Um prodígio chamado José Cardoso Pires
O que nos quis dizer uma das maiores vozes do romance do século XX português.
Uma grande cidade, luzes, sirenes de ambulâncias, poluição sonora, um crime por explicar. Eis a fórmula clássica de um policial à americana. Ingredientes que não irá encontrar na receita criada por José Cardoso Pires nos seus “policiais à portuguesa”. Nos títulos do escritor português somos convidados a entrar na investigação. Quando de lá saímos, percebemos que nos tornámos cúmplices do próprio crime. – tudo não passou dum saboroso e sofisticado jogo literário que o autor usou para caçar e desassossegar o leitor. É este o mote de José Cardoso Pires e o Leitor Desassossegado, ensaio de Marco Neves, escritor e professor da Universidade Nova de Lisboa.
Um crime: eis o que nos apresenta cada romance de José Cardoso Pires, convidando-nos logo a entrar na investigação. Quando de lá saímos, percebemos que nos tornámos cúmplices do próprio crime – tudo não passou dum saboroso e sofisticado jogo literário que o autor usou para caçar e desassossegar o leitor. Neste ensaio, a nossa atenção vira-se para o peculiar crime literário de Cardoso Pires, revelando as estratégias de que o autor se serve para tornar o leitor refém dos seus romances.
Tem nas mãos, no fundo, uma investigação literária e policial: vamos à procura do que nos quis dizer uma das maiores vozes do romance do século XX português. (sinopse do livro)
Ao longo das 176 páginas, o autor calçou as luvas, pegou no bisturi e dissecou as particulares estratégias de rapto literário, que ao longo de várias gerações têm desassossegado os leitores de José Cardoso Pires. A obra de um dos maiores romancistas português do século XX olhada pela lupa de um confesso admirador.
Mistérios? Há muitos, nas páginas purgadas pela pena do prodigioso autor natural da Beira Interior, mas Marco Neves foi audaz e descobriu alguns dos segredos destes policiais à portuguesa. «O herói apaixona-se pela vilã, mas nada acontece, a conspiração derrota-se a si mesma, os veículos de fuga vão deixando pedaços pelo caminho, todos se atrapalham, num nervoso de teatro de província tentando representar com poucos meios uma peça estrangeira muito conhecida.» Conclusões desta que é uma homenagem a José Cardoso Pires.
Mas nestes romances criminais à boa moda lusitana também cabem sirenes de ambulâncias a soar, pois alguns clichés internacionais não podem ser deixados para trás. «Aplique-se isto à Lisboa de 1960 e até as personagens se irritam: “Chiça, berra o inspector, mais uma ambulância. Tenho dias em que saio daqui todo aos apitos.»
Um livro para acompanhar os verdadeiros amantes da literatura portuguesa nas leituras da prodigiosa obra romanesca de José Cardoso Pires.