regras estabelecerão procedimentos de asilo mais eficazes, com prazos mais curtos e regras mais rigorosas para candidaturas abusivas. Essas regras são equilibradas com garantias importantes para os direitos dos indivíduos, incluindo aconselhamento jurídico gratuito durante todos os procedimentos, com atenção especial a grupos vulneráveis. As novas regras também estabelecerão padrões em toda a UE para condições de acolhimento, e harmonizarão a qualificação e os direitos dos beneficiários de proteção internacional.” Prevê-se assim que os processos de imigração sejam averiguados dentro do seu tempo normal.
A assessoria dos porta-voz da Comissão Europeia conclui que “o Plano Comum de Implementação para o Pacto para as Migrações e Asilo, adoptado pela Comissão no dia 12 de Junho, estabelece os principais marcos para que todos os Estados-Membros coloquem em prática a nova legislação até meados de 2026. Além disso, as Agências da UE também fornecerão apoio operacional e direccionado aos Estados-Membros ao longo deste processo. O Plano Comum de Implementação fornece um modelo para os Planos Nacionais de Implementação a serem adoptados pelos Estados-Membros até o final deste ano. Ele agrupa o trabalho legal, técnico e operacional em 10 blocos de construção para focar e facilitar os esforços práticos de implementação.”
Um dos instrumentos de imigração legal previstos pela UE é o chamado “Blue Card“, mas para imigração altamente qualificada. Questionada sobre o que deveria melhorar neste mecanismo, a assessoria para os porta-voz da Comissão Europeia deu a seguinte resposta: “A UE precisa de mais mão-de-obra qualificada para apoiar o crescimento económico. Embora as medidas para maximizar o potencial da força de trabalho doméstico da UE sejam a primeira prioridade, a migração de trabalhadores é uma parte necessária da solução. Para permanecer competitiva, a UE deve atrair habilidades e talentos, ampliando ainda mais as medidas já adoptadas, incluindo a revisão da Directiva da UE sobre o Blue Card e a Diretiva do Permissão Única. A Directiva revista do Blue Card ajudará a atrair e a reter trabalhadores altamente qualificados na UE, por meio de condições de admissão mais flexíveis, direitos aprimorados e a possibilidade de se mover e trabalhar mais facilmente entre os Estados-Membros da UE. A Directiva entrou em vigor no dia 27 de Novembro de 2021. Os Estados-Membros da UE (excepto Dinamarca e Irlanda) tiveram até 18 de novembro de 2023 para transpor a Directiva para a legislação nacional.”